‘Estou vendendo a soja que está embaixo da terra', diz produtor

Com aumento da demanda pelo grão, produtores como Silvio Malutta, de Itapeva (SP), aceleram venda futura da safra que acabou de ser plantada

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Por José Maria Tomazela
3 min de leitura

ITAPEVA, SP - Com o cenário favorável à exportação do grão brasileiro, produtores de soja estão ampliando a venda antecipada da safra que ainda está sendo plantada nas principais regiões produtoras do País. Pelo menos a metade da produção futura dos 3 mil hectares que o produtor Silvio Malutta acaba de plantar nas áreas de cultivo da Fazenda Fratelli, em Itapeva (SP), já está vendida.

Guerra comercial. Agricultor Silvio Malutta apostou na produção de soja Foto: EPITACIO PESSOA /ESTADAO

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“Estou vendendo a soja que está embaixo da terra, pois, em muitos talhões, as sementes ainda nem brotaram”, diz. Experiente, o produtor já sabe que deve colher em torno de 80 sacas por hectare. “A gente antecipa a venda para recuperar o dinheiro investido no plantio. Para uma parte vendida há três meses, com o dólar mais alto, consegui travar o preço em R$ 81 a saca aqui na fazenda. De lá para cá, o cenário piorou um pouco”, disse.

Malutta não vê só vantagens para a soja brasileira na disputa comercial entre EUA e China. “Num primeiro momento, eu acreditei que essa briga seria interessante para nós, mas agora tenho dúvidas. Os americanos têm condições de vender para a Europa e nós podemos perder parceiros. A China é um grande mercado, mas é ruim ficarmos na dependência de um comprador só”, disse. Ele avalia que os preços da soja chegaram a subir em função da disputa, mas não se sustentaram porque, com menos venda da soja americana, os estoques aumentaram. Na quarta-feira passada, a soja levada ao porto de Santos, livre do frete, estava a R$ 75 a saca.

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O produtor Maurício Fernandes Dias, da Fazenda Capituva, em Taquarivaí, já vendeu quase 70% da soja que acabou de plantar. “Aproveitei a subida do dólar, que chegou a R$ 4,30. Nesse momento, as vendas futuras não estão com preço muito bom”, disse. Dias avalia que o impacto da guerra comercial ficou abaixo da expectativa. “Era esperado um preço melhor para a soja este ano. Fechamos a saca a R$ 78 em média, ante a média de R$ 73 no ano passado, porque o dólar subiu em relação ao real.” Ele lembra que os custos de produção também aumentaram. 

O produtor é um dos que apostaram num cenário favorável para a soja brasileira motivado também pela expectativa de aumento no consumo mundial do grão. Na região de Itapeva, Dias ampliou a área de soja de 3,8 mil hectares, na safra passada, para 5 mil hectares agora. 

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A região de Itapeva é a que mais produz soja no Estado de São Paulo. São 196 mil hectares, com produção de 11 milhões de sacas. São Paulo está em oitavo lugar entre os Estados na produção nacional de soja, liderada pelo Mato Grosso. Lá, com 90% da nova safra semeados, os produtores já venderam 35% da produção futura, um volume 3% mais alto que na safra passada, segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Aplicada (Imea). 

Conforme o Imea, as vendas futuras foram aceleradas entre setembro e outubro, com o dólar mais alto. Isso aconteceu mesmo com o tabelamento do frete rodoviário pelo governo federal, após a greve dos caminhoneiros, em maio, que aumentou o custo para os produtores.

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Para Nelson Schreiner Junior, presidente da Nutriceler, empresa que fabrica fertilizantes, a variação recente do preço da soja em função da guerra comercial não foi drástica. “O mercado de commodities é muito vulnerável. É normal que, diante de qualquer fato especulativo, o produtor venda nos momentos de alta”, afirma. “Mas o ganho em produtividade e a redução de custo também são pontos importantes no aumento da rentabilidade.” Junior, que também é produtor, conta que aprendeu com o pai, agricultor experiente, a estratégia de vender parte da produção no mercado futuro e parte só após a colheita. “Ele sempre acertou nos dois tipos de venda”, disse.

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