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Em ritmo bem mais lento, empresas chinesas lutam para se recuperar

Indústrias do país praticamente fecharam as portas há três semanas, quando o coronavírus avançou e alongou o feriado um feriado chinês

Por Keith Bradsher
Atualização:

A Airbus está lentamente reiniciando as operações na sua linha de montagem na China. A General Motors iniciou uma produção limitada no sábado, 15,. E na segunda-feira, 17, foi a vez da Toyota.

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Com confiança, mas também com esforço - e com certo apoio do governo de Pequim - a China tenta recompor os seus negócios.

A segunda maior economia mundial praticamente fechou as portas há três semanas, quando uma epidemia viral deixou milhares de pessoas doentes, e alongou inesperadamente um feriado chinês. A parada das atividades desencadeou uma série de alertas de que a economia global poderia estar ameaçada se esta potência industrial mundial permanecesse fechada por muito tempo. 

Funcionários da Volkswagen retomam trabalho em fábrica na cidade de Changchun, no nordeste da China. Foto: Zhang Nan/Xinhua via AP

Agora, algumas fábricas voltam ao trabalho, e está bastante claro como será a tarefa monumental para a China se colocar novamente no caminho. Os esforços do país para conter o novo coronavírus chocam-se com o ímpeto para fazer com que o país volte a produzir, o que exigirá que os seus líderes encontrem um equilíbrio entre garantir a segurança das pessoas e que os setores vitais entrem novamente nos trilhos.

Na semana passada, os líderes chineses pediram uma maior ênfase na retomada da economia. Mas muitas das fábricas que foram reabertas estão funcionando bem abaixo de sua capacidade, segundo as companhias e os especialistas. As quarentenas, as estradas bloqueadas e os postos de controle impedem que milhões de trabalhadores voltem às suas tarefas. As linhas de abastecimento foram interrompidas.

Mesmo para recomeçar, as autoridades chinesas estão exigindo que as empresas forneçam máscaras de proteção aos trabalhadores, que mantenham o registro de suas temperaturas corporais e controlem os seus movimentos para ter certeza de que não tenham nenhum contato com o coronavírus, denominado COVID-19.

“O medo e o bloqueio imposto à atividade econômica provavelmente persistirão”, segundo George Magnus, professor associado de pesquisa do China Center na Universidade de Oxford. “Não vejo realmente um bom resultado.”

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Até esta quarta-feira, 19, mais de 74 mil pessoas haviam sido infectadas pelo coronavírus e mais de 2 mil haviam morrido no mundo todo, segundo as autoridades. 

Novos casos de contágio estão sendo confirmados no mundo inteiro, inclusive o de um americano que recebeu o diagnóstico da doença na Malásia. Ele havia estado a bordo de um navio de cruzeiro, o que despertou preocupações pormais um possível grupo fora da China Continental.

Também no domingo, Taiwan informou que um homem de 61 anos que tinha um histórico de saúde frágil, mas que aparentemente não havia viajado para a China morreu por causa do coronavírus, o que o torna a quinta vítima fatal fora do continente.

No entanto, o ritmo desses novos casos oficialmente confirmados na China, o epicentro da epidemia, se reduziu nos três últimos dias.

Os efeitos continuam se espalhando ao redor do mundo. O primeiro-ministro de Cingapura,Lee Hsieb Loong,alertou na sexta-feira que a cidade-estado poderá entrar em recessão em consequência da epidemia. 

A Alemanha, o coração da indústria europeia, anunciou na sexta-feira uma desaceleração do crescimento econômico no final de 2019, suscitando temores de que o vírus possa atrasar a sua recuperação.

Com o início da nova semana, a poderosa máquina industrial chinesa - que representa 25% da produção industrial mundial - mostrou vislumbres de uma aceleração.

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A Airbus, a fabricante de aviões europeia, disse que começou a reabrir as operações de montagem do seu jato de pequeno porte, na semana passada, em Tianjin, mas que “aumentará gradativamente a produção, implementando ao mesmo tempo todas as medidas sanitárias e de segurança exigidas”. 

Um funcionário usando máscara trabalha na produção de meias na província de Zhejiang. Foto: China Daily via Reuters

A Airbus precisa produzir: a companhia admitiu que é possível que não consiga atender à demanda de jatos de pequeno porte, que as empresas aéreas estão solicitandodepois que tiraram do ar o jato Boeing 737 Max. A fábrica de Tianjin planeja uma produção de seis jatos mensais.

A Volkswagen informou que reabriu parcialmente uma das suas 15 montadoras na China e que pretende reabrir as restantes gradativamente. A GM disse que, no sábado, começou um processo gradual de reabertura de suas mais de dez fábricas na China. A Hyundai informou que espera reiniciar a produção chinesa na segunda-feira.

