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Fim de incentivo fiscal ameaça 85 mil empregos, diz indústria química

Líderes das cidades mais afetadas pela perda de benefício tentam mobilizar políticos para reverter medida; indústria petroquímica emprega hoje 2 milhões de trabalhadores

Foto do author André Borges
Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - O receio de entrar para a lista dos 12,4 milhões de desempregados do País passou a fazer parte da rotina de Joel Santana de Souza. Técnico de produção da Braskem há 30 anos, no polo petroquímico do ABC, em São Paulo, Souza diz que já ouviu falar em risco de corte do setor. “O trabalhador fica aterrorizado com esse assunto de demissão. A indústria química é uma área restrita, não tem como migrar para outra”, diz.

O empregado da Braskem faz parte dos 85 mil trabalhadores que a indústria química diz que poderá demitir nos próximos meses, por causa da decisão do governo de acabar com o Regime Especial da Indústria Química (Reiq), que previa isenção de 3,65% do PIS e Cofins sobre a compra de matérias-primas do setor.

Joel Souza, que trabalha na Braskem: 'O trabalhador fica aterrorizado com esse assunto de demissão'. Foto: Hélcio Nagamine/Estadão - 28/1/2022

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A indústria química tem três polos de produção no Brasil, localizados em Camaçari (BA), Triunfo (RS) e no ABC, em São Paulo. A apreensão nos municípios é generalizada, por causa dos impactos que a medida venha a ter no emprego e na arrecadação fiscal.

“São 30 mil empregos nessa indústria aqui em Camaçari. É a matriz econômica da cidade”, diz o vereador Júnior Borges (DEM), presidente da Câmara local, que tem procurado políticos para pressionar o Congresso a derrubar a decisão do presidente Jair Bolsonaro.

A preocupação do município baiano é ampliar o fosso aberto em janeiro passado, quando a Ford decidiu paralisar sua produção na cidade e 12 mil pessoas perderam o emprego. “Isso pode ter um efeito cascata. O governo federal não pode quebrar um acordo dessa forma. As empresas já tinham se organizado porque assumem compromissos de longo prazo”, diz o prefeito de Camaçari, Elinaldo Araújo (DEM).

A 90 quilômetros de Porto Alegre, Triunfo, de 30 mil habitantes, está apreensivo em relação aos 6 mil empregos ligados à indústria química. “Para nós, causa um grande espanto, é um ato de total inconsequência, pelo prejuízo que vai causar à toda indústria química e aos municípios. É um atentado contra a nossa economia”, diz Murilo Machado (MDB).

A indústria petroquímica emprega hoje 2 milhões de trabalhadores. Destes, estima a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), 85 mil poderiam desaparecer, dado o aumento de custos para a produção e o impacto disso no mercado, que ampliaria a importação de produtos, em detrimento da indústria nacional.

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Em 2021, o Reiq significou, para o governo federal, abrir mão de R$ 1,4 bilhão em arrecadação. Neste ano, com o acordo de redução gradual do benefício que Bolsonaro havia firmado, o valor cairia cerca de 20%, para cerca de R$ 1 bilhão.

Concentrada, a indústria química de base reúne cerca de 20 grandes empresas no País. Destas, 13 são diretamente afetadas pela decisão do governo, como Braskem, Dow, Basf e Inova, entre outras.

Mobilização

Com o fim do recesso parlamentar e o retorno do Congresso Nacional a partir de 2 de fevereiro, políticos locais, empresários e associações prometem uma mobilização em Brasília para tentar reverter a decisão do presidente Jair Bolsonaro. Há expectativa de que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), declare a medida provisória sobre o assunto irregular, por ter desrespeitado o conteúdo de lei já aprovada pelo Congresso e sancionada pelo próprio Bolsonaro. 

O que está em jogo com o fim do Reiq

  • Isenção: 

Desde 2013, a indústria química tinha isenção de PIS e Cofins em compra de matéria-prima, um incentivo de 3,65% chamado de Regime Especial da Indústria Química (Reiq).

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  • Tentativa de revogação: 

Em duas ocasiões, o governo Bolsonaro tentou acabar com o benefício, mas em julho do ano passado, após um acordo com o setor, concordou em fazer uma redução gradual da isenção e aprovou uma lei que acabaria com o regime em 2025.

  • Medida Provisória: 

No dia 31 de dezembro de 2021, o governo publicou uma medida provisória que acabou imediatamente com o regime, ou seja, passou a cobrar o recolhimento dos 3,65% de PIS e Cofins.

  • Emprego: 

A indústria química, que emprega cerca de 2 milhões de trabalhadores no País, estima que a medida pode levar à demissão de até 85 mil funcionários no País e cobra o cumprimento do acordo firmado no ano passado.