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Embrapa mantém relevância no agronegócio, diz presidente interino da estatal

Desde o ano passado, a empresa reavalia a estrutura das suas 43 unidades de pesquisa para, segundo Celso Moretti, dar mais foco às unidades descentralizadas e atacar os principais problemas do agro brasileiro

Por Leticia Pakulski
Atualização:

O presidente interino da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Celso Moretti, rebate as críticas feitas em relação à possível falta de sintonia da empresa com o setor privado. Em entrevista ao Broadcast Agro, diz estar ouvindo as demandas do setor produtivo e repensando a gestão para atendê-las. Desde o ano passado, a empresa reavalia a estrutura das suas 43 unidades de pesquisa.

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"Temos trabalhado de forma muito intensa nessa reorganização, buscando dar mais foco às nossas unidades descentralizadas e atacar os principais problemas do agro brasileiro", afirmou. Moretti ponderou que metade da área ocupada com agricultura, pecuária e sistemas florestais hoje no Brasil tem tecnologias desenvolvidas pela Embrapa. "A nossa inserção no agro é muito relevante e significativa."

Sobre a limitação de recursos para pesquisa, conta que pretende discutir com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, a ideia de formar fundos privados, como nos Estados Unidos, onde produtores reservam parte dos recursos obtidos na comercialização da safra para alimentar fontes de financiamento. "Também iniciamos nos últimos meses uma negociação com um fundo privado que pretende fazer uma doação para a Embrapa da ordem de R$ 220 milhões", afirma.

Celso Moretti, diretor de pesquisa e desenvolvimento da Embrapa,é engenheiro agrônomo edoutor em produção vegetal. Foto: Jorge Duarte/Embrapa

Quanto à possibilidade de ser efetivado no cargo, lembra estar qualificado para a função. "Se assim a ministra assim o entender, eu seguirei com muita honra nessa posição." Leia a entrevista a seguir.

O senhor foi nomeado em julho como interino. Como está a transição na Embrapa?

Temos dado continuidade aos processos em curso, atenção às diferentes cadeias produtivas do agro brasileiro e, obviamente, cuidando dos nossos recursos humanos, para que as pessoas tenham tranquilidade para continuar tocando a agenda diária de trabalho.

O agronegócio cobra modernização e maior cooperação com o setor privado. É possível atender a essa demanda?

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Todas as corporações, públicas ou privadas, precisam se modernizar, estar conectadas com as tendências atuais e de olho no futuro e a Embrapa vem fazendo isso há um bom tempo. Trabalho lançado e publicado no ano passado coloca a visão da empresa para a agricultura em 2030. Em relação ao setor privado, temos trabalhado com todas as grandes empresas da área de defensivos e fertilizantes, associações de produtores, os grandes frigoríficos. Do ponto de vista da modernização, iniciamos no ano passado uma revisão do modelo de operação a partir da sede da empresa. Nós tínhamos 15 unidades centrais e passamos a ter cinco. Trabalhávamos dentro de caixinhas e passamos a trabalhar pensando em processos. É uma visão moderna de gestão. Tudo isso para estar mais próximo e ser mais célere no atendimento às demandas do agro brasileiro. No ano passado, demos início em revisitar a estrutura das nossas unidades descentralizadas. Temos hoje 43 em todo o território brasileiro. A gente tem trabalhado de forma muito intensa nessa reorganização, buscando dar mais foco às nossas unidades descentralizadas e atacar os principais problemas do agro brasileiro.

Qual o alcance atual das pesquisas da Embrapa no País?

Publicamos neste ano um estudo que mostra que metade da área com agricultura, pecuária e setor florestal do Brasil, ou seja, 130 milhões de hectares, tem tecnologia da Embrapa. Vamos pegar a cadeia produtiva da soja: 35 milhões de hectares de soja têm fixação biológica de nitrogênio, uma tecnologia que a Embrapa desenvolveu e ofereceu para a agricultura brasileira. Trinta e cinco milhões de hectares de soja têm zoneamento agrícola de risco climático, um trabalho que a Embrapa faz há mais de 25 anos. E 35 milhões de hectares de soja têm recomendações de correção de fertilidade e adubação desenvolvidos pela Embrapa e seus parceiros. O Brasil tem aproximadamente 20% do seu território com pastagens. Estamos falando de 160 milhões de hectares. Cinco variedades de pastagens desenvolvidas pela Embrapa hoje ocupam 40 milhões de hectares, ou seja, um quarto de toda a área produzida com pasto. A nossa inserção no agro é muito relevante e significativa. Nós precisamos, obviamente, comunicar mais e melhor.

O senhor vê a possibilidade de uma Embrapa mais enxuta, com redução na quantidade de unidades?

