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Jornalista e colunista do Broadcast

Opinião|Inflação de rico, inflação de pobre

Tanto nos Estados Unidos quanto aqui, surpresas inflacionárias pegaram Fed e BC no contrapé

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Atualização:

Os bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos enfrentam desafios distintos causados pela mesma razão: a surpreendente perda de fôlego da inflação. Em ambos os casos, uma postura mais conservadora de política monetária em detrimento de mais estímulo está sendo questionada pelos investidores.

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O Federal Reserve (Fed) sofreu críticas por sinalizar elevações adicionais dos juros americanos, enquanto os índices de preços ao consumidor teimam em não subir em direção à meta anual de 2%.

Já o BC brasileiro alertou no comunicado da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que uma “redução moderada” no ritmo de corte de juros seria mais adequada no próximo encontro, marcado para os dias 25 e 26 de julho, diante das incertezas no andamento das reformas, em razão da crise política. No último Copom, o BC cortou a taxa Selic em 1 ponto porcentual.

Tanto lá quanto aqui, as surpresas inflacionárias nos últimos meses pegaram Fed e BC no contrapé dos recentes discursos quanto aos próximos passos das respectivas políticas monetárias. Nos EUA, o índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) em maio caiu 0,1% em relação a abril. O núcleo dos preços subiu 1,7% ao ano em maio ante alta de 1,9% em abril.

Mais ainda: os analistas estimam que o núcleo do índice de preços dos gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês), que subiu 1,5% em abril na comparação anual, deverá ter alta de 1,4% em maio. O PCE é a medida de inflação preferida do Fed. No Brasil, o IPCA de maio subiu 0,31% enquanto as estimativas dos analistas apontavam alta de 0,47%. Em 12 meses, acumulou alta de 3,60%.

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Mais ainda: a projeção dos analistas é que, em junho, o Brasil registre deflação pela primeira vez em 11 anos, com estimativa de queda de 0,21% do IPCA.

Mas se nos EUA a perda de fôlego da inflação surpreende porque a economia americana se encontra numa situação de pleno emprego (a taxa de desemprego caiu para 4,3% em maio, a menor desde 2001), no Brasil o número de desempregados ultrapassa 14 milhões.

A presidente do Fed, Janet Yellen, culpou fatores temporários, como a queda nas tarifas de telefonia celular, para as surpresas inflacionárias nos EUA. Todavia, fracassou a tese de Yellen nos últimos anos de que a melhora do mercado de trabalho americano seria um fator para impulsionar a demanda e, por tabela, os índices de preços.

No Brasil, além de a recuperação da economia estar bem aquém do esperado, com demanda ainda anêmica, um choque nos preços de alimentos (em forte queda) transformou o grande vilão da inflação alta no passado recente no maior responsável pela desaceleração acelerada nos índices de preços.

O desafio do Fed é impedir que a perda de ímpeto na inflação dos Estados Unidos se consolide, trazendo a ameaça da deflação, problema que atormentou o Japão por décadas. Como seguir subindo os juros se a inflação não volta para próximo da meta? Será que o Fed deixou de mirar o controle de preços para focar na atividade econômica?

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Já o BC tem a tarefa de tornar a desinflação atual de um processo cíclico para algo estrutural, baixando a inflação de forma permanente para patamares civilizados, como 3% ao ano. Para isso, será importante se o Conselho Monetário Nacional (CMN), que se reúne no próximo dia 29, decidir reduzir a meta de inflação atual de 4,5% para 4,25% em 2019. Seria uma sinalização de um compromisso com o controle da inflação.

Mas para que essa desinflação seja estrutural, sem que o Brasil tenha que atravessar por uma nova recessão, é preciso a aprovação de reformas, como a da Previdência, que consigam controlar os gastos públicos, cujo crescimento acaba por prejudicar as expectativas inflacionárias por representar uma pressão na demanda.

Os desafios do Fed e do BC são enormes, mas se os Estados Unidos enfrentam problemas típicos de economias ricas, o Brasil lida com questões históricas de países em desenvolvimento.

*É COLUNISTA DO BROADCAST

Opinião por Fábio Alves

Colunista do Broadcast

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