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‘Estrelas podem se alinhar para o Brasil’, diz ex-diretor do BC

Para ex-diretor do BC, cenário externo pode beneficiar o País, com a Previdência e uma nova agenda pró-investimento

Por Catia Luz e Renée Pereira
Atualização:

A rápida mudança nas perspectivas de juros dos Estados Unidos – de alta para queda – poderá representar uma janela de oportunidade para o Brasil retomar a trajetória de crescimento, avalia o ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Rodrigo Azevedo. Ele explica que, se os juros americanos forem reduzidos, pode haver aumento da liquidez mundial no segundo semestre e o Brasil pode se beneficiar desse cenário, se já tiver aprovado a reforma da Previdência e sinalizar sobre um nova agenda pró-ambiente de negócios. “As estrelas podem voltar a se alinhar para o governo brasileiro.”

Rodrigo Azevedo, ex-diretor do BC e sócio da Ibiúna Investimentos Foto: Werther Santana/ Estadão

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Depois de deixar o BC, em 2007, Azevedo se tornou sócio da Ibiúna Investimentos, que faz a gestão de mais de R$ 6 bilhões. A seguir trechos da entrevista:

O ano começou com expectativa de crescimento de 2,5%. O cenário mudou e hoje a previsão está abaixo de 1%. Como vocês veem esse novo quadro?

Até 2014 e 2015, tínhamos uma presença muito grande do Estado, seja por meio dos gastos diretos – que cresciam a uma taxa média real de 6% nos últimos 15 anos – ou pela expansão do crédito subsidiado. Nesse ambiente, o crescimento dependia muito da presença do Estado e, numa economia de pleno emprego, o setor privado estava mais retraído. Com a crise de 2015 e ajuste das contas públicas houve redução desse impulso vindo do Estado. Essa força que empurrava a economia foi retirada, o que abriu espaço para o setor privado entrar.

Mas há ambiente para o setor privado investir?

Essa é a questão. Para o setor privado ocupar esse espaço, é preciso ter confiança. Há algum tempo as perspectivas estão sendo frustradas. Quando Joaquim Levy entrou no governo (Dilma Rousseff), e (Henrique) Meirelles e Ilan (Goldfajn), no governo de Michel Temer, o mercado ficou animado. Mas o ímpeto foi frustrado. Quando passou o período eleitoral, houve um surto de confiança com a nova agenda do governo, mais favorável ao ambiente de negócio, ao crescimento econômico e à reforma da Previdência. Mas, por uma série de razões associadas a maneira como a política econômica vem sendo implementada e a dependência do executivo ao legislativo e ao judiciário, essa confiança retrocedeu.

É possível recuperar essa confiança?

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Hoje há um ceticismo grande sobre a capacidade do governo entregar uma agenda que é construtiva e muito positiva. O governo vai ter de entregar uma série de medidas para conseguir dar nova perspectiva de menos incerteza no médio prazo. Isso é crucial para o País voltar a crescer.

Este ano está perdido em termos de crescimento?

É possível lançar neste ano as bases de um crescimento expressivo em 2020. Se o governo conseguir aprovar a reforma da Previdência e, em seguida, lançar uma agenda pró-ambiente de negócios, podemos terminar 2019 numa vertente maior de crescimento e entrar em 2020 com uma perspectiva positiva. Se isso for feito, 2019 não será um ano perdido. A reforma é crucial e tem duas questões importantes: como indico para a sociedade que sou solvente no longo prazo e que a minha trajetória de dívida/PIB não é explosiva. Outra questão é que a reforma ganhou um peso simbólico.

Como assim?

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É uma reforma ampla, difícil de ser aprovada, difícil de ter apoio político e, por isso, virou simbólica do ponto de vista da capacidade de implementação deste governo. Se conseguirmos passar uma reforma da Previdência num prazo razoável e com um impacto relevante naturalmente as pessoas vão olhar e falar que tem uma parte grande do resto da agenda que provavelmente também será factível. Com isso, você começa a dar o benefício da dúvida e ter uma chance de ser o gatilho do crescimento.

Em março, a ideia era que passando a reforma viria uma enxurrada de dinheiro para o Brasil. Na sua visão, isso vai ocorrer?

Acho que vem uma parte dos recursos, mas menos do que viria em março. Nesse ponto há outros fatores importantes. O mundo está mudando muito rápido e é provável que tenha muito mais liquidez buscando oportunidade de investimento no segundo semestre do que tinha na virada de 2018 para 2019. No ano passado o Fed (Federal Reserve), que manda na liquidez mundial, falava em subir os juros. Nesse cenário, os investidores vendem tudo e compram dólar. Havia um processo de drenagem de liquidez. Mas houve uma guinada de 180 graus do Fed num prazo muito rápido, não usual. Agora, apenas seis meses depois, estamos discutindo se o Fed vai cortar 0,25 ponto porcentual ou 0,5 ponto na reunião deste mês. É uma mudança muito grande.

