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Escassez global de chips é um desafio para a esperança de Biden de reavivar a indústria

Uma escassez global de um componente crucial para carros e eletrônicos fechou fábricas americanas e desencadeou uma furiosa competição para garantir o fornecimento

Por Ana Swanson
Atualização:

WASHINGTON - O presidente Joe Biden tomou posse com planos de ajudar a economia a se recuperar da pandemia de coronavírus e incentivar um ressurgimento da indústria doméstica de mercadorias como automóveis e semicondutores. 

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Um mês após assumir a presidência, porém, uma escassez global de chips fechou fábricas de veículos nos Estados Unidos, atrasou carregamentos de produtos eletrônicos e colocou em questão a segurança das cadeias americanas de fornecimento.

A escassez dos componentes vitais para automóveis, celulares, refrigeradores e outros aparelhos eletrônicos está apresentando, logo de início, um desafio à promessa do governo de reavivar um setor da manufatura encolhido pela pandemia. E impulsionou um esforço por parte do governo de apelar para embaixadas americanas e governos estrangeiros na tentativa de aliviar essa escassez, mesmo que a Casa Branca reconheça que há, muito provavelmente, poucas soluções para esse gargalo de fornecimento a curto prazo.

Em breve, a Casa Branca planeja emitir uma ordem executiva que caminhará no sentido de abordar esse tipo de vulnerabilidade em cadeias de fornecimento fundamentais a longo prazo, afirmou na semana passada um porta-voz do governo. O decreto vai iniciar uma revisão das cadeias domésticas de produção e fornecimento de artigos essenciais - incluindo terras-raras (mineral fundamental para a manufatura global), insumos médicos e semicondutores - com um foco particular em diminuir a dependência de atores internacionais não confiáveis ou hostis.

Aumento do salário mínimo foi promessa de campanha de Joe Biden Foto: Saul Loeb/AFP

Nesse meio tempo, autoridades do governo começaram a buscar maneiras de aliviar a escassez imediata. Jake Sullivan, conselheiro de segurança nacional, e Brian Deese, diretor do Conselho Nacional de Economia, se envolveram nos esforços de aumentar a disponibilidade de chips; Sameera Fazili, vice-diretora do Conselho Nacional de Economia, e Peter Harrell, diretor sênior do Conselho de Segurança Nacional, estão liderando a análise das cadeias de fornecimento, afirmou o porta-voz da Casa Branca.

Os Estados Unidos também tentaram melhorar as relações com Taiwan, um dos maiores produtores mundiais de chips, para garantir que os consumidores americanos não fiquem em desvantagem. Em carta, Deese agradeceu a Wang Mei-Hua, a ministra taiwanesa da economia, por sua “atenção pessoal e o apoio na resolução da atual escassez enfrentada pelos fabricantes americanos de automóveis”.

Ao longo do ano passado, o governo Trump tentou fortalecer os laços com o governo taiwanês e com fabricantes como a Taiwan Semiconductor Manufacturing Co. para fazer face à crescente influência da China no mercado de chips.

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O governo Biden também está se reunindo com fabricantes de automóveis e fornecedores para identificar gargalos e pedir que eles trabalhem conjuntamente em relação à escassez. Mas a Casa Branca reconheceu que suas opções para aliviar qualquer queda de fornecimento são provavelmente limitadas, dada a feroz concorrência global por semicondutores. Muitos fabricantes de chips já estão trabalhando em capacidade máxima, e levará ainda alguns meses até que seja possível aumentar mais a produção, afirmam analistas.

A escassez foi particularmente problemática para a indústria automotiva, porque a produção de veículos depende de dezenas de chips de computador para componentes eletrônicos que controlam motores, transmissões, sistemas de entretenimento, freios e outros. Tanto a General Motors quanto a Ford estimaram que a escassez diminuirá seu lucro operacional em pelo menos US$ 1 bilhão este ano.

A GM paralisou a produção de uma fábrica nos EUA, uma no Canadá e outra no México até pelo menos meados de março. Em uma quarta fábrica, a empresa decidiu produzir veículos sem os componentes eletrônicos que estão em falta. Quando os componentes voltarem a estar disponíveis, a GM os instalará e enviará os veículos para as concessionárias.

A Ford cancelou turnos de trabalho na semana passada em duas importantes fábricas de picapes. Uma delas, próxima a Kansas City, no Missouri, ficou fechada esta semana por causa do mau tempo e de uma escassez de gás natural no meio-oeste.

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Economistas afirmam que, provavelmente, o efeito disso será pequeno, mas perceptível. Mark Zandi, economista-chefe da Moody's Analytics, disse esperar que a escassez de chips reduza as vendas de veículos novos para 450 mil unidades em 2021. Isso diminuiria a produção geral da economia americana em aproximadamente US$ 15 bilhões, o que mal equivale a 0,1% do PIB, que tem expectativa de crescimento de 5,6% este ano, afirmou ele.

Analistas da indústria afirmam que a escassez de chips ocorre em parte por causa de uma tendência anterior à pandemia, de fortalecimento e esgotamento de inventários nesse setor, exacerbada por rupturas de fornecimento relacionadas ao coronavírus que levaram a escassez de outros produtos, como bicicletas ergométricas, tablets e brinquedos.

Fechamentos de fábricas, primeiramente na China e depois em outros países de todo o mundo, abalaram a produção de chips - e dos carros e eletrônicos que precisam deles. Fabricantes de automóveis e de eletrônicos subestimaram, então, o aumento da demanda, que motivou as empresas a correr atrás das fabricantes de chips para garantir seu fornecimento, de acordo com analistas.

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A política comercial do presidente Donald Trump também pode ter influenciado a situação, já que as fabricantes de chips anteciparam que as restrições americanas ao tipo de tecnologia que empresas chinesas como Huawei poderiam comprar diminuiria essa demanda. Os fabricantes de chips responderam com cortes de produção.

As recentes nevascas também fecharam ou diminuíram a produção de fábricas de chips da Samsung e da NXP Semiconductors próximas a Austin, Texas, potencialmente exacerbando essa escassez.

John Neuffer, presidente da Associação da Indústria de Semicondutores, afirmou que a pandemia embaralhou o equilíbrio de curto prazo entre oferta e demanda de chips.

“As empresas de chips estão trabalhando duro para atender à demanda do setor automotivo e de outros segmentos”, afirmou ele, “mas esses produtos são altamente complexos, podem levar meses para serem produzidos e, infelizmente, resolver o problema não é tão fácil quanto apertar um botão”.

Neuffer afirmou que a escassez evidenciou a necessidade de o governo americano “investir agora na produção doméstica de semicondutores e em pesquisa, para que os novos chips que precisarmos sejam produzidos bem aqui, em solo americano”.

Os EUA são lar de empresas como Intel, Nvidia, AMD, Micron e Qualcomm, e o país ainda é responsável por desenvolver muitos dos mais avançados chips do mundo. Mas a fatia americana na capacidade global de fabricação de chips caiu de 37% em 1990 para 12%, de acordo com dados da Associação da Indústria de Semicondutores. A mudança ocorreu conforme empresas americanas foram terceirizando sua produção e governos de países como Coreia do Sul, Cingapura e China, entre outros, subsidiaram agressivamente a produção. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL