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Economista e advogada

Opinião|Regimes especiais do IR não recebem a atenção devida porque ninguém quer abrir mão do seu puxadinho

A reforma tributária está em discussão, mas a defesa de maior justiça tributária fica mesmo no discurso

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Atualização:

Começando a temporada da declaração do Imposto de Renda. Não sou das que deixam para a última hora. O que me dá mais trabalho é recolher todos os recibos de despesas médicas, ver se não esqueci nada, e preparar a planilha. 

A dedução de despesas médicas é mais um dos elementos de regressividade na tributação da renda. A ela se juntam regimes especiais, como a pejotização, a distribuição de dividendos e o tratamento especial aos fundos fechados. Eu me encaixo em todos eles. Minha alíquota final é muito inferior à de um trabalhador no mercado formal. Algo está fora de ordem. 

Aplicativo do Imposto de Renda;com a nota fiscal eletrônica, grande parte das despesas médicas já vem preenchida na declaração. Foto: Marcello Casal Jur/Agência Brasil

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Há alguns anos tentei não usar a dedução de meus gastos com saúde. Foi então que caí na malha fina pela primeira e única vez. A Receita me convocou porque havia “omitido” essas informações. Dei minhas razões. Não uso o sistema público porque não quero e optei por um plano que me permite frequentar ótimos hospitais com livre escolha de profissionais. 

O fiscal entendeu, mas disse que havia sido chamada pela suspeita de estar compactuando com profissionais que se escondiam do Leão. É o tal “com recibo ou sem recibo”. Aquele jeitinho do brasileiro que se sente roubado pelo Estado e acha que seu pecadilho não atrapalha ninguém. 

Com a nota fiscal eletrônica, grande parte das despesas médicas já vem preenchida na declaração. No ano que tive gastos elevados com a saúde, além de pagar pouco imposto, ainda recebi reembolso. Não tenho liberdade de abrir mão desta generosidade do Estado brasileiro. 

Não é razoável que essas isenções não tenham ao menos um teto, como já ocorre com instrução. As duas deduções não deixam de ser regressivas, afinal quem opta pela prestação privada desses serviços não está entre os mais pobres do país. Dada a concentração de renda neste País, difícil é convencer classes na base da pirâmide que ela é mais privilegiada que imagina em termos relativos. Afinal, seu orçamento mal dá pagar o colégio dos filhos e escolas públicas não estão no seu projeto de vida.

O que cria outro problema: quanto menos pessoas usarem os serviços públicos, menor a pressão para a melhoria do atendimento. Afinal, já “não é problema meu”. Engano. Se queremos construir uma sociedade mais justa e inclusiva, a qualidade da educação e saúde pública importa para todos nós. 

A reforma tributária está em discussão, mas a revisão de regimes especiais do nosso IR não recebe a atenção devida. A defesa de maior justiça tributária fica mesmo no discurso. No mundo real, ninguém quer abrir mão de seu puxadinho. 

*ECONOMISTA E ADVOGADA. CONTRIBUI COM O PLANO ECONÔMICO DE SIMONE TEBET 

Opinião por Elena Landau
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