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Qual é a implicação disso para o Brasil?

Pode sobrar muito dinheiro para o resto do mundo. Mas vai depender da evolução da guerra comercial. Se for uma guerra comercial mais branda e o crescimento global se estabilizar com a ajuda dos bancos centrais, aí podemos ter muita liquidez. Às vezes, ter sorte ajuda. E talvez Paulo Guedes (ministro da Economia) tenha sorte de contar com o mundo que lhe seja menos hostil. Com a reforma da Previdência aprovada, uma nova agenda anunciada em seguida e esse cenário externo, talvez o País seja capaz de reegantilhar o crescimento mais rápido e a gente passe a virada de 2019 para 2020 numa trajetória de crescimento bem mais promissora para o ano que vem. Então o cenário externo é muito importante. O timing dessa virada é importante.

Mas há a possibilidade de o mundo entrar em recessão.

Sim. Se entrar em recessão, os bancos centrais vão cortar muito mais os juros e, nesse cenário, todo mundo quer dólar. Aí não vai ter dinheiro para o Brasil. Mas se tiver uma guerra comercial branda e o crescimento estabilizar, daí vai haver muita liquidez, que vai buscar oportunidade de investimento. E o Brasil pode se beneficiar. Essa é uma consideração importante. Outra coisa importante: da guerra comercial para guerra cambial.

Já há também uma guerra cambial?

Com os EUA crescendo mais que o mundo, todo mundo foi para o dólar. Agora, com a economia americana mais lenta, os EUA vão ficar mais perto de todo mundo. Se o dólar começar a se enfraquecer é razoável que isso vá ocorrer num ambiente de convergência de crescimento. Só que neste momento a única força motriz de crescimento que você tem em algumas partes do mundo, em particular na Europa, são as exportações. A Europa não aguenta nesse momento um euro forte. Resultado: na hora que os Estados Unidos começam a enfraquecer, ou mudar sua política monetária, o banco central europeu corre na frente e fala: eu vou cortar muito mais. Se os dois cortarem, o Japão também vai cortar; então você cria um ambiente de que todo mundo quer evitar que a sua moeda aprecie. Você cria um ambiente de juro para baixo.

Esse cenário é favorável ao Brasil?

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A questão é: o Brasil tem condição de jogar esse jogo? Neste momento, sim. Isso é mais uma coisa que ajuda o BC brasileiro a conseguir trazer a taxa de juros mais pra baixo com uma menor perspectiva de gerar inflação. Tudo conspira com um ambiente que pode ser mais favorável. Pode dar errado se o mundo entrar em recessão. Mas as estrelas podem voltar a se alinhar para o governo brasileiro. E aquela oportunidade que foi perdida em março pode ser retomada se a reforma da previdência for aprovada e o governo for rápido no anúncio e implementação do resto da agenda. O resto do mundo pode se alinhar e podemos ter uma virada de 2019 para 2020 muito mais promissora. Tem muito “Se”. É um cenário provável, difícil de avaliar, mas é um cenário plausível.

Falando sobre Ibiúna, essa trajetória de vocês no Banco Central e na gestão de ativos. O olhar na hora de fazer gestão é diferente?

Quero crer que sim. Acho que o que nós fazemos é operar estratégias macro muito associadas a juros e câmbio. O arroz com feijão disso aqui é analisar política monetária no Brasil e no resto do mundo. E um componente crucial dessa análise é você antecipar qual a função reação do banco central. Como é que aquele banco central reage ao mesmo conjunto de dados. Vou dar um exemplo: o banco central do Ilan reagiu muito diferente ao banco central do (Alexandre) Tombini. Você antecipar qual a função reação é uma coisa muito importante nesse business de avaliar política monetária do Brasil no mundo. E acho que ter estado lá dá uma perspectiva sobre como é o processo de tomada de decisão, quais são as variáveis mais importantes. Para um mesmo conjunto de informações, você saber como é que a função reação funciona ajuda muitíssimo. Acho que isso a gente faz bem. Isso é uma vantagem comparativa que a gente tem na Ibiúna.

E Ibiúna tem quanto de ativos?

Pouco mais de R$ 6 bilhões sob gestão, distribuídos em três famílias de fundos. Temos nove anos. Começamos em maio de 2010 e o primeiro fundo começou a operar em novembro de 2010. Três famílias de fundos: tem a família macro, que Mario (Torós, ex-diretor do BC) e eu estamos a frente, tem a família de private equity, que é tocada por André Lion, que se juntou a gente em 2011, e tem a família de previdência, com quase R$ 500 milhões em previdência, que é um híbrido das duas estratégias. Tem um gestor que toca o fundo de previdência, mas ele utiliza na verdade as posições que têm nos fundos macro e equity.

E qual o desempenho?

No Macro, Ibiúna Hedge ST, 164% do CDI desde agosto de 2012, quando foi criado; em 2019, 9,59% ou 302% do CDI.

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