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Gilmar Mendes impede TCU de declarar Andrade Gutierrez inidônea

Ministro do STF reconhece que TCU pode punir empresas que tenham acordo de leniência, mas afirma que inidoneidade inviabilizaria acordo firmado entre empreiteira e MPF

Por Breno Pires
Atualização:

BRASÍLIA - O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu uma liminar à Andrade Gutierrez para proibir que o Tribunal de Contas da União (TCU) declare a inidoneidade da empresa. A punição impediria a contratação da empresa com o serviço público federal.

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A decisão foi tomada em uma ação apresentada pela Andrade Gutierrez ao Supremo em dezembro, em segredo de justiça, em que a empresa alegava a iminência de a sanção ser aplicada pelo TCU a despeito do acordo de leniência firmado por ela com o Ministério Público Federal.

Gilmar Mendesconcedeu liminar à Andrade Gutierrez para proibir que o TCU declare inidoneidade da empresa Foto: Beto Barata/Estadão

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O relator, por outro lado, decidiu não suspender a tramitação do processo em que o TCU analisa a punição de empresas por fraudes a licitação nas obras da Usina de Angra 3, envolvendo ao todo sete empresas - contrariando, neste ponto, o pedido da Andrade Gutierrez.

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Na decisão, a que o Estado teve acesso, o ministro Gilmar Mendes reconhece o poder de o TCU punir as empresas que tenham acordo de leniência. "Não há dúvidas acerca da competência da Corte de Contas para fiscalizar a aplicação do dinheiro público, bem como a quantificação de eventual dano ocasionado ao erário, buscando sua efetiva reparação", disse.

Mas ele afirma que a inidoneidade, em si, seria uma penalidade que inviabilizaria o próprio acordo firmado entre Andrade Gutierrez e o Ministério Público Federal.

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"Resta acertado concluir que, se os acordos de leniência não contemplarem em sua totalidade a reparação do dano causado ao erário, é possível ao TCU julgar as contas daqueles que deram causa 'a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público', ainda que levando em consideração fatos já aventados no âmbito dos acordos de leniência.

Entretanto, tendo o TCU outros mecanismos aptos a atingir tais finalidades, não é razoável que aplique penalidade que inviabilize o cumprimento dos acordos firmados por outros entes", decidiu o ministro Gilmar Mendes.

O ministro afirmou também que "o pedido de suspensão do processo não é cabível, haja vista a possibilidade de aplicação de outras sanções para a efetiva reparação do dano causado".

"Ante o exposto, defiro parcialmente a liminar para impedir a decretação de inidoneidade da impetrante pelo Tribunal de Contas no âmbito do TC 016.991/2015-0, ressalvado eventual descumprimento do acordo de leniência ou o surgimento de novos fatos", decidiu.

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Na decisão, o ministro concorda com a argumentação da empresa de que é iminente a aplicação da inidoneidade, com base em manifestações de integrante do tribunal à imprensa.

Em manifestação enviada ao relator no dia 6 de abril, o TCU havia defendido o poder de aplicar eventual sanção de inidoneidade por conta de irregularidades relacionadas ao acordo de leniência firmado pela empresa com o MPF.

Enquanto a Andrade Gutierrez aponta que o TCU, se declarar uma punição como essa, estaria se sobrepondo aos órgãos competentes para assinar acordos de leniência, como MPF e Controladoria-Geral da União (CGU), o tribunal sustenta que, ao contrário, se deixar de agir, estaria em "posição de subalternidade em relação ao MPF e ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)" e descumprindo seu papel previsto na Constituição.

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O processo em que o TCU analisa a possível sanção de inidoneidade à Andrade Gutierrez está relacionado a irregularidades em obras na usina de Angra 3, envolvendo ao todo sete empresas. Em março de 2017, o tribunal aprovou a sanção de inidoneidade à empresas UTC, à Queiroz Galvão, à Techint e à Empresa Brasileira de Engenharia, mas suspendeu o processo de punição da Andrade, da Odebrecht e da Camargo Corrêa, que já tinham acordo de leniência assinado com o MPF.

A justificativa para poupá-las naquele momento foi para que o MP Federal e o MP de Contas pudessem colaborar com fiscalizações para que o tribunal possa chegar à conta final do dano ao erário causado pelo esquema em Angra 3. Mas o prazo dado pelo tribunal já se esgotou, e o relator, ministro Bruno Dantas, estuda levar o tema de novo ao plenário.

Reações

O relator do processo no TCU, ministro Bruno Dantas, disse ao Estado que a decisão não era esperada porque o processo não estaria perto de ser julgado. Ele lembrou que a ministra Cármen Lúcia e o ministro Ricardo Lewandowski “examinaram o caso anteriormente e não enxergaram urgência que justificasse a concessão da cautelar”.

Mas, segundo ele, a decisão prestigia a atuação do TCU. “Do ponto de vista prático, não há qualquer impacto nos trabalhos dos auditores do TCU, que vêm apurando cada contrato superfaturado e o valor efetivamente desviado dos cofres da Eletronuclear, e isso foi preservado pelo Ministro Gilmar Mendes, que prestigiou a competência do TCU".

O advogado Sebastião Tojal, autor da ação da Andrade Gutierrez no Supremo, disse que a decisão “contribui para alicerçar o acordo de leniência no ordenamento jurídico brasileiro e permite que o acordo traga a sua contribuição para a revisão dos padrões éticos de relação entre o público e o privado”.

A coordenadora da Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do MPF responsável por homologar os acordos de leniência, a subprocuradora-geral da República Mônica Garcia disse que a decisão, em uma primeira leitura, é “bastante favorável” ao acordo firmado entre Andrade Gutierrez e o MPF do Paraná em 2015.

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“Se se permitir que o TCU no exercício pleno de suas atribuições constitucionais, declare a inidoneidade da empresa, isso se acarretará no esvaziamento do próprio acordo”, disse Mônica Garcia em um evento nesta segunda-feira.

O ministro da Transparência e da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, também disse que era preciso examinar mais a fundo, mas viu como positivo o teor da decisão. “Declarar a empresa inidônea vai contra (os acordos de leniência), porque muitas vezes os pressupostos ou compromissos assumidos pela empresa não serão cumpridos. “Se praticamente as proíbo de trabalhar com o estado estou inviabilizando o acordo”, disse o ministro.

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