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IBGE atrasa divulgação da Pnad Contínua, primeiro adiamento por causa da pandemia

Por causa da pandemia do novo coronavírus, o IBGE passou a fazer todas suas pesquisas de forma remota, por telefone, e-mail ou sistemas online

Por Vinicius Neder
Atualização:

RIO - As dificuldades para fazer suas entrevistas com distanciamento social, por telefone, levaram o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a anunciar nesta terça-feira, 28, o primeiro adiamento da divulgação de uma pesquisa por causa da pandemia de covid-19. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) mensal de junho, referente ao segundo trimestre, que traz os dados mais completos sobre mercado de trabalho e seria divulgada na quarta-feira, 29, foi adiada para a próxima quinta-feira, 6 de agosto.

Por causa da pandemia do novo coronavírus, o IBGE passou a fazer todas suas pesquisas de forma remota, por telefone, e-mail ou sistemas online. Foto: Lucas Lacaz Ruiz/Estadão

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Como os dados da Pnad Contínua são sempre trimestrais – a divulgação é mensal, referente a um “trimestre móvel” –, a edição da pesquisa referente ao segundo trimestre seria o primeiro retrato completo sobre como a covid-19 atingiu em cheio o mercado de trabalho.

Já é sabido que o quadro continuou piorando em junho, por causa da Pnad Covid, uma versão semanal e mais simples da pesquisa do IBGE, e do Caged, o registro de admissões e demissões do Ministério da Economia, que abrange apenas os empregos formais.

Só que os dados da Pnad Contínua são mais completos, abrangendo também o trabalho informal e as pessoas que desistiram de procurar emprego. A edição de junho mostrará com clareza o impacto da pandemia, ao trazer a comparação do segundo com o primeiro trimestre. Na edição mais recente, referente ao trimestre de março a maio, a covid-19 já apareceu com força, mas ainda havia informações referentes à primeira quinzena de março, ou seja, de antes da adoção das medidas de distanciamento social para segurar a pandemia. 

Logo após o anúncio das primeiras medidas pelos governos estaduais, o IBGE anunciou, em 17 de março, a suspensão de entrevistas presenciais para coletar informações para suas pesquisas. Até o Censo 2020 foi adiado para 2021.

Desde então, o IBGE vem se adaptando para coletar os dados de forma remota. As pesquisas sobre a atividade econômica – que medem a produção industrial e as vendas do varejo, por exemplo – foram pouco afetadas, pois a maioria das informações já era passada pelas empresas entrevistadas de forma eletrônica, usando questionários em sistemas on-line. As lacunas são preenchidas por telefone sem muitos problemas. Fazer a coleta de preços para calcular a inflação por telefone ou via internet também foi possível.

Já a adaptação da Pnad Contínua é a mais complicada de todas. O IBGE tenta entrevistar 70 mil lares por mês, somando um total de 211 mil domicílios por trimestre, de cerca de 3,4 mil cidades de todo o País. Para dar conta do recado, são 2 mil entrevistadores em campo, treinados especificamente para fazer a pesquisa, geralmente usando um “tablet” ou equipamento similar. As entrevistas podem ser mais demoradas, as perguntas não são desenhadas para serem feitas por telefone, e a interação social entre entrevistador e entrevistado é importante.

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Substituir isso por entrevistas por telefone não é simples, lembrou o diretor-adjunto de Pesquisas do IBGE, Cimar Azeredo. Nem todos os entrevistados possuem telefone, alguns mudam de número com frequência, outros não atendem quando não reconhecem quem está fazendo a chamada, e muitos evitam passar o número para o entrevistador.

“Pessoas de estrato de renda mais baixa não dão o telefone porque não têm. As pessoas de estrato de renda mais rica não dão por questão de segurança”, afirmou Azeredo.

