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Exploração de gás de xisto nos Estados Unidos inicia revolução energética

Exportação a preços competitivos deve mudar cenário global de energia

Por Denise Chrispim Marin
Atualização:

Em apenas quatro anos, a exploração de gás de xisto nos Estados Unidos iniciou uma revolução energética capaz de alterar o cenário econômico do país. A atração de investimentos produtivos, antes vista como impossível, tornou-se inevitável, assim como a autossuficiência em fontes de energia. Com ou sem cota - tema polêmico e ainda não definido -, os EUA estarão em poucos anos exportando gás natural em volume suficiente para mudar o panorama mundial.

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No PIB do conjunto dos setores de construção, transportes, serviços e comércio, entre US$ 210 bilhões e US$ 380 bilhões serão agregados. Mais US$ 1,4 trilhão deverá ser investido em curto prazo em infraestrutura e gasodutos, com geração de 1,6 milhão de postos temporários de trabalho. Esse boom deverá se estender por quase todo o país, dado o fato de as 48 reservas de gás de xisto estarem em 28 Estados americanos. Desse conjunto, 26 reservas estão em exploração. Somente na formação geológica de Marcellus, que abrange a Pensilvânia, Nova York, Ohio e Virgínia Ocidental, há de 5 mil a 6 mil poços em operação. "Nos últimos cinco anos de recessão, essa foi a atividade que salvou vários Estados", afirmou Christopher Guith, vice-presidente do Institute for 21st Century Energy, da US Chamber of Commerce. "O gás de xisto vai mudar o panorama mundial, assim como a Apple e a Microsoft estão fazendo nos últimos anos, porque vai tocar em toda a economia e na vida das pessoas", disse. "O que queremos é fazer com que essa mudança se torne ainda mais positiva", completou Guith.

As entidades de empresas produtoras de gás de xisto ambicionam deslocar o carvão como fonte - altamente poluidora - de energia elétrica no país. Hoje, 50% da eletricidade é gerada em térmicas a carvão. Mas o lobby político desse setor no Congresso não permitirá a fácil conquista desse mercado. O gás de xisto já vem substituindo o diesel em ônibus e caminhões, apesar de poucos postos terem o combustível. O preço atual de venda de gás natural, de US$ 4 por milhão de BTUs, é imbatível. A Rússia escoa gás natural para a Alemanha a US$ 11,36. Na Indonésia, custa US$ 17,72. No Brasil, cerca de US$ 18. Os produtores estimam que, ao atingir um volume substancial, o preço rondará US$ 6 por milhão de BTU em dez anos. A Europa, atual consumidora de carvão americano, está ansiosa por essa fonte limpa e barata. O Japão, especialmente depois da tragédia de Fukujima, está ainda mais desejoso. Há muito a ser feito antes da corrida aos mercados externos. Cinco projetos de instalação de usinas para transformar o gás em GNL estão em estudos. Dos quatro terminais portuários de gás na Costa Leste, todos voltados à importação, três deles estão fechados. O de Boston opera, mas precisa ser convertido para a exportação. Há apenas um terminal de exportação em funcionamento no país, no Alasca, que escoa volume limitado de gás para o Japão. O gargalo físico é um desafio. Mas não tão difícil de ser superado quanto a resistência do governo Barack Obama. A Casa Branca é reconhecida como adversária pelos setores de energia fóssil dos EUA. Mesmo assim, os produtores acreditam ser possível dobrá-la com um argumento sensível: o potencial de geração de empregos. Segundo David Wochner, especialista da consultoria K&L Gates, o governo americano está neste momento preocupado em adequar oferta e preço, no mercado interno, antes de facilitar a exportação. Não quer se ver diante do risco de escalada do preço do gás no país. Sem a dimensão mais precisa das reservas, a equação pode demorar a surgir.

Novo mercado preocupa empresas brasileiras A produção de gás de xisto nos Estados Unidos e seu baixo preço de venda deixou em suspenso projetos de companhias brasileiras. Para a Coalizão das Indústrias Brasileiras (BIC, na sigla em inglês), a possibilidade de fuga de investimentos produtivos do Brasil para os EUA é tão real quanto o risco de o etanol ser substituído pelo gás natural como combustível de transição. A Odebrecht avalia os riscos na construção de hidrelétricas na América Central. Empresas comercializadoras estudam a lógica desse novo mercado, cientes dos riscos aos negócios em curso, e geradoras de energia temem a repetição, no Brasil, dos erros e da desorganização inicial da produção nos EUA. O País têm reservas estimadas em 6,9 trilhões de metros cúbicos, em especial no Vale do Rio São Francisco, onde mais de 30 poços estão sendo pesquisados. "O gás de xisto está revolucionando o mercado de energia e a produção nos Estados Unidos, com reflexos sérios para o Brasil", diz Célia Feldpausch, diretora executiva da BIC, e organizadora de duas missões de executivos brasileiros, em Pittsburgh, sobre o gás de xisto.

Khary Cauthen, diretor do Instituto Americano do Petróleo (API), lembra que o etanol era uma "vaca sagrada" nos EUA há dez anos. O setor produtor teve seus créditos tributários facilmente derrubados no ano passado pelo Congresso, antes defensor arraigado desses subsídios. O álcool tende a ser substituído pelo gás natural na mistura obrigatória à gasolina, em longo prazo.  No Brasil, dois leilões de áreas de gás natural estão programados para outubro e novembro. A Petrobrás monopoliza o transporte e a comercialização. O mercado aberto impera nos EUA desde a exploração - os locais são alugados pelo proprietário da terra - até a venda aos setores usuários do gás natural. A rede de gasodutos tem 38 mil quilômetros. A REPÓRTER VIAJOU A CONVITE DA COALIZÃO DAS INDÚSTRIAS BRASILEIRAS (BIC), INTEGRANDO A MISSÃO DE EMPRESAS DO BRASIL A WASHINGTON E PITTSBURGH

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