CENÁRIO: Lu Aiko Otta
Mais do que cortes de gastos ou aumento de impostos, boa parte do discurso de posse do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi dedicado a atacar o "patrimonialismo" e a destacar a importância de garantir oportunidades iguais para todas as empresas, como instrumento para a retomada da confiança, do investimento e do crescimento econômico. Pois é justamente esse ponto que está sendo posto à prova com as demissões nas montadoras do ABC paulista.
Levy não foi explícito no discurso, mas se referia às medidas adotadas pelo governo nos últimos anos para ajudar empresas e setores específicos, por critérios nada transparentes. Ele pregou, segundo esclareceu um auxiliar, o "fim do clube de amigos". Estavam na mira os empréstimos subsidiados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e as desonerações tributárias - os dois instrumentos que corroeram os resultados das contas públicas. E as montadoras são antigas beneficiárias de reduções de impostos federais.
Para reforçar a ideia, Levy invocou uma "afinidade de pensamento" com a presidente Dilma Rousseff. No discurso, e na entrevista concedida após a cerimônia, o ministro disse estar citando as palavras da chefe em sua diplomação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Naquela ocasião, Dilma pregou o fim da "herança patrimonialista". Mas ela se referia aos casos de corrupção. Levy teria pego emprestado apenas a ideia da relação pouco clara entre o público e o privado.
Mas, diante das demissões, Levy e seu colega do Planejamento, Nelson Barbosa, foram chamados ao Planalto para defender o fim das ajudas pontuais ao setor. Mesmo sem as montadoras terem formalizado qualquer proposta, há na área política quem ainda pense em medidas de socorro.