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Europa adia estabilidade - crise do capitalismo?

Por Agencia Estado
Atualização:

A Comissão de Bruxelas tirou um grande espinho dos pés de Jacques Chirac e de seu primeiro-ministro Jean-Pierre Raffarin: na verdade, a Comissão Européia tornou mais flexível sua interpretação do Pacto de Estabilidade, que abrange as finanças públicas dos países da zona euro. Nesse pacto, texto criador, texto "sacrossanto" da zona do euro, os quinze tinham fixado para o ano de 2004, irrevogavelmente, a volta ao equilíbrio orçamentário. Essa data foi adiada. Foi alterada para 2006. Bruxelas não poderia agir de outra maneira. Embora vários países da Europa tenham trabalhado muito e adotado planos drásticos (aliás, com o risco de se enfraquecerem) para reduzir seus déficits, quatro países continuavam em plena névoa. E, entre esses quatro, três são de grande peso: a Alemanha, a Itália e a França (o quarto "cancro" é Portugal). Como a Comissão de Bruxelas conseguiu aprovar essas nações sem provocar defeitos em toda a maquinaria? Bruxelas preferiu adaptar suas "regras implacáveis" (como se dizia há poucas semanas) aos problemas da conjuntura, em vez de deixar esses países caírem no desespero ou mergulhá-los na revolta anti-européia. Para a França, o déficit deverá atingir, esse ano, 2,6% de seu PIB - e ainda é uma hipótese otimista. Considerando-se a crise e promessas eleitorais feitas por Chirac, o orçamento tem chances de aumentar. E sem falar da Alemanha, onde Schroeder deixou desenvolver-se uma profunda astenia da produção. Conclusão: a flexibilidade dos membros da Comissão de Bruxelas é uma "divina surpresa" para Berlim, Paris e Roma. Esse episódio é outro sinal do mal que se espalha venenosamente no mundo. O capitalismo, que estava seguro de si mesmo (como uma dezena de Rambos ao mesmo tempo) desde o final do Império soviético, agora está com dúvidas e se pergunta. Ele vacila. Ele balbucia. O crescimento cai em toda parte. As Bolsas estão despedaçadas. Exércitos de desempregados se alastram pelas cidades. Os déficits públicos se acentuam. Enormes impérios industriais caem por terra, levando seus diretores ao inferno, os grandes "capitães" que eram o orgulho e a força desse mundo capitalista. "Inicia-se uma crise de confiança no capitalismo", escreve o grande jornalista Alain Duhamel, que é o contrário de um "esquerdista". E analisa: "A combinação da desregulação progressiva, da globalização e do capitalismo financeiro atualmente colocam em questão o que era a superioridade principal do capitalismo: sua capacidade de se adaptar, de evoluir, de se auto-reformar. Anteriormente, o capitalismo tinha seus estabilizadores. Hoje, estes são sobretudo aceleradores de desordens". A esses parâmetros estritamente econômicos, outros acrescentam considerações políticas. Para o jornal católico La Croix, é a hegemonia dos Estados Unidos que está demolindo o equilíbrio do planeta. "Há um ano, a solidariedade e a compaixão voltaram-se para os Estados Unidos. Hoje, em um mundo sem bússola, a América suscita hostilidades. O governo do mundo por um só país está prestes a comprovar seus limites e perigos. E o editorialista, após ter explicado que a perspectiva do conflito com o Iraque impede qualquer visibilidade estratégica, termina com uma brutalidade bem rara nesse jornal católico, convencional e discreto: "A confiança evaporou-se? A América se ocupa de tudo e não resolve nada. Dirigente do mundo, ela é dirigida?"

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