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Itaipu: rediscutindo a relação

A solução moderna é que a energia, tanto brasileira quanto paraguaia, possa ser livremente comercializada

Por Paulo Pedrosa
Atualização:

Décadas após sua construção, Itaipu ainda impressiona, não só pela grandeza da obra, mas também por seu caráter de vitória diplomática: com a usina, Brasil e Paraguai se integraram, gerando riqueza e conhecimento, e constituíram uma equipe cuja competência é um farol. Deram exemplo ao mundo de como dois países que experimentaram o conflito podem realizar obras fantásticas quando se harmonizam.

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Hoje, Brasil e Paraguai seguem irmanados e dividindo a mesma agenda, com uma visão moderna de lógica econômica e desenvolvimento. O Paraguai é um jaguar latino-americano, um país que cresce num ritmo de 4% ao ano. Nós, brasileiros, que agora flertamos com a recuperação econômica, temos o que aprender com eles.

Quando se discute o Tratado de Itaipu, assinado em 1973, é de esperar que as questões de interesse nacional e diplomacia estejam presentes, mas devem estar suportadas por uma discussão técnica e econômica, que evite a captura do discurso por interesses menores e forças antagônicas.

É importante registrar que, com o tempo, foram divididas de forma desigual as duas categorias da energia de Itaipu: a primeira, associada à potência contratada, paga todos os custos da usina; e a segunda, sete vezes mais barata, suporta só os royalties adicionais de sua produção. Na divisão dessas energias entre os países, o Paraguai acaba pagando quase metade do que pagam os consumidores brasileiros por megawatt-hora, o que não parece razoável considerando o estado atual das duas economias. Isso precisa ser reequilibrado, respeitadas todas as condições políticas, e será fundamental para estabelecer bases da renegociação do tratado, até 2023.

Itaipu é uma usina que funciona sob a lógica de tarifa pelo custo, modelo visto hoje como promotor de ineficiências. A teoria regulatória aponta que essa lógica leva a uma tendência de aumento de custos, especialmente dos que são aplicados 50% em cada país, mas pagos pelos brasileiros na proporção de 85%. Este é o caso das duas pontes internacionais previstas para serem construídas, e que não deveriam mais ser financiadas pelos consumidores de energia.

O que deve ficar claro nesta renegociação é que, mantidas as regras atuais de tarifa pelo custo, com o fim do financiamento em 2023 poderia haver uma enorme redução, que seria majoritariamente direcionada ao Brasil. Apesar de vantajoso, não parece ser um cenário adequado, porque penalizaria o país vizinho e traria distorções ao mercado brasileiro. Isso aumenta a responsabilidade de encontrar uma solução no curto prazo.

Também importa considerar que o Brasil já não depende mais da energia excedente do Paraguai para atender à sua demanda interna. Temos visto nos últimos leilões que essa parcela de energia pode ser substituída em prazo curto por outra modalidade, bem competitiva e associada a novos investimentos e empregos no País.

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A solução moderna é que a energia, tanto brasileira quanto paraguaia, possa ser livremente comercializada, seja nos leilões regulados ou no mercado livre, contribuindo para a liquidez e eficiência dos nossos mercados.

O fim do pagamento do financiamento e a renegociação do modelo de Itaipu trazem aos dois países uma oportunidade extraordinária de capturar cerca de US$ 1 bilhão por ano, para cada uma das margens do Rio Paraná, e decidir individualmente que destino dar a esse montante. Por isso a discussão do tratado é uma chance que Brasil e Paraguai têm para modernizar sua relação econômica e criar, na energia, uma integração verdadeiramente competitiva e de mercado.

Assim, continuamos a dar ao mundo o recado de que, na direção econômica correta, dois países podem se manter alinhados e irmãos, numa relação cujos votos se renovam, com benefícios para o crescimento dos dois, valorizando a liberdade de decidir sobre seus rumos e sua energia.*PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS GRANDES CONSUMIDORES INDUSTRIAIS DE ENERGIA E DE CONSUMIDORES LIVRES (ABRACE), FOI CONSELHEIRO DE ITAIPU E DIRETOR DA ANEEL

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