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Gross, da Pimco: sucesso com o governo Obama

Por Devin Leonard
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Diariamente Bill Gross, o bem-sucedido administrador da Pimco - maior gestora de bônus de emergentes do mundo -, fecha-se numa sala de reuniões, na hora do almoço, com seus subalternos, para tratar dos investimentos da empresa. As persianas são baixadas para evitar a luz do sol e ele proíbe qualquer chamada com aparelhos BlackBerry ou celulares. A ideia é que todos fiquem desconectados do mundo exterior e concentrados no que mais interessa a ele: buscar fontes de riquezas para os clientes da Pimco, empresa de administração de fundos que vem crescendo velozmente. Bill Gross, 65 anos, é muito conhecido por suas excentricidades. Ele aprendeu algumas das mais lucrativas estratégias de investimento apostando em Las Vegas. Muitas das suas ideias surgiram enquanto estava de ponta-cabeça, fazendo ioga. Gross sabe que precisa estar sempre bem vestido para as reuniões com clientes ou quando aparece na TV - mas, em vez de usar sua gravata Hermès com o nó bem apertado, ele a enrola no pescoço como se fosse um lenço, para poder trabalhar com o colarinho aberto. Com o colapso de Wall Street, Gross tornou-se um dos mais influentes financistas do país. Suas frequentes aparições na CNBC sempre provocam burburinho, como também as colunas mensais humorísticas sobre investimentos no website da empresa. Secretários do Tesouro costumam pedir conselhos a ele. Warren Buffet, chairman do Berkshire Hathaway, e o ex-presidente do Fed, Alan Greenspan, o elogiam. "É uma pessoa muito individualista. Não faz análises ou julgamentos de investimento usando as palavras, a terminologia ou o tom que usei por décadas", diz Greenspan. "Esse pode ser o segredo do seu sucesso. Não há dúvida de que aí está um intelecto extraordinário." Greenspan, é preciso dizer, hoje trabalha como consultor da Pimco. Em meio a tudo isso, Bill Gross e sua empresa tentam moldar a resposta do governo à crise econômica. Ele é um dos mais fervorosos defensores dos planos do governo Obama de recrutar investidores privados para socorrer financeiramente os bancos em dificuldades e tentar reanimar a economia. Esse esforço, conhecido como Programa de Investimento Público-Privado (PPIP, na sigla em inglês), até agora não teve muita repercussão. Mas Gross tem defendido energicamente o arquiteto do plano, o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, contra críticos como o professor Nouriel Roubini, da Faculdade de Economia da Universidade de Nova York, ou o colunista do The New York Times Paul Krugman - para quem a estratégia é falha e seria melhor o governo nacionalizar temporariamente os chamados bancos zumbis para evitar a repetição da Grande Depressão. Gross insiste que uma nacionalização seria um desastre total. "Existem dois grandes planos", disse ele numa reunião do comitê de investimentos da sua empresa. "Um é o plano Krugman-Roubini. Segundo eles, os bancos têm tanto lixo que não há esperança. "O outro é o do governo. E é nesse que acreditamos. Se o outro lado acabar conquistando algum crédito, devemos nos preocupar". Gross não é absolutamente um observador desinteressado. A Pimco, controlada pela seguradora alemã Allianz, vem manobrando para ser escolhido por Geithner uma das empresas que deverão aliviar bancos como Bank of America, Citigroup e outros de uma dívida hipotecária não resgatada num valor estimado de US$ 1 trilhão, para que possam começar a emprestar novamente. Para Gross, todos ganham com esse plano: bancos, contribuintes e investidores da Pimco. O governo pretende anunciar em breve o nome dos administradores de fundos que participarão do esquema. Um porta-voz do Departamento do Tesouro não disse se a Pimco será um deles. Sob vários aspectos, é perfeitamente lógico que a Casa Branca recorra a Gross nesse caso. Poucos investidores compreendem melhor o mercado de hipotecas. Como