29 de janeiro de 2021 | 14h49
BRASÍLIA e SÃO PAULO - O ministro da Economia, Paulo Guedes, cancelou a participação que faria no Fórum Econômico Mundial de Davos, que acontece no formato virtual este ano por causa da pandemia. Ele participaria do painel "Reparando o Sistema de Comércio Internacional" nesta sexta-feira, 29.
O 'bolo' de Guedes foi informado no início do debate pelo mediador, o comentarista chefe de economia do Wall Street Journal, Greg Ip. Instantes mais tarde, a assessoria de imprensa do ministro da Economia confirmou o cancelamento da participação do ministro e argumentou que ele desistiu do encontro para "resolver assuntos internos". A pasta não informou qual a natureza dos assuntos aos quais Guedes se dedica no momento.
Neste ano, de olho em temas como combate à covid-19, vacinação e conservação da Amazônia, a edição online do Fórum Econômico Mundial não teve participação do presidente Jair Bolsonaro. Na programação, a maior autoridade brasileira foi o vice-presidente Hamilton Mourão, que comanda o Conselho Nacional da Amazônia Legal.
Bolsonaro tem sido alvo de críticas de organismos internacionais pela atuação do governo brasileiro no combate à pandemia do novo coronavírus e também por sua política ambiental. Neste mês, com o colapso do sistema de saúde em Manaus devido à falta de oxigênio para pacientes com a doença, a gestão da crise entrou na mira da Organização Mundial da Saúde (OMS).
A comitiva brasileira contou ainda com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que focou seu discurso em tecnologia e inovação. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, fechou a participação do País no fórum nesta sexta, em um painel sobre geopolítica. Ele aproveitou o palanque para colocar o Brasil como possível parceiro com outros países, mas ressaltou questões como democracia, liberdade e criticou o "totalitarismo tecnológico".
O cancelamento de última hora da participação do ministro é inédita em relação à programação do evento. No entanto, é uma repetição do que ocorreu em janeiro de 2019 com a imprensa, quando o encontro foi o palco para a estreia internacional do recém-empossado Jair Bolsonaro. Naquela ocasião, havia sido marcada uma entrevista coletiva para jornalistas brasileiros e estrangeiros com o presidente e os ministros que o acompanharam até os Alpes Suíços.
Depois de meia hora de espera, com os profissionais da imprensa já nervosos com a demora, a organização do fórum informou que não haveria mais entrevista, o que surpreendeu a todos, inclusive membros da organização do evento. Além de Bolsonaro, estavam no encontro Sergio Moro (então ministro da Justiça), Guedes (Economia) e Araújo (Relações Exteriores). O que se apurou há dois anos é que a coletiva foi suspensa porque o governo estaria insatisfeito com a cobertura da imprensa durante o Fórum.
Uma fonte da comitiva chegou a dizer ao Estadão/Broadcast na ocasião que o presidente estava extremamente incomodado com as perguntas sobre operações financeiras do filho, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). "A gente está aqui fazendo um trabalho de melhorar a posição do Brasil, é claro. E a imprensa fica perguntando: 'E o Flávio Bolsonaro? E o Flávio Bolsonaro?'", relatou. "Poxa, não vamos conversar com esses caras que só sabem falar desse assunto, enquanto estamos aqui fazendo uma coisa bacana", disse a fonte à época.
O cancelamento da participação do ministro vai na contramão dos esforços que o setor privado e o próprio governo têm feito de buscar oportunidades de negócios com o Reino Unido depois do Brexit, como é chamada a saída do país da União Europeia. .
Ao tomar a decisão, ele deixou de lado o presidente e diretor-executivo da Merck KGaA, Stefan Oschmann, a ministra de Comércio Internacional do Reino Unido, Elizabeth Truss, e o ministro de Comércio Exterior e Cooperação para o Desenvolvimento da Holanda, Sigrid Kaag, que continuaram no evento, conforme o previsto. Minutos antes, em outro seminário do mesmo Fórum, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, havia enfatizado a necessidade do Brasil como possível parceiro com outros países e a escolha deste governo de abrir sua economia.
Apesar do discurso de maior abertura econômica, o Brasil ainda é considerado um país muito fechado. Além disso, está em um momento em que depende da aprovação de todos os Parlamentos europeus para que o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) seja ratificado e entre em vigor, após um custoso consenso formado depois de duas décadas duras de discussão. A Holanda, que permaneceu no painel, pode ser uma aliada chave neste momento em que a imagem do País está bastante arranhada no exterior, principalmente por causa de questões ambientais.
O que chama mais atenção, no entanto, é a perda da oportunidade de estar ao lado de Elizabeth Tuss neste momento em que o Reino Unido busca firmar acordos comerciais bilaterais depois do divórcio com a UE. Principalmente quando há várias empreitadas nesse sentido do governo, seja por meio das embaixadas e da Apex, e também da iniciativa privada. Todos são unânimes em afirmar que o Brasil tem condições de disputar o mercado britânico que se abriu, mas que precisa trabalhar como formiguinha para isso. Nesse sentido, toda aproximação é bem-vinda.
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