‘ESG será questão de sobrevivência para empresas’, diz executivo do Grupo Boticário

Artur Grynbaum diz que as novas gerações, além de nativas digitais, são ‘nativas do ESG’ – o que exige revisão de negócios

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Por Andre Jankavski e Fernando Scheller
4 min de leitura

O Grupo Boticário busca comprovar seu comprometimento com causas socioambientais com recursos carimbados todos os anos: a companhia investe 1% de sua receita anual nesse tipo de projeto. Segundo Artur Grynbaum, sócio e vice-presidente do conselho do Boticário, isso deve ficar mais comum à medida que aumentar a pressão da sociedade em relação à atuação ESG (sigla em inglês para as áreas ambiental, social e de governança). “O tema ainda se constitui como diferencial, mas se tornará uma questão de sobrevivência para as empresas”, afirma.

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Artur Grynbaum, sócio e vice-presidente do conselho do Grupo Boticário Foto: Boticário - 4/4/2019

A empresa destina 1% da receita para projetos ESG. Como essa decisão foi tomada?

Sempre patrocinamos vários projetos e nos questionávamos o que aconteceria caso um dia não déssemos lucro. Então, pensamos em fazer diferente. Em vez de ser atrelado ao resultado, colocamos a receita como padrão. Isso fez com que procurássemos espaço na demonstração de resultados para continuar entregando os produtos com qualidade e bom preço, mas também com preocupação ambiental e social. Foi um jeito que encontramos para que todos na empresa entendessem a maneira de fazer negócio do grupo e buscassem maneiras de atrelar as receitas a esses objetivos. Continuamos buscando resultado, mas sem ignorar esses assuntos. 

Mas houve muita resistência dos funcionários? 

Ninguém saiu. Disse que conversaríamos com quem não concordasse, mas, para bom entendedor, meia palavra basta. As pessoas entenderam que era sério e que precisariam mudar a cabeça. Todos, depois, entenderam a decisão.

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Isso mostra que as lideranças executivas precisam estar mais engajadas no tema?

Não tenho dúvida. Um dia ouvi que quem define a cultura são os acionistas, mas não são apenas eles. É claro que têm um peso relevante, mas a gestão também tem. As pessoas têm o direito de não concordar, mas buscamos um alinhamento de ideias no bom sentido e em vista dos melhores objetivos. 

A companhia fez uma captação de R$ 1 bilhão em títulos sustentáveis. O ESG também se mostra oportunidade para as empresas?

Hoje, há vários fundos lastreados em ESG. Mas a grande oportunidade é de sermos cada vez mais assertivos com a visão do consumidor. Nos anos 1980, a questão da qualidade era um diferencial, e quem não tinha isso estava fora do jogo. Hoje, vejo o ESG da mesma forma. Na verdade, o tema ainda se constitui como diferencial, mas se tornará uma questão de sobrevivência para as empresas. As gerações mais novas, além de nativas digitais, são nativas do ESG. Cada vez mais os consumidores estão se perguntando sobre o trabalho das empresas na sociedade. 

O tema da equidade racial está em ebulição. A empresa foi eleita a melhor companhia para profissionais negros trabalharem. Como o tema é tratado?

Como tudo o que fazemos, vejo com naturalidade. O que está acontecendo agora não é uma mudança só das empresas, mas da sociedade. Se eu me fechar e não seguir isso, vou estar falando uma linguagem totalmente diferente da sociedade. Se quero alcançar essas pessoas, sejam negras e LGBTQIA+, tenho de ter gente no meu time para trazer esse conhecimento e pensar nas melhores soluções. 

Mas como está essa questão hoje? As mulheres são maioria? E quanto aos negros?

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Os números trazem apenas uma fotografia, e eu gosto de ver como um filme. Há um tempo, tínhamos 50% da liderança feminina e 50% masculina. Hoje não estamos no meio a meio. Porém, estamos avançando para chegar até 2025 com 50% de lideranças femininas. E até 2023 queremos que 50% dos nossos colaboradores sejam negros, com 15% em cargos de liderança. 

Como o senhor enxerga o papel do Boticário na discussão sobre o respeito ao meio ambiente?

Sempre tivemos olhar forte para o nosso negócio, mas também para a sociedade. Se volto na década de 1980, já trocávamos produtos por roupas nas lojas para enviar às vítimas de enchentes no Sul do Brasil. Hoje, somos uma das principais entidades do mundo na questão de conservação ambiental e temos mais de 1,6 mil projetos aprovados. E, agora, não enxergamos apenas a questão do ambiental, mas também do social e do econômico. 

Como isso é cobrado de parceiros e fornecedores?

Temos um programa de reconhecimento estratégico dos nossos fornecedores há mais de 20 anos e oferecemos a oportunidade de desenvolvimento. Em 2017, fizemos um novo programa para desenvolver esses parceiros para ampliar o conhecimento, trazer melhoria dos processos, mas que também façam os ponteiros se mexerem, tanto em sustentabilidade quanto em diversidade. E precisamos deles para atingir nossos compromissos até 2030.

Como é lidar com o discurso do governo em relação ao tema ambiental e também em relação à diversidade?

As questões passam sempre por um reconhecimento da situação. Acredito que o governo tem o olhar dele e talvez não tenha trazido (essas questões) como os principais pontos das suas ações. Obviamente, se tivéssemos um movimento coordenado mais efetivo e pudéssemos ter mais ações voltadas a isso, a capacidade para resolver aumentaria muito. Mas ainda bem que as empresas estão conscientes disso e estão tomando decisões importantes para trazer um pouco mais de luz para esse tema e (opções de) solução.