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‘Grandes marcas não querem inovar’

Com ideias criativas, startups podem desbancar gigantes do mercado, afirma especialista americano

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Por Fernando Scheller
Atualização:
SAO PAULO ECONOMIA NEGOCIOS David Aaker, especialista em branding, e autor de v?rios livros sobre o tema Foto:

As grandes marcas estão em risco: além de terem de se preocupar com seus concorrentes tradicionais, agora precisam ficar de olho em startups que podem tirar parte de sua clientela com propostas inovadoras. Em um mundo em que até Jorge Paulo Lemann – sócio da AB InBev – admitiu, no início do mês, que as cervejarias artesanais tiraram mercado da Budweiser nos Estados Unidos, o especialista americano David Aaker – consultor, professor e autor de vários livros sobre marketing – garante: até os gigantes precisam se reinventar.

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Com a emergência do marketing digital, companhias de menor porte estão tendo mais espaço para contar suas histórias – e atrair a atenção dos consumidores. Nesse novo cenário, cabe aos grandes grupos se reinventar. Uma tarefa que, na visão de Aaker, não é nada fácil: “As grandes companhias não têm incentivos para inovar. Primeiro porque não querem reduzir vendas das marcas que já possuem. E, segundo, porque não são boas em criar coisas novas, apesar de gerirem seus negócios com competência.”

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Por onde se começa a criar o discurso de uma marca? Acho que um bom lugar é a identidade, a partir da qual vai se desenvolver a estratégia. Mas isso não quer dizer que tudo possa ser resumido em uma frase curta. É um processo multidimensional. Cada marca precisa ter entre 6 e 12 elementos que ajudem a definir sua identidade. A partir disso, é possível fazer uma depuração para três ou quatro elementos mais importantes. Conforme a empresa evolui, algumas características que não eram tão importantes passam a se tornar mais relevantes – por isso, é necessário ter esses 12 elementos.

Quais tipos de características podem ganhar importância ao longo do tempo? A identidade de uma marca pode ter vários aspectos: os criadores podem querer que ela demonstre energia e que exale competência, por exemplo. Essas duas características podem ser menos importantes de início. No entanto, mais adiante, podem ser justamente esses aspectos que vão ajudar a empresa a se diferenciar. 

Em seu livro ‘Aaker on Branding’, o sr. cita o caso da marca Patagônia, que conseguiu se apropriar da questão ambiental. O fato de a Patagônia (marca de roupas e acessórios para prática de esportes ao ar livre) ter conseguido colocar a questão da sustentabilidade ambiental como valor não foi casual. Assim como suas concorrentes North Face e Columbia, a Patagônia tem relação com a natureza. Mas a Patagônia vai além: mantém vários programas de proteção ambiental e políticas internas que realmente a diferenciam das outras. 

Neste mês, Jorge Paulo Lemann disse ter preocupação em relação ao valor das marcas de cerveja da AB InBev. Isso quer dizer que a relação entre consumidor e marcas está mudando? Especialmente neste momento. A única forma de garantir lugar no mercado hoje é com a criação de um “must have,” um diferencial que torne os competidores irrelevantes. É importante pensar de forma inovadora e encontrar uma maneira de redefinir a categoria. Isso vale também para a AB InBev. E como se desenvolve um “must have “para a Budweiser? (É difícil, pois) esse tipo de diferencial se constrói por meio de nichos. A Budweiser hoje está competindo contra startups. 

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E o que isso significa? Isso significa que os pequenos negócios têm chances de êxito, dentro de seus limites. De repente, se 30 ou 40 marcas tiverem sucesso em pequena escala, a AB InBev começa a perder mercado. E esse fenômeno se repete em diferentes segmentos, como o de automóveis, no qual surgiram forças como a Tesla, por exemplo.

De repente, as marcas estabelecidas há muito tempo têm motivo para inovar? As grandes marcas não têm incentivos para inovar. Primeiro porque elas não querem reduzir as vendas das marcas que já possuem e dão lucro. E, segundo, porque elas não são boas em criar coisas novas, apesar de gerirem seus negócios com competência. E isso tem relação com o tipo de profissional que elas contratam: mentes inovadoras não são prioridade para elas. Além disso, leva tempo para construir um negócio novo que fature US$ 20 milhões. E, se esses grandes grupos conseguirem crescer 1% em volume, muitas vezes isso representa mais do que US$ 20 milhões. 

O sr. vê as marcas preparadas para o desafio do universo digital? A maior parte das companhias está se tornando mais digital, o que tem várias implicações para as marcas. Por um lado, é uma grande oportunidade. Por outro, é um fator de estresse. E isso ocorre porque várias empresas de nicho podem conseguir usar o marketing digital para se estabelecerem no mercado. Se elas tiverem uma mensagem relevante, conseguirão visibilidade com menos dinheiro.

Há ferramentas para ganhar o jogo no mundo digital? É importante criar histórias próprias – se você vai ter presença nas mídias sociais, é necessário que o conteúdo seja atraente. Apenas falar do produto não é muito interessante. É necessário que as empresas aprendam a contar histórias intrigantes e autênticas. 

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