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Governo do ES e o (des)respeito a contratos

Por Moacyr S. Duarte
Atualização:

"Sin seguridad jurídica no hay derecho, ni bueno, ni malo, ni de ninguna clase." (Recaséns Siches, sociólogo.) A concessão de serviços públicos ao setor privado é um procedimento antigo em todo o mundo, para tornar mais ágil a execução, melhorar o atendimento aos usuários e atrair investimentos para áreas em que são necessários e não precisam ser exclusivos do poder público. A base do processo de concessão é a confiança depositada no contrato assinado entre concedente e concessionário - especificando responsabilidades, exigências e penalidades - e respeitado por ambos para que ocorra a prestação do serviço adequado e de qualidade aos usuários que pagam por ele. Infelizmente, às vezes surgem no País governantes para os quais o documento assinado entre as partes obriga a só uma delas: o concessionário. Isso ocorreu no passado e levou à deterioração das condições operacionais e à própria desistência de concessões portuárias e de energia, obrigando o poder público a encampá-las, com altos custos para a sociedade. No caso da concessão de rodovias, pela nova lei de concessão (Lei nº 8.987/95), o poder público pode alterar unilateralmente as condições, desde que mantenha o equilíbrio econômico-financeiro pactuado inicialmente e que integra o contrato. O objetivo dessa cláusula é permitir ao poder concedente adaptar a concessão às mudanças socioeconômicas, provendo à sociedade um serviço melhor e adaptado às mudanças que possam surgir no período do contrato, que é longo, chegando no País a 25 ou 30 anos. Esses ocupantes de cargos executivos que se consideram superiores à lei alteram unilateralmente as condições do contrato de concessão de rodovias, sem restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro em que a concessionária se baseou para assumir riscos, obter financiamentos, efetuar investimentos e executar os serviços. Eles creem que "pedágio tira votos" e a demagogia antipedágio gera votos, como se em São Paulo, Estado com a maior extensão de estradas pedagiadas, os governantes não tivessem sido reeleitos ou feito seus sucessores com o reconhecimento dos cidadãos pela qualidade das rodovias pedagiadas. O mau exemplo do Estado do Paraná, onde se tentou desestabilizar as concessões de rodovias, parece ter contaminado o Espírito Santo (ES), que tem uma única concessão, a Rodosol, responsável pela operação e manutenção do Sistema Rodovia do Sol desde 1998. A concessionária restaurou os trechos sob sua administração, manteve-os ao longo desses 10 anos, duplicou a ES 060 (Rodovia do Sol) desde Vila Velha até Guarapari, entre outras melhorias, de acordo com o estabelecido no contrato de concessão e recebendo um índice de satisfação de 82% dos usuários. Apesar disso, não foi concedido o reajuste em 2003 nem em 2004 (ambos previstos para julho), tendo sido aditado o contrato em dezembro de 2005 para seu reequilíbrio, reduzindo alguns encargos da concessionária e passando o mês de reajuste para dezembro, o que ocorreu em 2006. Em 2007 entendeu-se não conceder o reajuste e ainda se exigiu a construção de obras não previstas no contrato. Também não foi feito o reajuste no final de 2008. Por iniciativa do governo do Estado, a Fundação Getúlio Vargas avaliou a situação do contrato de concessão e não respaldou seu entendimento. Repete, assim, o governador do Estado os procedimentos nefastos do Paraná, de buscar alegações improcedentes para não cumprir com o pactuado e prejudicar dessa forma o desenvolvimento de seu Estado, que, como os demais, depende de boas rodovias para o transporte de pessoas e mercadorias. Como no Paraná, as tentativas do governador de alterar as condições da concessão sem o necessário reequilíbrio econômico-financeiro e de exigir obras não previstas serão provavelmente barradas pelos tribunais superiores, dentro da jurisprudência já firmada de respeito aos contratos. O governo do Estado de São Paulo também alterou unilateralmente alguns contratos de concessão de rodovias, mas o fez para ampliar o número de obras e, como prevê o contrato, restabeleceu ipso facto seu equilíbrio econômico-financeiro. Vale lembrar que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça definiu, no caso do Paraná, que "a equação econômico-financeira é um direito constitucionalmente garantido ao contratante particular". *Moacyr S. Duarte, advogado, é presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) Excepcionalmente, Rogério L. F. Werneck não escreve hoje

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