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Essa é uma questão que precisa ser debatida com calma. Temos capilaridade muito grande. O tempo todo somos chamados a abrir novas unidades e a gente, obviamente, tem refutado essa ideia. Mas, sob a orientação do Ministério da Agricultura, com participação do setor produtivo, poderemos enxugar estruturas, fundir se for necessário.

Uma das críticas do setor é a de que a Embrapa não olha para as necessidades do produtor e que as decisões estão centralizadas em Brasília. Como o senhor avalia isso?

Eventualmente, em algumas cadeias isso pode ter acontecido. Dentro do planejamento estratégico, mandamos um questionário a representantes do setor privado e recebemos em pouco menos de uma semana mais de mil respostas sobre demandas e ações que temos que conduzir. Em três semanas, já me reuni duas vezes com o colegiado de gestores, os cinco chefes de unidade que representam os 43. A nossa filosofia é de cada vez mais descentralizar a ação da Embrapa, ter uma aproximação maior com o setor privado e com o setor produtivo, para que a gente possa aumentar a nossa participação nas soluções e, quem sabe, chegar a 100% da área agrícola e pecuária do Brasil com tecnologia da Embrapa e de seus parceiros.

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Com a maior parte do orçamento da Embrapa consumido pela folha de pagamento de pessoal, o investimento em tecnologia não fica restrito?

Hoje, em torno de 80% do orçamento está comprometido com salários e encargos. É importante colocar que, no mundo todo, essa relação varia de 70% até 85% (orçamento comprometido com salários e encargos), como no ARS (Agricultural Research Service ou Serviço de Pesquisa Agrícola do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), a Embrapa dos EUA e no Cirad (Centre de coopération internationale en recherche agronomique pour le développement ou Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento), a Embrapa da França. Isso porque o principal ativo das instituições de ciência, tecnologia e inovação são cérebros.

Há algum plano para reduzir pessoal?

Sob orientação dos Ministérios da Agricultura e da Economia, estamos com um plano de demissões incentivadas, com 1.389 pessoas inscritas. Quando essas pessoas saírem, vamos reduzir o gasto com folha de pagamento. Temos autorização do Ministério da Economia para repor 75% das pessoas que saírem. Essas pessoas entrarão na empresa com salários mais baixos. A gente entende que vai conseguir chegar a 65%, talvez 70%, do nosso orçamento comprometido para pessoal e encargos e os outros 30% a 35% para investir em pesquisa. Com a nova lei trabalhista, e obviamente feitas todas as negociações, nós vamos poder terceirizar, e a terceirização vai nos ajudar a reduzir os gastos com encargos trabalhistas. Todo esse conjunto de medidas vai ajudar a Embrapa em 2020 a ter um orçamento mais equilibrado.

Em entrevista ao 'Broadcast Agro', o ex-presidente da Embrapa Sebastião Barbosa disse que havia previsão de concurso público no ano que vem. Há?

Não, isso não está garantido. O que foi acordado como o Ministério da Economia é que nós poderíamos repor até 75% das vagas das pessoas que saíssem. Sobre a questão do concurso e essa reposição, precisamos discutir primeiro com a ministra Tereza Cristina e depois com o governo federal.

A Embrapa está adotando outras medidas para atender às demandas do setor produtivo?

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Ttemos uma estratégia desenhada e vamos discutir isso com a ministra Tereza Cristina. A ideia é formar fundos privados, que são muito comuns nos EUA. Lá, produtores de soja colocam em um fundo alguns centavos de cada saca de soja comercializada e depois os próprios produtores definem onde serão usados os recursos. Acho que isso pode ser feito no Brasil também. A Embrapa tem hoje 106 mil hectares de terra. Nós entendemos que é possível disponibilizar parte dessas terras, e que esse recurso seja investido na pesquisa. Também iniciamos nos últimos meses uma negociação com um fundo privado que pretende fazer uma doação para a Embrapa da ordem de R$ 220 milhões que serão usados para pesquisa.

No Congresso da Abag, no início do mês, a ministra elogiou seu trabalho e fontes do setor mencionaram a possibilidade de o senhor ser efetivado no cargo. Como vê isso?

Com tranquilidade. Sou funcionário de carreira, tenho 25 anos de empresa. Fui pesquisador durante 18 anos, conduzi um programa forte de pesquisa, fui chefe de uma unidade descentralizada, de uma unidade central, diretor executivo de pesquisa e desenvolvimento e agora estou interinamente na presidência. Tenho seguido as orientações da ministra, procurado o setor, conversei com várias lideranças. Se assim a ministra assim o entender, eu seguirei com muita honra nessa posição.

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