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Guedes diz que vai faltar dinheiro até para pagar servidor se precatórios não forem parcelados

Durante audiência, ministro subiu o tom e alegou que sem aprovação da proposta, não haverá verba suficiente para fazer rodar a máquina pública; ele também disse ser um 'erro' não votar a reforma do Imposto de Renda

Foto do author Lorenna Rodrigues
Foto do author Célia Froufe
Por Lorenna Rodrigues (Broadcast) e Célia Froufe (Broadcast)
Atualização:

BRASÍLIA - Depois da má reação à proposta de parcelar o pagamento de precatórios no ano que vem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que, se a mudança não for aprovada, não haverá verba suficiente para fazer rodar a máquina pública e que até recursos para pagamento de salários dos servidores vão faltar.

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“Se precatório não passar, vamos mandar orçamento de R$ 90 bilhões [para 2022] e vai faltar dinheiro para pagamentos até de salários. Se não descumprir uma lei, descumprimos outra”, disse o ministro, durante audiência pública da Comissão de Relações Exteriores do Senado nesta quinta-feira, 19. 

Salários do funcionalismo são despesas obrigatórias do governo federal, assim como os benefícios da Previdência. Antes de cortá-las, seria preciso antes tesourar outro tipo de gasto, chamado de discricionário, e que envolve gastos da máquina pública e investimentos.

'Se não descumprir uma lei, descumprimos outra', disse Guedes, em sintonia com o já dito pela sua equipe. Foto: Gabriela Biló/Estadão - 11/08/2021

Na semana passada, o governo enviou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) com mudanças para o pagamento das despesas advindas de sentenças judiciais, que chegam a R$ 89 bilhões no ano que vem. Entre as medidas está o parcelamento das dívidas acima de R$ 66 milhões em até dez anos.

Guedes fez coro às ameaças de sua equipe de “parcelamento ou nada”. Na quarta-feira, 18, o secretário do Orçamento Federal, Ariosto Culau, disse que, se não for parcelado, o crescimento dos precatórios comprometerá praticamente todos os programas em 2022, incluindo a compra de vacinas para a aplicação da terceira dose contra a covid-19 e o pagamento de emendas parlamentares, caso o pagamento das dívidas judiciais não seja modificado. “Não posso quebrar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e nem a do teto (de gastos), então tenho que oferecer alternativas”, completou o ministro.

O analista do Senado e especialista em contas públicas Leonardo Ribeiro disse que a ameaça do ministro de não ter dinheiro em caixa para o pagamento de salários “não se sustenta”. “Isso é uma narrativa política que não faz sentido do ponto de vista técnico. Ele [Guedes] coloca como se não fosse ter caixa, mas o governo federal tem dinheiro para pagar, até porque, diferentemente de Estados e municípios, pode emitir dívida”, explica. 

Ele ressalta que o que limita os gastos do governo são regras fiscais, como o teto de gastos, e que a equipe de Guedes deveria estar focada em uma “solução estrutural” para as dificuldades orçamentárias. “Há uma questão estrutural, dentro de um contexto de regras fiscais, que o governo tem que fazer a sua parte e mostrar o que será feito”, afirmou. 

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Ribeiro acrescenta que o governo aproveitou a PEC dos precatórios para colocar essas despesas fora do teto de gastos, o que mostra que não há comprometimento com a regra que limita o as despesas federais. “A PEC dos precatórios promove várias mudanças que refletem em regras fiscais, o que o governo quer com isso? É preciso que isso fique mais claro”, afirma.

Guedes também falou que seria “um erro” não aprovar outro projeto enviado pelo governo e que encontra resistência no parlamento: a reforma do Imposto de Renda. Nesta semana, a votação foi adiada na Câmara dos Deputados por falta de acordo, mesmo após muitas concessões que fizeram ala do próprio Ministério da Economia apontar que a reforma "já não se paga". “Mandamos o segundo capítulo da reforma tributária, se não for aprovada, não tem problema, paramos. Mas é um erro, um equívoco”, afirmou Guedes.

Mercosul

No Senado, Guedes voltou a defender a redução da tarifa de importação do Mercosul. O ministro da Economia disse que o momento econômico brasileiro é ideal para isso porque há aumento de preços no mercado interno e a entrada de produtos com preço menor ajudaria a reduzir a pressão inflacionária. Além disso, a arrecadação de tributos está em alta, o que facilita o poder público abrir mão dos impostos.

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“Não há hora melhor para abertura do que em momento em que há pressão de preços. O momento de abrir não é quando está em recessão. Agora economia está crescendo, arrecadação está aumentando”, afirmou.

Como antecipou o Estadão/Broadcast, o Brasil, com o apoio do Uruguai, vem negociando a redução da Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, que é a taxa cobrada na importação de produtos de fora do bloco. No primeiro semestre, o Brasil propôs reduzir a TEC em 10% imediatamente e mais 10% no fim deste ano. A Argentina, contrária à redução linear, aceitou um corte de 10%, limitado a 75% da pauta comercial, o que o Brasil achou insuficiente.

 “Já gostaríamos de ter reduzido as tarifas do Mercosul. Nossa missão é modernizar o Mercosul para maior integração com a economia mundial”, afirmou Guedes, ressaltando que a proposta do governo brasileiro é fazer uma “abertura gradual”, que não prejudique os produtores locais.

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“Não podemos abrir num ritmo que o sistema produtivo brasileiro não resista. Estamos fazendo reforma tributária, aumentando a competitividade da economia brasileira para dar continuidade à integração com outros países”.

Depois de o gerente de Políticas de Integração Internacional da entidade, Fabrízio Panzini, apresentar dados contrários à proposta do governo brasileiro de reduzir as tarifas de importação, Guedes elevou o tom e disse que os estudos da entidade são “financiados com encargos trabalhistas”.

“A CNI vive de encargos trabalhistas e ainda acredita que está defendendo a indústria brasileira. Já pedi para reduzir encargos trabalhistas, mas a CNI é contra porque é com encargo trabalhista que CNI financia seus estudos”, alfinetou.

Para Guedes, a entidade tem “boicotado” as propostas de reformas tributárias enviadas ao Congresso Nacional e também em várias outras áreas. Ele citou o que seriam obstáculos do empresariado a mudanças no ICMS, na reforma tributária, setor elétrico e no marco regulatório do saneamento básico. “Boicotar as reformas não é bom para ninguém, nem para a indústria. Apenas para a CNI, que é uma entidade corporativa”, bateu. O representante da CNI deixou a audiência sem responder ao ministro.

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