Diante da resistência da taxa de inflação, da difusão dos aumentos de preços para outros produtos que não as commodities, principalmente para os bens industriais, e do comportamento das expectativas para a inflação, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BCB) decidiu adotar uma estratégia mais dura de combate à inflação.
Além de cumprir com a promessa feita na reunião anterior de aumentar a Selic em 0,75 p.p., o comitê anunciou novo aumento de mesma magnitude para a reunião de agosto e indicou que vai levar a taxa de juros para o nível neutro. Com isto, praticamente eliminou a possibilidade de que, no final deste processo de ajuste, a política monetária mantenha algum grau de estímulo à atividade econômica. Tudo isto era esperado pelos investidores.
Porém, o comitê foi mais longe. O comitê surpreendeu os investidores ao iniciar o processo de ajuste em março, quando a expectativa era de que o faria em maio, com um aumento da Selic em 0,75 p.p., quando a expectativa era de 0,5 p.p., e com a antecipação de novo reajuste de mesma magnitude na reunião que se seguiria, em maio. Segundo nossa interpretação, o objetivo era interromper o processo de deterioração das expectativas para a inflação. Naquele momento, a mediana das expectativas para a inflação em 2022 havia ultrapassado a meta e a média das expectativas estava caminhando para um nível acima da mediana, indicando que um número significativo, e crescente, de investidores estava prevendo inflação acima da mediana.
Entretanto, as surpresas não tiveram o efeito desejado. A mediana das expectativas continuou em elevação e a média continuou se descolando da mediana. Diante desta frustração em atingir o objetivo desejado e dado o risco eminente de perder o controle sobre as expectativas, o Copom decidiu na reunião desta semana que “uma deterioração das expectativas de inflação para o horizonte relevante pode exigir uma redução mais tempestiva dos estímulos monetários”. Ou seja, caso as expectativas não entrem em trajetória de queda, o Copom poderá aumentar a Selic em mais de 0,75 p.p., o que levou os investidores a antecipar esta possibilidade e já colocar nas apostas este endurecimento da política monetária.
Além de indicar um aumento mais rápido da taxa de juros, o Copom se mostrou menos preocupado com um possível efeito do aperto monetário sobre a atividade econômica. Como a atividade econômica está mostrando um desempenho acima do esperado, o Banco Central avalia que os riscos para a recuperação econômica “reduziram-se significativamente”. O que sugere que, segundo a autoridade monetária, uma política monetária mais apertada não deverá levar a uma redução forte na retomada da economia.
Segundo o BCB, o aumento da inflação pode ser potencializado pelo fato de que a vacinação no País contra a covid-19 está acelerando, o que deverá levar a aumento da atividade, principalmente do setor de serviços, e redução do desemprego, podendo gerar pressão sobre a inflação de serviços.
Para a autoridade monetária, o balanço de riscos continua assimétrico, o risco fiscal permanece no horizonte, ainda que com melhora substancial se comparado ao começo de 2021. O destravamento da pauta do Congresso e a solução do impasse no Orçamento geraram uma tendência à valorização cambial, que se intensificou com a divulgação dos dados de atividade e de gastos públicos melhores que o esperado.
Entretanto, segundo o comitê, esta valorização não tem tido os efeitos esperados sobre a taxa de inflação, o que indica uma política monetária mais apertada.
Finalmente, a preocupação com a inflação se justificaria também por causa dos efeitos de curto prazo da crise hídrica, mais um choque de oferta importante sobre os preços. Enfim, a mensagem parece clara: o Copom fará tudo ao seu alcance para atingir a meta em 2022. Uma decisão que reforça a trajetória de valorização do real.
*PROFESSOR TITULAR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO (APOSENTADO) E ECONOMISTA-CHEFE DA GENIAL INVESTIMENTOS