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Guerra não é única ameaça externa à economia brasileira

Por Agencia Estado
Atualização:

A possibilidade de uma guerra contra o Iraque não é a única ameaça externa à economia brasileira esse ano. A situação econômica dos Estados Unidos atualmente se compara a uma espécie de bomba-relógio que pode ser desarmada pela atuação forte do Tesouro e do Federal Reserve (o Banco Central dos EUA) ou explodir em alguns meses. A guerra tem deixado em segundo plano outros riscos para o crescimento da maior economia do mundo - a alta capacidade ociosa das indústrias norte-americanas, a baixa inflação e a resistência da população local para consumir bens e serviços. Mesmo que a guerra não ocorra, essa indefinição em relação ao desempenho econômico dos EUA este ano vem aumentando a cada dia a retração dos investimentos. O raciocínio do investidor que varre os mercados em busca de ganhos financeiros tem sido mais ou menos assim: se os EUA vão mal, o mundo vai mal e, com isso, as perdas podem ser ainda maiores. Dessa forma, é melhor não arriscar em outros mercados, principalmente os emergentes. Para completar, junte-se à crise norte-americana o cenário difícil também na Europa, onde economias importantes como a Alemanha vem registrando baixíssimo crescimento, e o Japão que figura como exemplo do que deve ser evitado. Em meio a tudo isso, o Brasil precisa de dinheiro externo para financiar as suas contas e reduzir a cotação da moeda estrangeira. Portanto, luta para se diferenciar e provar que os riscos percebidos pelos investidores internacionais não são tantos assim. Alguns grupos privados conseguiram aproveitar a lua-de-mel dos primeiros dias do novo governo com os mercados financeiros para captar recursos lá fora. No mês passado, o setor privado brasileiro captou cerca de US$ 2 bilhões no exterior. As maiores emissões ficaram por conta de instituições financeiras. Na esfera pública, o Banco do Brasil fez uma captação de US$ 100 milhões. "As taxas até foram competitivas e o prazo ficou entre seis meses e um ano", afirma Sandra Utsumi, economista do BES Investimento. Desgaste O problema é que o agravamento da crise norte-americana pode colocar todo esforço da equipe atual para garantir uma transição tranqüila a perder. E os sinais emitidos até agora não têm sido nada animadores. "Os sinais são de desgaste acentuado. A utilização da capacidade instalada da indústria norte-americana está no nível mais baixo em 20 anos", alerta o economista Dany Rappaport, diretor da Tática Asset Management. Segundo ele, essa situação está associada ao crescimento exagerado das empresas ao longo da década de 90 em busca de lucros cada vez maiores. Isso ficou mais evidente em áreas como telecomunicações e tecnologia mas também se espalhou pelos demais setores. Além de um crescimento que não foi acompanhado pelo lado real da economia, esse movimento significou endividamento das grandes corporações. Sem conseguir manter lucros entre 20% e 25% ao ano, a média verificada no início da década, as empresas entraram em crise. A exuberância irracional alertada há anos pelo presidente do Federal Reserve, Alan Greenspan, começou a mostrar a sua cara. As bolsas despencaram e o consumidor se retraiu. Sem consumo, as empresas não consegue elevar preços para tentar recompor suas margens de lucro e a inflação assume trajetória de queda. "É preciso reverter esse quadro e é o que tem tentado o Fed com redução de juros e o Tesouro com expansão de gastos", destaca Rappaport. "Para retomar o crescimento lá nos EUA precisaria aumentar fortemente a produtividade das empresas", diz um técnico da área econômica. "A expectativa é de um crescimento moderado. A guerra, nesse caso, pioraria muito o cenário pois acabaria com a perspectiva de retomada da atividade este ano." O temor aumenta com a ameaça de a crise, atualmente localizada nas empresas, alcançar também o setor financeiro. Por enquanto, os bancos estão se beneficiando de juros baixos para captar recursos no curto prazo e valores um pouco maiores para emprestar no médio e longo prazo. "A preocupação nos EUA é a mesma da época da descoberta das fraudes nas grandes corporações como a Enron. Prejuízo das empresas pode elevar inadimplência nos bancos", destaca uma graduada fonte da área internacional do governo. Para Utsumi, se a atividade econômica nos EUA não for recuperada logo, as instituições financeiras terão problemas sérios de inadimplência, com reflexo no fluxo de capitais para o resto do mundo, inclusive, para o Brasil.

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