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Eu paguei por Sheryl Crow?

Por Maureen Dowd
Atualização:

É de enfurecer. A economia resmunga, mas os banqueiros continuam festejando num torneio de golfe por aqui, com o nosso dinheirinho. Esse é um bom argumento para a nacionalização, ou melhor, a internacionalização. Terceirizar os empregos desses pérfidos, irresponsáveis executivos bancários para Bangalore; as farras de Bollywood devem custar menos que as de Hollywood. O site de entretenimento TMZ trouxe a história, na terça-feira, de que o banco Northern Trust de Chicago, que recebeu US$ 1,5 bilhão em dinheiro de salvamento e depois demitiu 450 funcionários, enviou centenas de clientes e empregados de avião a Los Angeles, na semana passada, e os tratou durante quatro dias com quartos de hotéis suntuosos, jantares com salmão e filé mignon, concertos musicais, um torneio de golfe da Professional Golf Association (PGA) no Riviera Country Club com translados em carros Mercedes e mochilas Tiffany. "Um representante da PGA nos contou que o Northern Trust preencheu um polpudo cheque para o patrocinador do evento," reportou o TMZ. O não confiável Northern Trust bancou um jantar faustoso no Ritz Carlton na quarta-feira, com um concerto da banda Chicago (a uma custo de US$ 100 mil); alugou um hangar privado no Aeroporto de Santa Monica, na quinta-feira, para outro grande banquete com uma apresentação da banda Earth, Wind & Fire, e encerrou na House of Blues, em Sunset Strip, no sábado (ao custo de US$ 50 mil) para um banquete com serenata de Sheryl Crow. Na ignóbil tradição de roqueiros que cantam por somas imensas para pessoas quadradas, quando não estamos olhando, Crow - em sua condição de funcionária federal - gorjeou esta letra para os desatentos foliões: "Vai devagar, Baby, você vai se dar mal/Você fica gritando é o tal, o tal, o tal/Cuidado, querida, você está de viseiras/Mas tem um novo cara em cena/Ele tem amigos mão-aberta/ Acha que vai mudar a história." O não confiável Northern Trust chegou a oferecer aos festeiros a chance de participar de um seminário sobre o aperto do crédito em que eles seguramente poderiam aprender que o governo americano é simplesmente a maneira mais recente de financiar seus negócios e embrulhar seu escritório em carpetes de US$ 87 mil. No que é agora um ritual idiota estabelecido de racionalização, o banco divulgou uma carta notando que "não procurou o investimento do governo", apesar de o ter aceito, e havia levantado US$ 3 milhões para a Fundação de Caridade da Câmara de Comércio Júnior de Los Angeles e outras organizações sem fins lucrativos. Eles retrucaram que têm um contrato para fazê-lo a cada ano durante cinco anos. Mas este não é cada ano. MANTO FILANTRÓPICO O banco se envolve num manto filantrópico enquanto esbanja nosso dinheiro, agindo como a Sociedade Americana do Câncer quando é, de fato, um câncer na sociedade americana. Ele afirmou ter tido um lucro líquido operacional de US$ 641 milhões no ano passado e agiu como se estivesse fazendo um favor aos americanos ao aceitar o dinheiro federal. Eu perguntaria ao não confiável Northern Trust: se vocês estão completamente solventes, por que estão aceitando os dólares de meus impostos? Se não estão completamente solventes, por que estão entregando os dólares de meus impostos a Cheryl Crow? Vindo num momento em que americanos céticos e enfurecidos observavam AIG, Citigroup, General Motors e Chrysler - empresas que já haviam recebido uma injeção de esteroide federal - voltando para pedir novos bilhões, o escândalo do golfe foi apenas mais um sinal de que os ricos resgatados são diferentes de você e de mim: seus apetites são insaciáveis e sua cultura incorrigível. O presidente Obama se referiu a eles na terça-feira à noite, em seu discurso no Congresso, quando disse: "Desta vez, os CEOs não poderão usar dinheiro do contribuinte para estufar seus honorários ou comprar cortinas finas ou desaparecer num jato privado. Esses dias acabaram." Mas será que eles tomaram conhecimento? John "Cômoda Antiga" Thain teve que ser intimado por um juiz para contar aos investigadores de Andrew Cuomo quais empregados da Merrill Lynch receberam aqueles US$ 3,6 bilhões em bônus que Thain ilicitamente empurrou quando sua empresa estava falindo e sendo assumida pelo Bank of America com a ajuda de um resgate de US$ 45 bilhões. Kenneth Lewis, o CEO do Bank of America, fez a afirmação absurda ao Congresso de que seu banco não tinha "nenhuma autoridade" para impedir o pagamento dos bônus, apesar de ele ter sabido deles antecipadamente. "Eles descobrem que estão com um buraco de US$ 7 bilhões nas estimativas de prejuízos para o quarto trimestre e não pensam que talvez nós iríamos voltar para acertar a conta desses bônus?", contou-me Cuomo, enquanto Thain estava finalmente sendo inquirido por investigadores, na terça-feira, no escritório do promotor geral em Nova York. "Ele se recusou a responder perguntas dizendo que ?o Bank of America não quer que eu o faça?". Pode-se usar a Quinta Emenda ou pode-se responder as perguntas. Mas o Bank of America não tem nenhum privilégio. O Bank of America não substitui a Constituição. E quem é o Bank of America, aliás?" Ele se inflama sobre a maneira como os ex-senhores do universo são obstinados, doutrinados e insensíveis. "Eles se acham reis e rainhas", completa. E não estão prontos para abdicar. * Maureen Dowd escreve para o ?The New York Times?

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