24 de agosto de 2015 | 21h00
O princípio de pânico que tomou os mercados nesta segunda-feira tem como uma de suas principais causas a falta de transparência da economia da China. Ninguém sabe o tamanho da encrenca enfrentada pelo setor produtivo nem a verdadeira situação dos bancos.
São tremores de forte intensidade que atingem a segunda maior locomotiva do mundo. Trata-se de grande importadora de alimentos, de energia e de matérias-primas (commodities). No entanto, ostenta uma administração hermética, embora aberta aos capitais, cujos administradores de tempos em tempos, como agora, sentem que operam na escuridão.
China causa pânico nos mercados, derruba Bolsa e leva dólar para o maior nível desde 2003
Há duas semanas, o Banco do Povo da China deu início a um processo que desvalorizou a moeda nacional, o yuan, em cerca de 2,9%. A decisão foi percebida como sinal de fragilidade. Imediatamente levantou questões sobre se o ajuste cambial seria suficiente para puxar pelas exportações e, em seguida, pela alta das importações de commodities.
A Bolsa de Xangai já caiu 12,39% apenas neste mês, também por falta de clareza. No sábado, o Conselho Estatal da China pela primeira vez autorizou os fundos de pensão administrados por governos locais a adquirir ações para suas carteiras e, assim, criar mais demanda para ativos em rejeição. Apesar desse empurrão, as ações mergulharam 8,5% nesta segunda-feira, aparentemente porque os investidores viram nessa decisão reconhecimento implícito de que a economia chinesa está muito desarrumada.
Os mercados suspeitam de que haja uma bolha em processo de perfuração, que não alcança só o mercado de ações, mas, também, o mercado imobiliário e os bancos, que podem estar excessivamente carregados com títulos ruins.
Mas não dá para ignorar a importância de três fatores positivos. O primeiro é o ritmo da produção e da criação de renda. Por mais que venha sendo atingido pela tempestade, o PIB da China segue crescendo acima de qualquer outra economia do mundo, a um ritmo que pode não ser mais de 7,0% ao ano, mas está entre 6,0% e 6,5%. O segundo é a montanha de reservas de US$ 3,7 trilhões, que deveria passar mais segurança às novas manadas de sinocéticos. E o terceiro, o de que, seja como for, a China seguirá como grande importadora de commodities, especialmente de alimentos.
As convulsões chinesas vêm sendo transmitidas em onda pelo resto do mundo porque atingem os países emergentes, entre os quais o Brasil, seus grandes fornecedores. (Veja o Confira.)
Se a derrubada dos preços das commodities se intensificar - e persistir -, será inevitável o impacto deflacionário nas economias maduras. Um processo acentuado de deflação produz estragos equivalentes ou até maiores do que os da inflação, porque adia as compras dos consumidores, que ficam à espera de queda de preços, reduz a arrecadação dos governos e aumenta as dívidas, na medida em que estas não encolhem na proporção em que encolhem preços e salários.
Nessas condições do mar, o capitão despeja as cargas para aliviar o navio. Mas hoje, no Brasil, a crise política, tão grande ou até maior do que a econômica, vem lançando dúvidas sobre quem de fato comanda o navio.
CONFIRA:
Aí está o mergulho das cotações do petróleo apenas em agosto.
Mais um adiamento?
A deterioração da economia dos países emergentes não interessa às economias maduras, porque lhes tira mercado exportador. Nas outras crises, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) participou ativamente do ajuste por meio da derrubada dos juros. Mas, desta vez, os juros estão prostrados e não há como derrubá-los mais. Isso sugere que o Fed não tem outra opção senão adiar para 2016 o início da tão esperada alta dos juros (valorização do dólar).
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