'Governo busca acordo para reforma tributária ampla até outubro'
Secretário da Receita diz que ideia é fazer uma reforma que unifique integralmente todos os tributos de consumo
Entrevista com
José Tostes, secretário da Receita Federal
Entrevista com
José Tostes, secretário da Receita Federal
22 de agosto de 2020 | 15h53
BRASÍLIA - O secretário da Receita Federal, José Tostes, afirmou que a estratégia do governo é buscar um acordo, até outubro, para a votação da reforma tributária com a fusão integral dos tributos de consumo. Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Tostes diz que uma fusão de todos os impostos - PIS/Cofins (governo federal), ICMS (Estados) e ISS (municípios) - é a melhor solução .
O secretário propõe que a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), tributo previsto na proposta do governo que reúne PIS e Cofins, entre em vigor antes para a implantação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) amplo. “Se olharmos as propostas que estão no Congresso, elas colocam um período de teste, com uma alíquota pequena, em que os dois sistemas coexistem. Estamos propondo que a CBS seja esse período de teste”, afirma.
Na entrevista, ele detalha os avanços nas negociações com governos regionais e diz que as etapas da reforma deverão ser decididas nas próximas semanas. “Vamos trabalhar neste fim de semana para tentar apresentar os outros pontos, as outras etapas, nas próximas semanas.”
É bem evidente que nós estamos trabalhando o consenso. Uma proposta que venha atender a todos e possa resultar na fusão integral de todos os tributos. A reforma ampla. Estamos trabalhando para caminhar nessa direção. Não modificamos a estratégia em relação à reforma. Pelo contrário, estamos aprofundando. Desde o inicio, nos propusemos a discutir com o Congresso, Estados e municípios a possibilidade de avançar numa fusão mais ampla, que incluísse o ICMS (o principal tributo estadual) e o ISS (municipal). É o que temos feito desde então.
Nesta quinta-feira (dia 20), fizemos a oitava reunião com os Estados. Existem desafios grandes, mas em alguns pontos conseguimos avançar. São os trabalhos que estão em andamento e que visam a tentar convergir para uma proposta que possibilite a fusão de todos os tributos de consumo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, deve se reunir na próxima semana com os secretários de Fazenda dos Estados.
Pode. Isso nós sempre dissemos, desde o início. A CBS (o imposto federal) pode ser o primeiro teste para o futuro IVA nacional. Isso sempre dissemos. Ela pode começar a entrar em vigor por dois anos, um ano, o tempo que seja. E, a partir daí, acoplar os outros tributos. A CBS pode perfeitamente se prestar a essa função. Se olharmos as propostas que estão no Congresso, elas colocam um período de teste, com uma alíquota pequena, em que os dois sistemas coexistem. Estamos propondo que a CBS seja esse período de teste.
Ainda não há consenso sobre isso. Os Estados preferem fazer toda essa fusão de imediato, mesmo que com um prazo de testes e de migração que estão colocados. As propostas preveem uma migração de cinco a dez anos, que é um período muito longo. Imagina ficar dez anos convivendo com tudo que existe e mais o novo sistema. É muito tempo. Não vai significar em nada melhoria em termos de simplificação. Não é razoável.
O cronograma montado é para construir um acordo até outubro e poder votar no Congresso ainda este ano.
Vamos trabalhar neste fim de semana para tentar apresentar os outros pontos, as outras etapas, nas próximas semanas.
Já se sabe quais são os outros pontos. É uma questão de decidir qual será a ordem. Até segunda-feira, teremos decisões sobre isso.
As prefeitura das capitais estão com uma posição de não unir tudo agora. De simplificar, mas continuar existindo separadamente ICMS, ISS, PIS e Cofins. Continuam com essa proposta. A dificuldade de fazer a fusão de tudo que existe, não podemos deixar de reconhecer que é um grande desafio. Mas estamos avançando. É claro que, do ponto de vista técnico, é melhor ter uma tributação única sobre bens e serviços. Essa é a melhor solução. Não faz sentido continuar tributando mercadoria nos Estados, serviços nos municípios, além de mercadorias e serviços na União.