Outras se mostraram mais cautelosas. A Caterpillar, fabricante de equipamentos pesados,disse que a pedido das autoridades governamentais reabriu a maioria de suas fábricas na China, mas não forneceu maiores detalhes, como, por exemplo, se a produção havia sido retomada. A Honda disse que está tentando reiniciar a produção no dia 24.

Com a exceção das fábricas que produzem equipamentos médicos de proteção, às quais o governo chinês pediu que trabalhassem 24 horas por dia, poucas indústrias aparentemente estão retornando ao seu ritmo anterior.

A Toyota informou que as suas quatro montadoras operavam com dois turnos de trabalho um dia antes que o vírus se alastrasse. Mas ela pretende reabrir três delas na segunda e terça-feira com apenas um turno e, por enquanto, deixar fechada a quarta que é a menor, na cidade de Chengdu, na região oeste da China.

A Câmara Americana de Comércio de Xangai, que tem membros em grande parte do coração industrial do centro-leste da China, informou que, na sua maioria, os seus associados retomaram pelo menos algumas operações. Mas que nem todos estes membros não estão em ritmo de produção plena, principalmente pela falta de trabalhadores, disse Ker Gibbs, o residente da Câmara de Comércio.

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A reabertura de algumas empresas implica uma tentativa de reunir novamente grande parte dos 700 milhões de trabalhadores da China depois do que se tornou um feriado nacional de quase três semanas.

Escadaria de fábrica na província de Zhejiang é dedetizada. Foto: China Daily via Reuters

Bloqueios nas estradas começam a ser retirados

Os esforços do país para conter a epidemia dividiram efetivamente o país. Pelo menos 760 milhões de pessoas - pouco mais da metade da população do país - encontram vários tipos de impedimento.

As autoridades começam agora a tentar reconectar o país. O Ministério da Agricultura exigiu, no fim de semana, a retirada dos bloqueios das estradas e rodovias nas áreas rurais que impediram a movimentação do gado e o transporte das rações animais. A província de Jiangxi, no sul do país, anunciou na quinta-feira passada que pretende desmantelar os postos de controle nas entradas e saídas das rodovias. Mas restam ainda muitos obstáculos.

“Sei que se trata de um vírus potente. Posso entender que este seja um desastre para o país”, disse Ma Hongkui, um caminhoneiro do noroeste da China que ficou semanas parado com dezenas de outros caminhoneiros em uma cidadezinha da província de Yunnan no sudoeste da China por falta de carga. “Não sei a quem pedir ajuda”.

Na cidade de Yiwu, um polo de pequenas manufaturas na província de Zhejiang, onde funciona um enorme mercado de produtos no atacado, trabalhadores migrantes que retornam ao trabalho precisam submeter-se a uma quarentena de duas semanas. Quando eles chegam a uma estação ferroviária em Yiwu, são examinados por dezenas de médicos que vestem uniformes feitos de um material especial para zonas de contágio (hazmat) munidos de câmeras térmicas. O governo local conseguiu 40 mil leitos para acomodá-los.

Somente os que estiverem registrados em uma lista oficial de companhias e unidades de trabalho poderão entrar na cidade, segundo um aviso do governo divulgado na semana passada. A mentira será punida com a prisão.

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A lenta e parcial reabertura das fábricas poderá ter um efeito dominó nas empresas do mundo todo. A China Weaving Materials, na província de Jiangxi, anunciou que suas fábricas de fios/filamentos reabririam no dia 20 de fevereiro. Outras companhias chinesas precisam dos fios para as suas indústrias de tecidos.

No vizinho Vietnã, fábricas de bolsas estão ficando sem tecidos, zíperes e vários componentes metálicos fabricados na maior parte na China, disse Tatiana Olchanetzky, uma consultora da produção de bolsas naquele país.

“Alguns fornecedores talvez tenham de obrigar os trabalhadores a tirarem licenças sem remuneração em março, se os materiais não tiverem chegado”, acrescentou.

A retomada das fábricas chinesas é apenas um aspecto deste desafio. O país tem um enorme setor de serviços e de consumo, como lojas e restaurantes frequentados por uma classe média cada vez mais afluente. Estas atividades também foram devastadas pela epidemia, que manteve muitas famílias chinesas confinadas em suas casas.

Amy Li, proprietária do restaurante de Xangai especializado em pratos da cozinha do noroeste da China, disse que tem poucas esperanças de reabri-lo dentro em breve, assim como dezenas de outros nas imediações, e talvez não consiga sobreviver.

“Não sabemos quando poderemos reabrir”, disse Li. “O futuro pertence ao destino”. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

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