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'Há um longo caminho antes de voltarmos a investir na Vale', diz diretor de fundo britânico

Church of England vendeu as ações que tinha da mineradora após desastre de Brumadinho

Por Mariana Durão
Atualização:

RIO - À frente de um grupo de investidores institucionais que passou a pressionar a indústria da mineração por maior transparência e segurança após o desastre com a barragem da Vale em Brumadinho, um ano atrás, o fundo de pensão britânico Church of England enxerga mudanças no setor, mas ainda insuficientes para a retomada firme da confiança.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o diretor de Ética e Engajamento do fundo, Adam Matthews, afirma que não pretende afrouxar as restrições de investimento na Vale. O Church of England se desfez das ações da mineradora brasileira após a tragédia que matou 270 pessoas. “Ainda há um longo caminho antes de considerarmos voltar a investir na companhia. Até hoje não construíram casas após o desastre (da Samarco) em Mariana, quatro anos atrás. É simplesmente inaceitável”, diz.

Adam Matthews, diretor de Ética e Engajamento do fundo de pensão britânico Church of England Foto: The Church of England/ Divulgação

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Batizado de Iniciativa de Segurança para Investidores em Mineração e Rejeitos, o movimento já reúne estrangeiros com mais de US$ 14 trilhões em ativos sob sua gestão. Eles solicitaram a 727 companhias no mundo esclarecimentos sobre suas barragens de rejeitos. Receberam respostas de 332, que representam por 54% da indústria de mineração pelo critério de valor de mercado, incluindo a Vale. Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Um ano após o desastre em Brumadinho é possível dizer que algo mudou no setor pela pressão de investidores?

Sim, mas ainda não o suficiente. Há um longo percurso pela frente até que possamos dizer que a questão das barragens foi solucionada. Estamos desenvolvendo um novo padrão global em barragens de rejeitos, que será requerido pelos investidores. Pela primeira vez empresas divulgaram detalhes das operações de suas barragens. Recebemos dados de mais de 54% da indústria global de mineração por valor de mercado.

Algo mais?

Estamos trabalhando em novas intervenções para estabelecer um sistema de monitoramento global equivalente ao que opera na aviação e na navegação. Além disso, queremos identificar as barragens mais perigosas que precisam ser removidas e garantir que isso seja feito com urgência. Mas exigirá o engajamento de governos e empresas, além do apoio de investidores.

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A Samarco é uma joint venture entre Vale e BHP. Por que essas sociedades preocupam?

Nos preocupa que elas possam levar a, ou incentivar, duplos padrões e inconsistências nos relatórios das companhias, em especial em relação a meio ambiente, social e governança (ESG).

Brumadinho afetou o apetite dos investidores em relação às mineradoras? É possível recuperar a confiança no setor?

Brumadinho certamente afetou a confiança dos investidores nas mineradoras. Mas podemos ter um mundo sem a mineração? Não. Ela tem papel fundamental em prover muitos dos recursos necessários à transição para uma economia de baixo carbono. No entanto, ainda há problemas a resolver. Há compromissos claros de alguns CEOs nesse sentido, mas eles não podem fazer isso sozinhos. O afastamento dos investidores do setor não é a resposta. Isso não quer dizer permanecer investido em todas as companhias. Diferenciar as que estão mudando ou tentando mudar é muito importante.

O Church of England vendeu as ações da Vale após o colapso de Brumadinho. A empresa ainda está na lista suja?

Sim. Não temos planos de afrouxar nossa restrição de investimento na companhia. Ainda há um longo caminho antes de considerarmos voltar a investir na companhia. Até hoje não construíram casas após o desastre (da Samarco) em Mariana, quatro anos atrás. É simplesmente inaceitável.

O fundo desinvestiu do setor de mineração como um todo?

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De jeito nenhum. Assumimos compromissos em relação às mudanças climáticas aplicáveis às empresas de mineração. Isso inclui o compromisso de se envolver com empresas para incentivá-las a alinhar seus negócios ao Acordo de Paris e, em 2023, tomaremos decisões de desinvestimento levando em conta se houve alinhamento de seus modelos de negócios às metas de mudança climática.

A Vale fez mudanças de processo e na governança após Brumadinho. Como avaliam essas medidas?

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Continuaremos a monitorar o desenvolvimento dessas mudanças de perto, incluindo as perspectivas das comunidades afetadas pelos desastres de Mariana e Brumadinho.

Qual a importância de criar um padrão internacional para a operação de barragens?

Um padrão global para o manejo de rejeitos está sendo desenvolvido através de um processo independente, com participação do Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a rede Princípios para Investimento Responsável. Esperamos que seja publicado no primeiro semestre de 2020. Um padrão global é parte essencial em um conjunto de medidas para assegurar que não veremos futuros desastres com barragens de rejeitos, mas vai requerer a adesão e transparência das empresas, assim como um monitoramento independente.

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