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Interesses na máquina sindical

O governo hoje não tem vontade política para reformar o sindicalismo

Por Sérgio Amad Costa
Atualização:

A reforma trabalhista, que está sendo proposta pelo governo, é um primeiro passo, e importante, para modernizar as relações trabalhistas no País. Mas, também, é fato que ela será mais eficiente se acompanhada por uma reforma sindical. Porém, a reforma sindical, a meu ver, é mais difícil de acontecer do que a própria reforma trabalhista.

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Por que essa estrutura sindical, criada na década de 30 do século passado, por Getúlio Vargas, permanece praticamente intacta até os dias atuais? Muitos pensam que é só por causa de interesses de vários dirigentes trabalhistas que se instalam nela e pressionam os governantes para que ela não seja reformada. É uma das causas, mas não é a única. Cumpre observar, também, que praticamente todos os governos que tivemos, desde aquela época até hoje, tiraram proveito, em maior ou menor grau, dessa estrutura, pois ela é controlada pelo Estado e serve de apoio a políticas e medidas trabalhistas adotadas por quem está no poder. Assim, nunca se viu no País, empenho de verdade, para que o modelo sindical fosse alterado.

A máquina sindical funciona mediante sua estrutura vertical e subordinada ao Estado, composta por sindicatos, federações, estas quase sempre estaduais e confederações nacionais. A utilização dessa estrutura, por parte dos governantes, para conseguir apoio às suas teses, se deu de forma distinta no País e em dois momentos diferentes. Um, foi durante os governos populistas que antecederam os episódios de 1964. Naquele período, o reconhecimento oficial dos sindicatos acontecia por motivos político-ideológicos. Muitos deles, sem representatividade, eram oficializados pelo Ministério do Trabalho e passavam a fazer o jogo do governo.

Para eleger, por exemplo, uma diretoria de uma federação sindical e, consequentemente, por meio destas, a diretoria das confederações, um sindicato que representasse uma categoria profissional de 5 mil trabalhadores e possuísse 400 associados teria o mesmo peso nos votos, que um sindicato profissional de 50 mil trabalhadores e 4 mil associados.

Portanto, quando um governo concede o registro para sindicatos com pouca representatividade, ou sem nenhuma mesmo, ele está muitas vezes procurando obter mais apoio na estrutura vertical, mediante pleitos que, não raro, poderão favorecer a vitória de sindicalistas aliados, pelo menos momentaneamente.

Um outro momento de proliferação de sindicatos sem nenhuma representatividade ocorre em anos recentes, intensificada durante o governo Lula e o governo Dilma. Porém, agora os interesses de falsos líderes sindicais são outros. Procuram o reconhecimento oficial de seus sindicatos para obter ganhos financeiros com os malfadados tributos sindicais. Ora, quem oficializa o sindicato é o Ministério do Trabalho. Portanto, esse reconhecimento oficial poderá gerar, também, um aliado do governo, tanto nos pleitos para eleger diretores de federações e confederações sindicais, quanto para fortalecer, em termos de número de sindicatos filiados, essa ou aquela central sindical.

É por isso que nesses anos recentes não para de crescer o número de sindicatos no Brasil. Vale ler a excelente matéria “A Modernização dos Sindicatos”, publicada no Estado em 29/01, apresentando uma série de números sobre esse contexto e análises contundentes a respeito do funcionamento dos órgãos de representação profissional no Brasil, incluindo comparações com outros países.

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O fato é que essa estrutura vertical, como ela está montada, gera um certo comodismo nos nossos governantes, no sentido de não terem vontade política para reformar o sindicalismo no Brasil. E, com isso, além de proliferar os órgãos de representação profissional de fachada, mantém o monopólio da representação, impedindo o pluralismo sindical e garantindo a permanência dos tributos sindicais. Torço para que o atual governo não dê continuidade a essa prática desastrosa de se servir da máquina sindical e que também apresente uma proposta de reforma nesse campo.

*É professor de Recursos Humanos e Relações Trabalhistas da FGV-SP

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