Eu vou dar um exemplo. Serviços hoje são tributados na União com PIS/Cofins, nos municípios com o ISS e uma parte dos serviços, como telecomunicações, energia elétrica e transporte, é tributada nos Estados, com ICMS. É uma confusão.
Temos quatro discussões de quatro grupos que foram formados para avançar. Um grupo discute alíquotas. Nós encaminhamos aos Estados a nossa base de dados, que foi usada para cálculo da alíquota da CBS, para que eles façam as suas simulações e possamos estimar qual seria a alíquota necessária para o tributo fundido, resultante da união de todos eles. E recebemos a base de dados dos Estados para saber com que números eles estão trabalhando, Esse grupo está incumbido de cálculos e está avançando. Outro grupo trabalha com o tema do contencioso administrativo.
Avançar numa proposta de estrutura. O contencioso administrativo é a instância que vai julgar os processos relativos aos recursos dos contribuintes. Na Receita, por exemplo, existe a delegacia de julgamento e o Carf (tribunal para o último recursos administrativo). Os Estados têm estruturas semelhantes. A primeira instância administrativa e a segunda, que são tribunais ou conselhos.
Estamos estudando se essa estrutura vai se constituir de tribunais estaduais administrativos, compostos por União, Estados e municípios, se vai haver tribunais regionais ou um nacional. Essa estrutura que vai responder pelo julgamento dos processos no âmbito administrativo.
Não está concluído. O trabalho está em andamento, mas a tendência é que se possa ter órgãos estaduais com a participação dos três níveis de governo e um órgão nacional, que seria a segunda instância. Outro grupo é responsável pela mesma discussão no âmbito do Judiciário. O contribuinte no Brasil pode recorrer na via administrativa e judicial. Hoje, temos o tributo estadual, o ICMS, e o federal, o PIS/Cofins. Se o contribuinte vai entrar na Justiça contra o tributo federal, ele entra na Justiça federal. E entra com recurso contra o tributo estadual na Justiça estadual. Tem de definir. Se vai ser um tributo único, qual será o órgão do Judiciário responsável? É isso que está em discussão.
Os Estados pleitearam esses fundos. O quarto grupo está tratando justamente dessa discussão. Como seria a estrutura? Quais serão os valores? Qual a governança? Esse debate é o mais importante e o mais difícil.
Sim. Eles pleitearam R$ 97 bilhões por ano para a soma dos dois. O de compensação em torno de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões e o restante para o fundo de desenvolvimento regional. O que está em discussão é exatamente se é viável, e qual foi a memória de cálculo para chegar a esse valor.
Está na mesa. Receitas novas. O governo federal não tem espaço nem pode assumir um compromisso desse montante na situação hoje existente. Está se avaliando primeiro qual o valor necessário, se são R$ 97 bilhões ou não. E, segundo, de onde virá esse dinheiro, se da transformação de fundos hoje existentes, das novas receitas que poderão vir do petróleo ou de outras receitas.
Temos hoje meia dúzia de fundos já existentes que tratam de desenvolvimento regional.
Não. O objetivo não é o mesmo? Financiar o desenvolvimento regional. Vamos criar mais um fundo? Se esses fundos existem e têm a mesma finalidade, por que não se revisa a estrutura, a governança, a forma de aplicação dos valores dos fundos já existentes? É tudo que está sendo discutido. Se já existem fundos para isso, por que não estão sendo efetivos?
Esse é o trabalho que o primeiro grupo está fazendo. Vamos apresentar o resultado. Já demos os bancos de dados para os Estados e estamos fazendo os cálculos, as simulações e vamos apresentar o resultado. Se imaginarmos o quanto é cobrado de PIS/Cofins, ISS e ICMS, é muito provável que o resultado seja em torno disso mesmo.
Ela foi calculada para produzir a mesma arrecadação que é hoje é produzida pelo PIS e pela Cofins. Não se pode comparar uma alíquota que incide sobre as receitas de forma cumulativa (cobrada em cascata, sobre todas as etapas de produção) com outra que vai incidir sobre o valor agregado, com débitos e créditos (ou seja, será possível abater os impostos ao longo da cadeia produtiva). São grandezas incomparáveis. Não podemos dizer que ao passar de 3,65% para 12% vai haver aumento. São coisas distintas.
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