17 de agosto de 2021 | 04h00
O Presidente da Câmara dos Deputados anunciou que pretende colocar em votação nesta terça-feira, 17, o Projeto de Lei (PL) 2.337/2021, que trata da reforma da tributação da renda no Brasil. Há um consenso de que a apreciação do projeto se deu sem uma discussão minimamente aprofundada do tema, que é extremamente complexo.
Sem entrar nos detalhes, que são muitos, cabe avaliar se o substitutivo apresentado pelo relator do PL 2.337 atende a cinco princípios, que deveriam orientar a reforma da tributação da renda:
Na prática, verifica-se que a proposta do relator não atende a nenhum desses princípios. Em primeiro lugar, a proposta reduz a tributação da renda e aumenta a tributação do consumo (via aumento da receita de PIS/Cofins e IPI), piorando ainda mais a composição já desequilibrada dos tributos cobrados dos brasileiros.
Em segundo lugar, a proposta não apenas deixa de corrigir, como agrava a falta de isonomia existente na tributação de diferentes formas de renda. Uma das grandes distorções existentes no modelo atual de tributação diz respeito à diferença entre a tributação da renda de um empregado formal e a tributação da renda de um “PJ” que atua como sócio de uma empresa do lucro presumido. A título de exemplo, a alíquota marginal (incidente sobre o acréscimo de renda) de um empregado formal com renda superior a R$ 6,5 mil/mês é de 40,1%, enquanto a alíquota marginal incidente sobre a renda de um PJ com renda de R$ 100 mil/mês pode ser de apenas 13,6%. O substitutivo do PL 2.337 agrava essa distorção, reduzindo a alíquota marginal incidente sobre a renda do PJ para 9,6%.
Em terceiro lugar, o projeto não traz efetivamente maior progressividade. Além do aumento na distorção na tributação dos PJs, mesmo no caso das grandes empresas, em que a tributação de 20% na distribuição de dividendos deveria resultar em maior progressividade, isso não necessariamente ocorrerá. De fato, a maior parte dos lucros dos grandes acionistas não é distribuída, mas sim reinvestida, diretamente ou através de holdings. Nestes casos, não apenas não haverá a tributação na distribuição, como os acionistas serão beneficiados pela redução da alíquota na empresa de 34% para 24%. Na prática, não serão os bilionários, mas sim os pequenos e médios acionistas das grandes empresas que arcarão com o aumento da tributação na distribuição.
Em quarto lugar, o PL 2.337 não garante segurança jurídica, ao estabelecer a tributação da distribuição de lucros auferidos até 2021, que já foram tributados a 34% na empresa. Tal medida inevitavelmente levará a um aumento do litígio tributário, que já é enorme no Brasil.
Em quinto lugar, embora se alegue que a redução da alíquota na empresa e a tributação na distribuição devam favorecer o investimento, a verdade é que a literatura econômica está longe de ser conclusiva a esse respeito. Mesmo que haja um efeito positivo sobre o investimento, no entanto, este tende a ser compensado pelo efeito negativo sobre a eficiência econômica decorrente do aumento da insegurança jurídica, do estímulo à “pejotização” e da criação de distorções na estrutura de capital das empresas em função de um estímulo ao maior endividamento e ao menor uso de capital próprio.
O Brasil precisa de uma reforma da tributação da renda. Mas não é esta que está sendo discutida com base no PL 2.337. O pior é o enorme desperdício de energia política e de espaço fiscal para viabilizar a aprovação de um projeto ruim.
*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL
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