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Em cultos, ministro Henrique Meirelles prega austeridade

Após presença em eventos religiosos, Meirelles diz que precisa ampliar para além de investidores o tema de equilíbrio das contas

Foto do author Adriana Fernandes
Por Irany Tereza , Adriana Fernandes e  Murilo Rodrigues Alves
Atualização:

BRASÍLIA - Nos últimos quatro meses, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, pregou austeridade em pelo menos quatro eventos ligados à Assembleia de Deus, além de ter gravado, no mês passado, um vídeo dirigido a pastores evangélicos pedindo que orassem pela economia. “Preciso da oração de todos”, disse, na gravação. Ele acredita que os apelos deram certo e prepara revisão das projeções de crescimento da economia em 2017 e 2018. “Tá vendo!”, brinca o ministro, entre risos, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast na última sexta-feira. Na conversa, Meirelles abordou temas como recuperação judicial, Refis, problemas da economia, e não se esquivou de perguntas sobre religião ou política.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Foto: André Dusek/Estadão

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O ministro diz que se aproximou da Assembleia de Deus porque a igreja “compartilha da mesma mensagem de gastar só o que se ganha” na doutrinação a seus fiéis. Segundo pesquisas, essa igreja reúne um terço dos evangélicos, que são 29% dos eleitores brasileiros. “Por formação, sou católico. Estou conversando com todos os setores que apoiam o equilíbrio das contas públicas. Encaro com muito entusiasmo esse apoio dos evangélicos”. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual o motivo de suas reuniões em igrejas da Assembleia de Deus? É um motivo muito simples. Tenho a visão de que não posso falar só com o mercado financeiro ou com o meio empresarial. Falar com investidores, o sistema financeiro, o mercado de previdência complementar, empresários é muito importante. Agora, não posso só me restringir a isso. Então, tenho ampliado um pouco o espaço. Com segmentos da sociedade que querem ouvir, estão interessados nessa mensagem de austeridade, equilíbrio das contas. Houve alguns convites, não foram tantos. Eu falei a mesma coisa que digo, por exemplo, para o setor de previdência complementar ou investidores de Nova York. Não acho que o ministro da Fazenda tem de estar restrito só para falar com investidores. Tem de falar prioritariamente com eles, sim, porque são os que investem. Mas tenho de falar com outros setores da sociedade que querem ouvir.

Mas por que a Assembleia de Deus? O sr. é evangélico? Porque eles têm interesse nisso, porque me convidaram e manifestaram a concordância com os valores da sociedade. É, em parte, a mensagem das igrejas: gastar só o que se ganha, não tomar dinheiro emprestado para fazer gasto corrente. Mas estive também com outros segmentos, não só a Assembleia de Deus. Já falei para pastores presbiterianos, sindicalistas e comunidade acadêmica internacional. Em resumo: procuro diversificar ao máximo. Agora, evidentemente que eu falar com investidores e mercado, todo mundo acha normal, não é notícia.

O sr. é de qual religião? Por formação, sou católico. Minha família sempre foi católica. Agora, estou no papel de ministro da Fazenda. E estou conversando com todos os setores que apoiam o equilíbrio das contas públicas. Encaro com muito entusiasmo esse apoio dos evangélicos. A mensagem é essa: acho importante para o País. Da mesma maneira que a família não pode tomar dinheiro emprestado para fazer gastos correntes, a mesma coisa vale para o governo. Esse público entende perfeitamente, desde que se coloque as coisas nesses termos. Todos entendem que não podem ir ao banco todo mês pegar dinheiro emprestado.

Ministro, o sr. é candidato à Presidência? Não sou candidato. Sou ministro da Fazenda. Não perco tempo pensando em hipóteses.

As pesquisas eleitorais recentes mostraram preferência por Lula, apesar de todos os escândalos, e Bolsonaro, apesar do extremismo das ideias que ele defende. Qual sua avaliação sobre esses dois fenômenos? Acho natural nessa fase do processo. No caso do Lula, existe uma lembrança do período em que ele governou, que foi o período de crescimento, por fatores diversos. Acho que a população tem essa lembrança, independentemente dos outros fatores. E o Bolsonaro, com essa proposta de foco em segurança, também está tendo boa receptividade. Não tenho uma análise mais profunda sobre isso, porque não estou me dedicando a isso. Não tenho tempo.

