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El Niño traz chuvas para safra de inverno

Mais moderado, o fenômeno climático pode impulsionar desenvolvimento de plantas no Centro-Sul, mas chuvas na colheita preocupam

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Por Anna Carolina Papp
Atualização:

O El Niño já chegou. O fenômeno climático, que deve ganhar força nos próximos meses, traz consigo chuvas que prometem garantir umidade para a safra de inverno no Centro-Sul do País. A confirmação do El Niño neste ano – ainda que moderado, como apontam meteorologistas –, é agridoce para produtores. Se por um lado pode ajudar no desenvolvimento de culturas como trigo e cana-de-açúcar e mitigar o risco de geadas, a ocorrência de chuvas no período da colheita pode causar perdas no campo.

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Em sua forma tradicional, o El Niño, fenômeno gerado pelo aquecimento das águas no Oceano Pacífico, causa chuvas mais intensas no Sul, seca no Norte e Nordeste e temperaturas mais elevadas no Sudeste e Centro-Oeste. Este ano, porém, seus efeitos no País tendem a ser mais amenos. 

“Na costa da América do Sul, esse aquecimento não tem sido tão forte como na região central do Pacífico, que atinge Austrália e Ásia”, explica Celso Oliveira, da Somar Meteorologia. “Com isso, sua influência não será tão forte e nem tão duradoura, com os efeitos mais concentrados no inverno.”

 

Simulação feita pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Cptec/Inpe) aponta que, de junho a agosto, deve chover acima da média em boa parte do Sul, oeste de São Paulo e em grande parte de Mato Grosso do Sul – impactando as culturas de inverno, como trigo, cevada, cana-de-açúcar e café, além da segunda safra de milho. “Já estamos tendo um outono mais úmido do que o normal, e isso tem sido ótimo para o milho safrinha, por exemplo”, diz Oliveira.

Para os especialistas, o que definirá se o El Niño será bom ou ruim para a safra não é a intensidade das chuvas, mas o seu calendário. “A maioria das culturas pode se beneficiar com a chuva, mesmo porque ela ameniza o risco de geadas”, afirma Oliveira. “No entanto, chuva demais no período da colheita, lá para o fim do inverno, pode ser muito prejudicial”, observa.

Paulo César Sentelhas, professor de Agrometeorologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), aponta que um dos benefícios da chuva é a economia de água, uma vez que boa parte das culturas de inverno é irrigada. Mas a colheita ainda preocupa. 

“Aqui em Piracicaba (interior de São Paulo), nos canaviais, a preocupação é de que chuva acima do normal diminua os dias de colheita, além de afetar a qualidade da cana colhida – diminuindo a quantidade de açúcar da planta”, diz o pesquisador. Ele explica que a chuva, no período da colheita, dificulta que as máquinas entrem no campo e, caso as usinas não consigam processar esses volumes, pela redução dos dias de moagem, parte da cana pode ficar nos campos para a próxima safra.

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A região Centro-Sul, que deverá ser mais afetada pelo El Niño, concentra cerca de 90% da produção de cana-de-açúcar do Brasil. Em maio, segundo a Somar Meteorologia, as chuvas ficaram de 30% a 40% acima da média em São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul.

Produtores de outras culturas também estão receosos em relação às chuvas. “Entre as regiões cafeeiras de São Paulo e de Minas Gerais, a preocupação também é grande, já que o grão precisa secar”, explica Sentelhas. Ele também observa que um inverno mais úmido exige do produtor maior controle fitossanitário, pela proliferação de doenças. 

Os índices mais altos de precipitações, no entanto, não devem atingir os níveis da temporada de 2009/2010, quando houve um El Niño clássico e mais intenso. “Muita cana não foi colhida naquele ano”, diz. As chuvas torrenciais, que foram devastadoras para milhares de famílias no Sul e Sudeste do País, também prejudicaram as lavouras de arroz no Rio Grande do Sul, onde houve perdas de quase 10% da produção. 

Incerteza. A duração do El Niño não é consenso entre os meteorologistas, já que o quadro ainda pode mudar nos próximos meses. “Por enquanto, ele está fraco, pois estamos observando uma oscilação de temperatura entre 0,5 ºC e 1ºC na superfície do Pacífico”, diz Priscila Coltri, pesquisadora do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas (Cepagri/Unicamp). “A duração depende muito de como se comportarão as anomalias das temperaturas na superfície do oceano – se vão continuar subindo ou se vão estacionar e retornar”, diz. 

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Para Alexandre Nascimento, meteorologista da Climatempo, apesar da intensidade moderada, os impactos do fenômeno serão sentidos até o ano que vem – o que contemplaria a safra de verão, com destaque para a soja, carro-chefe do agronegócio brasileiro. “Em geral, o ápice, com as temperaturas mais altas de anomalia, ocorrem entre a primavera e o verão, e este ano não deve der diferente”, diz.

Já Oliveira, da Somar, e Sentelhas, da Esalq, acreditam que o El Niño não terá impacto significativo na safra de verão. Para eles, como o fenômeno deve se estender no máximo até a primavera, poderia influenciar apenas na fase de plantio da cultura.

Energia. Já para o setor elétrico e hídrico, o fenômeno climático não traz o alívio esperado. “Esse El Niño está sendo classificado como moderado e curto”, diz Cristopher Vlavianos, presidente da comercializadora de energia Comerc. “Teremos chuvas intensas no Sul, mas os reservatórios da região representam apenas 7% das represas do País”, observa.

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