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Entre o Bom Velhinho e a Velhinha Má...

Por Marco Antonio Rocha
Atualização:

Papai Noel chega hoje à noite e, pelo que dizem os jornais, os telejornais, as rádios, as lideranças do comércio e as da indústria, chega com o saco cheio das alegrias do ano que passou. É o que apregoam os números da economia, que vão saindo à medida que nos aproximamos do espoucar das champanhes finalizadoras. Por falar nisso, será que não faltará champanhe para tantas comemorações? A Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) previa, há poucos dias, que, em termos de crescimento do emprego industrial, 2007 será melhor do que 2004, que até agora detinha o troféu do maior crescimento do emprego industrial nos últimos 20 anos - e também o terceiro de melhor atividade geral. Não sabemos o que a Fiesp nos dirá quando já tiver os resultados do quarto trimestre do ano, mas, há poucos dias também, um dos seus diretores, Paulo Francini, vaticinava que poderá ser melhor do que o terceiro, quando o PIB cresceu 5,7% em relação ao mesmo período de 2006, segundo o IBGE. Informações auspiciosas e prognósticos otimistas chegavam de todas as áreas de atividade antes do Natal, e turbinavam as conversas sobre planos de investimentos nos encontros de fim de ano entre jornalistas e diretorias das associações das classes empresariais. Conversas calçadas, também, nas maravilhas que o mercado de ações brasileiro propiciou como contribuição ao otimismo geral, neste que ainda poderá ficar conhecido como o Ano dos IPOs, no qual a captação de recursos por meio do lançamento de ações ascendeu a quase metade do total de recursos levantados por todos os tipos de papéis. O comércio não tem do que se queixar. O movimento bateu recordes seguidos durante meses, cabendo o troféu principal, ao que parece, ao setor automobilístico. As exportações se superaram, o balanço de pagamentos apresenta superávit confortável, apesar do aumento das importações, e há muito tempo os óculos cor-de-rosa do Mestre Pangloss não emolduravam tantas faces. Este era e é o cenário para a chegada do Bom Velhinho. Mas, na última semana, a Má Velhinha - a inflação - apareceu com seus esgares tétricos nos prognósticos para o ano que vem, primeiro sobre o cenário internacional e, ainda agorinha, sobre o do Brasil. A bruxa não veio out of a blue sky. Foi trazida ao palco iluminado dos festejos natalinos pelas mãos de alguns analistas, nacionais e internacionais, particularmente dos que se comprazem em enxergar o túnel no fim da luz - caso do louvado ex-presidente do banco central americano (o Fed) Alan Greenspan. O problema com esses analistas não são as trombetas do apocalipse que sopram, pois advertências são sempre úteis. O problema é que eles se mostram, ou tentam ser, estritamente racionais... E o mundo não é racional. Aliás, Greenspan mesmo, durante sua gestão, testemunhou como a exuberância irracional pode atropelar a racionalidade. Sempre pode. Por mais esforços que façam os economistas e ensaístas no sentido de combater a irracionalidade no comportamento dos mercados e dos investidores. Isso, todavia, é tema para seminários acadêmicos de altas indagações filosófico-econômicas, e não para artigos de jornal. De qualquer forma, justifica-se algum "pé-atrás" no otimismo que prevaleceu até agora. Mesmo porque a possibilidade de uma retomada inflacionária veio acompanhada de outro fantasma: o da recessão nos Estados Unidos, onde o drive do crescimento foi muito positivo este ano. Menos crescimento e mais inflação é uma receita pra lá de indigesta. A desvalorização dos ativos imobiliários nos Estados Unidos continua perturbando o sono dos diretores de bancos, cujo desafio imediato é sobre o "que fazer" para reparar as perdas - se é que podem ser reparadas. Mas a perspectiva de que isso ainda deságüe numa recessão brava perturba o sono de investidores de todo o mundo, pois o que esperar da evolução dos negócios, no mundo ou no Brasil, se a locomotiva principal desacelera? No jornal Valor de terça-feira passada, a opinião do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga era acabrunhante, pois mostrava que é ilusório esperar que as compras da China e dos países emergentes no mercado americano mantenham o nível de atividade naquele país, desarmando a recessão. O argumento de Fraga é que o consumo da economia americana é dez vezes maior que o da economia chinesa: "É impossível que haja uma compensação (da economia chinesa) para uma desaceleração nos EUA." Ainda mais que "a China está tentando desacelerar a (sua própria) economia". Assim, "não dá para descartar uma recessão", cuja probabilidade é "de 50% para cima". Nos Estados Unidos e, por conseguinte, no mundo. No Brasil, a idéia que se tem difundido é a de que essa esperada redução da demanda mundial não terá efeito interno dramático, uma vez que pode ser compensada pela aceleração da demanda interna - com a qual muita gente conta, haja vista as intenções de investir, as importações de bens de capital e outros indicadores -, que preservaria o momentum de geração de empregos, de elevação do poder aquisitivo e da propensão para consumir, ou seja, tudo o que alimentou o mercado neste ano. Mas, para isso, há que ter investimentos, públicos e principalmente privados. Só que os investimentos públicos, apesar dos astronômicos aumentos de arrecadação, andam a passo de tartaruga. E os investimentos privados - que se alimentam sobretudo da confiança do investidor - tendem agora a ficar em suspense em razão do festival de trapalhadas em que mergulhou o governo - e principalmente sua equipe econômica - depois que foi derrubada a prorrogação da CPMF. Só o que nos livrará, portanto, de um quadro de estagflação no ano que vem é: 1) Clareza do governo sobre como lidar com a perda da CPMF; 2) muito mais rigor, agora, na condução das finanças públicas. *Marco Antonio Rocha é jornalista. E-mail: marcoantonio.rocha@grupoestado.com.br

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