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Toda vez que seu nome aparece como alternativa, há uma reação muito positiva do mercado. Mas as pesquisas o colocam com apenas 3% de intenções. O sr. acha que isso ocorre por desconhecimento? Exatamente por eu não ser candidato, não estar com candidatura lançada. Sou ministro da Fazenda. É normal isso. Só confirma o que estou dizendo. Não estou aí em campanha, estou fazendo o meu trabalho de ministro da Fazenda.

E como o sr. vê o fato de o mercado ficar animado com qualquer rumor sobre sua possível candidatura? Acho que terá chances um presidente reformista, no sentido atual da palavra, que é a favor das reformas que estão sendo feitas na economia brasileira hoje: trabalhista, Previdência, teto de gastos, austeridade.

Coisas que o sr. defende... Eu defendo. Mas não sou o único. Tanto que está sendo aprovado. Há partidos políticos que defendem isso também e que têm candidatos próprios.

O sr. concorda que a melhora da economia servirá como um cabo eleitoral? Acredito que, como já dizia o conselheiro famoso de um ex-presidente de outro país, a economia é fundamental. Seja indo mal ou bem. É fundamental para o emprego, para a inflação, para o padrão de vida da população. Não há dúvida que economia é uma parte fundamental. Segurança é outra, evidentemente. Agora, investimento em segurança é resultado da economia. Assim como na educação e na saúde. Economia é central.

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Foi precipitado o PSD lançar sua candidatura? Acho que é normal que cada um dê sua opinião. Vivemos numa democracia. É normal que parlamentares expressem sua opinião. Isso não foi objetivamente discutido naquele almoço. Agora, eu tenho contato com os parlamentares, inclusive por tudo que estamos discutindo: Refis, Previdência, reoneração (projeto do fim da desoneração da folha de pagamento para 50 setores). Meu contato com parlamentares é intenso.

Há equipe trabalhando na sua candidatura? Não. O que existem são assessores que me dão informações. Acho importante, quero saber o que está acontecendo. Eles produzem relatório semanal, que leio desde 2015.

O desejo de ser candidato é legítimo, não? Todo brasileiro pode ter esse desejo, só que o que se discute não é subjetivo. É ação concreta. O que estou dizendo é que tenho 100% do meu foco e atenção no Ministério da Fazenda e na economia brasileira.

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Uma possível candidatura do sr. poderia atrapalhar a condução da economia? Não. Alteraria se eu mudasse meu comportamento por isso.

Mas partidos, inclusive da base, podem atacar o sr. por encará-lo como potencial candidato... Isso aconteceu muito há um ano, mas diminuiu muito. Todos perceberam que estou focado no meu trabalho de ministro. O importante não é que os partidos me elogiem ou deixem de elogiar, mas sim que votem a favor das reformas.

O sr. pediu orações para a retomada. Parece que funcionaram... Tá vendo! (risos)

Nada como ter fé... E fazer o trabalho certo.

Quanto à previsão de crescimento, tem banco falando em 4% para 2018... Tem banco falando em números muito elevados. É possível surpreender, mas achamos que esse número é ainda fora da curva. As projeções estão caminhando em direção a 3%.

Esse otimismo pode deixar a aprovação da reforma da Previdência em segundo plano. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), está incorporando esse discurso. É uma discussão importante. O que está acontecendo na economia já incorpora uma previsão de aprovação de reformas. É importante que possamos consolidar essa percepção de que o País continua nesse caminho de aprovação de reformas.

Mas é fato que na Câmara já se fala que a aprovação da reforma da Previdência deve ficar para o próximo governo... Minha avaliação sobre isso é simples. Todos partidos e correntes políticas que têm interesse em participar de um governo que começa em 2019 deveriam estar interessados na aprovação da reforma da Previdência agora, para não ter esse problema no início do próximo governo. Que teremos de enfrentar isso é inevitável. Ou agora ou em 2019. É melhor para o País que seja agora. Não é uma boa ideia ter como o primeiro desafio de um próximo presidente a aprovação da reforma da Previdência e isso como um tema central no debate das eleições em 2018.

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