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'Está começando a pintar um cenário em que a Selic não vai chegar a 12%', diz Tony Volpon

Para o economista, a desaceleração da economia nos últimos meses indica que o Banco Central não deverá elevar a taxa básica de juros acima de 12% no ano que vem

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Por Márcia De Chiara
Atualização:

O economista Tony Volpon, estrategista-chefe da WHG (Wealth High Governance) e ex-diretor do Banco Central (BC), acredita que o limite para alta da taxa básica de juros, a fim de conter a inflação, seja 12%. Apesar de boa parte do mercado indicar que o BC deva colocar os juros nas alturas, o economista observa que, por causa dos resultados dos últimos indicadores – PIB (Produto Interno Bruto), vendas no varejo, produção industrial –, o ritmo de desaceleração da atividade está mais rápido do que o esperado.

“Colocar os juros em 13% só piora a recessão”, afirma o ex-diretor do BC. Ele lembra também que só uma pequena parcela da alta dos juros já teve impacto na atividade. “Tem um caminhão de juros para jogar na cabeça da economia”, alerta. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Para Tony Volpon, o Banco Central 'errou muito e teve azar'. Foto: Amanda Perobelli/Estadão - 27/7/2017

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Até quando o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC deve subir os juros para conter a inflação?

Chegamos a precificar uma Selic a 14%. Mas parece que estamos tendo uma desaceleração da economia mais rápida do que o mercado estava prevendo. Temos uma sequência de dados da atividade econômica bem fracos, inclusive as vendas do varejo que foram um show de horror, o resultado do PIB do terceiro trimestre, produção industrial. Acho que as expectativas de crescimento para este ano e o próximo devem cair de novo nas próximas versões do Boletim Focus. Esse é um elemento novo que deveria impactar o que o BC irá fazer na primeira reunião d e 2022. Agora está começando a pintar um cenário em que a Selic não vai chegar a 12%. Acredito que a última alta de juros ocorra na reunião de fevereiro e o ciclo se encerre com uma taxa entre 11% e 12%, mas não acima de 12%.

A fraqueza da economia vai ajudar na redução da inflação?

Certamente ajuda. Não há ciclo monetário de desinflação sem a contribuição da atividade menor, porque pega na demanda. A inflação de hoje é fruto de coisas que aconteceram seis meses atrás. E qual foi o passado que levou a uma inflação de 11%? No passado, o BC colocou os juros em patamar negativo, algo que nunca tinha feito propositadamente desde o início do Plano Real. Deixou o câmbio se desvalorizar fortemente. Fez tudo isso num período em que ficou claro que teríamos uma rápida reabertura da economia global com a chegada da vacina em outubro de 2020. E o BC só mexeu nos juros em março de 2021.

O BC errou?

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Errou muito e teve azar. Teve crise hídrica, a bagunça fiscal que começou em janeiro e se estendeu por quase o ano inteiro, o câmbio desvalorizou muito. A economia brasileira estava crescendo fortemente porque houve a reabertura e as pessoas estavam com mais dinheiro no bolso, além da pressão nos preços das commodities. Quando a gente olha hoje, o que vai ser a inflação em seis meses? Os juros já não são mais negativos e devemos ter uma taxa real indo para 6% ou 6,5%. O câmbio nominal tem ficado quase no mesmo patamar o ano inteiro. Nas commodities, há preços subindo e caindo. E a economia está desacelerando fortemente. As pessoas com muito menos dinheiro por conta da corrosão da renda pela inflação e redução das transferências fiscais. É um movimento contrário ao que houve no ano passado. O ano que vem será 5% mesmo de inflação, mas 2023 tem uma eleição no meio.

Então, o que está acontecendo?

O mercado está expressando uma opinião política ao elevar a expectativa de inflação para 2023. Ele está dizendo o que deve acontecer na eleição deve ter efeito negativo sobre a inflação. Isso pode até ser verdade. Mas é preciso ter um pouco de cuidado. O BC não é agência política. O BC cometeu aquele erro no passado e agora está em busca da credibilidade perdida. Tem um monte de gente falando que tem de colocar os juros nas alturas. A partir dos dados conhecidos, parece que estamos caminhando para uma recessão. Então, colocar os juros em 13% só piora a recessão, em busca da credibilidade perdida. Esse não é o papel do BC.

Agora a questão é de dosagem dos juros?

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Sim. Ninguém está discutindo que o juro não tenha que subir. Da mesma maneira que o BC errou na dosagem baixando 2%. Juro de 2% era justificado quando se achava que não haveria vacina. Mas quando veio a vacina não era mais justificável. O BC não pode cometer agora o erro com o sinal trocado.

Quando o sr. acha que a inflação volta para a meta?

Acho que em 2023. Obviamente, estou pressupondo que o resultado eleitoral não seja um desastre total. Quando as condicionantes da inflação viraram ao contrário, como estão virando agora, a inflação fica artificialmente alta por causa da inércia. Mas quando a inércia se desgasta e o BC fica segurando os juros, a inflação desaba. Acho que vai acontecer isso em 2023. Movimento semelhante ocorreu em 2015 e 2016 e a inflação desabou em 2017. Mas não estou dizendo que em 2023 a inflação vá ficar abaixo da meta como em 2017.

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O intervalo entre a alta dos juros e o impacto na economia real é de cerca de seis meses, então uma parte dessa alta de juros dos últimos meses não se manifestou?

Não se manifestou, por isso o cenário é meio preocupante. Estamos vendo a desaceleração da atividade em dezembro. E, em tese, estamos pegando um pouquinho da alta do juro, quando ele foi de 2% para 2,75%. Tem um caminhão de juros para jogar na cabeça da economia. O impacto dos juros sobre a economia começa em seis meses e pode se estender até dois anos. Esse aumento de juros pode prejudicar a economia em 2023. A gente acha que 2023 pode ser recessivo, mas tem uma eleição no meio. Por outro lado, se o mercado e a economia real se preocuparem menos com resultado eleitoral e um eventual provável ganhador da eleição disser coisas certas, como os preços dos ativos caíram muito, então um pouquinho de expectativas positivas no fim do processo eleitoral poderá salvar 2023.

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