A tentativa do IBGE em obter os números de telefone dos entrevistados virou uma novela. Houve até a edição de uma Medida Provisória (MP) para obrigar as operadoras de telefonia a passarem nomes, endereços e número de telefone de seus clientes, estratégia que foi considerada desnecessária por alguns

A MP foi anulada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas o IBGE teve acesso à base de dados telefônicos de 2019. Tanto que conseguiu desenvolver a Pnad Covid – diferentemente da Pnad Contínua, a versão semanal da pesquisa tem um questionário desenvolvido especificamente para entrevistas por telefone e a amostra dos entrevistados foi formada já levando em conta o acesso aos números de contato.

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Mesmo assim, não tem sido fácil descobrir o telefone dos moradores que o IBGE precisa entrevistar, disse Azeredo, que fez um apelo pela participação da sociedade. Os representantes das agências locais do órgão de estatísticas têm recorrido às secretarias de saúde dos municípios, mandado cartas para os lares selecionados e até contratado motoboys para levar correspondência expressa pedindo que os moradores telefonem para o IBGE ou atendam a ligação dos entrevistadores.

Azeredo explicou ainda que as dificuldades estão se acumulando à medida que os meses passam, porque, a cada mês, um grupo de domicílios que nunca havia sido entrevistado é inserido na amostra da pesquisa. O objetivo é evitar que uma mesma família seja entrevistada sempre ao longo dos anos. Dessa forma, ao longo de cada trimestre, são renovados 20% da amostra de 211 mil domicílios, que representa o País como um todo.

No caso dos domicílios entrevistados pela primeira vez, a dificuldade em obter o número de telefone dos moradores é ainda maior, afirmou Azeredo. Por isso, em junho, a Pnad Contínua conseguiu entrevistar só 57,6% da amostra daquele mês. Nos últimos meses, por causa das entrevistas remotas, o nível de respostas vinha pouco acima de 60%. Em tempos normais, pré-pandemia, a Pnad Contínua consegue entrevistar em torno de 88% da amostra.

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A taxa de respostas de junho foi baixa, mas suficiente para garantir a qualidade dos dados e passar nos testes necessários para divulgação, garantiu Azeredo. Ainda assim, por causa das dificuldades com o telefone, para chegar a esse nível de respostas em junho foi preciso estender o período durante o qual as entrevistas são feitas em duas semanas, conforme Maria Lúcia Vieira, coordenadora de Trabalho e Rendimento do IBGE. Os trabalhos só terminaram na última sexta-feira, 24.

Segundo Azeredo, a estratégia de estender o período durante o qual as entrevistas são feitas já vinha sendo adotada. Até agora, nenhuma pesquisa teve a divulgação adiada porque o IBGE sempre trabalha com um prazo de segurança entre o término da coleta das informações e a divulgação. Nesse intervalo, os pesquisadores tabulam, processam e verificam todas as informações, antes de divulgá-las.

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Desta vez, porém, as duas semanas a mais no período de coleta atrasaram a divulgação. A definição da nova data na semana que vem levou em consideração o prazo mínimo de seis dias úteis para o trabalho de processamento dos dados, disse Maria Lúcia.

De acordo com Azeredo, poderá haver novos atrasos. A estratégia de prorrogar os prazos de coleta deverá continuar nos próximos meses, e as prorrogações poderão passar até de duas semanas.

“Aí vai atrasar a divulgação. O importante é não perdermos a pesquisa”, disse o diretor-adjunto, lembrando que não há como substituir a qualidade e abrangência dos dados da Pnad Contínua em assuntos como renda, emprego, trabalho infantil, educação.

Mesmo assim, pelo menos por enquanto, o IBGE não pretende flexibilizar a suspensão das entrevistas presenciais, apesar do relaxamento das regras de distanciamento social em muitos Estados. Mesmo diante das dificuldades com a Pnad Contínua, o órgão informou que sua “política de distanciamento social” está mantida e que a orientação para fazer entrevistas por telefone seguirá.

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