executivo de investimentos, ele administra pessoalmente o principal fundo da Pimco, Total Return, que tem US$ 158 bilhões em ativos. Desde o fim de maio ele já investiu 61% dos recursos do fundo em títulos hipotecários. Bill Gross sempre foi parcial em relação aos títulos hipotecários. E por que não? Ele se deu muito bem com eles. Numa carta aos investidores, datada de outubro de 2005, ele fez um dos mais proféticos apelos da última década, alertando sobre a iminente crise do mercado de hipotecas subprime. Foi ignorado por quase todo mundo. Hoje, as pessoas se arrependem. Quando a bolha imobiliária estourou e os mercados financeiros se desintegraram, os investidores perderam bilhões de dólares. Mas não os clientes de Gross. As ações Classe A do fundo Total Return, para investidores individuais, subiram 4,3% em 2008, ou 9 pontos porcentuais à frente de fundos de títulos similares, de acordo com a Morningstar. Este ano, até a semana passada, as ações contabilizaram um aumento de 5,4%. No meio de uma crise econômicas, esses números impressionam. Da mesma maneira os dados de prazo mais longo: em dez anos, até a semana passada, o fundo contabilizou um lucro anualizado de 6,42%, batendo seu índice referencial de 0,54 pontos porcentuais, de acordo com a Morningstar. Essa é uma das razões pelas quais Bill Gross é cortejado pelo governo. No ano passado, o Federal Reserve de Nova York, então presidido por Timothy Geithner, contratou a Pimco - junto com a BlackRock, Goldman Sachs e Wellington Management - para a aquisição de US$ 1,25 trilhão de títulos hipotecários, numa tentativa para impedir que as taxas de juro disparassem. Em dezembro, quando pressionou o Bank of America para concluir a malfadada aquisição do Merril Lynch, o Federal Reserve também procurou Gross para orientá-lo. De acordo com recentes mensagens trocadas entre funcionários do Fed e a Pimco, este mês a empresa avaliou os dois bancos e concluiu que o Merrill Lynch não sobreviveria sem uma injeção de capital ou uma ajuda adicional do governo. Hoje Gross está entusiasmado para comprar os mesmos empréstimos subprime que outrora se recusava a tocar, como parte da iniciativa do Tesouro para esses ativos de difícil solução. Afinal, se alguém pode imaginar o quanto vale essa dívida hoje é a Pimco. Mas o envolvimento da empresa em tantos aspectos do plano de ajuda financeira deixou muitos outros financistas e analistas constrangidos. Segundo eles, a proximidade da empresa com o Tesouro e o Fed pode abrir a possibilidade de ela ganhar bilhões de dólares facilmente, por meio de contratos federais e oportunidades de investimento preferenciais. Uma queixa frequente é essa: por que o Federal Reserve está pagando a Pimco para adquirir títulos hipotecários em seu nome, quando a empresa já é uma enorme adquirente e vendedora desses mesmos títulos? "Isso equivale a um contrato sem licitação no Iraque", diz enfurecido Barry Ritholtz, que dirige uma empresa de pesquisa de valores mobiliários em Nova York e escreve no The Big Picture, um blog de economia muito popular e bastante consultado. "É uma licença para roubar." Naturalmente, ninguém acusa a empresa de roubo. Mas resta uma pergunta ainda mais importante: nesse plano de ajuda financeira, a empresa está cuidando dos interesses de quem? Afinal, os administradores de fundos têm a obrigação legal - e a responsabilidade fiduciária - de colocar antes de tudo os interesses dos seus investidores. Até Gross reconhece que os interesses da Pimco nem sempre estão alinhados com os do governo. Mas ele sublinha que jamais se reuniu com Geithner. Por seu lado, o Tesouro subestima a influência da empresa. "Conversamos com inúmeros participantes do mercado e, no nosso entendimento, buscar várias perspectivas é crucial para nossos esforços", disse Andrew Williams, porta-voz do departamento. Segundo ele, o Tesouro "leva muito a sério" os conflitos de interesses. * Devin Leonard é jornalista

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