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Jornada de trabalho poderia ser de 4 horas, diz economista

Ganhos de produtividade e tecnologia permitem redução da jornada, diz Pochmann

Por Agencia Estado
Atualização:

O economista Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia (IE) e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), disse nesta segunda-feira que os ganhos de produtividade obtidos pelo mundo do trabalho já permitem que a jornada dos trabalhadores possa ser de quatro horas por dia, em três dias por semana. "Há singularidade do trabalho hoje: os ganhos de produtividade foram muito significativos e há condições técnicas para reduzir a jornada, sem comprometer o desempenho", disse o especialista, durante apresentação da pesquisa sobre terceirização no mercado de trabalho de São Paulo encomendada pelo Sindicato dos Empregados em Empresas de Prestação de Serviços e Terceiros, Colocação de Mão-de-obra, Trabalho Temporário, Leitura de Medidores e Entrega de Avisos do Estado de São Paulo (Sindeepres). De acordo com Pochmann, "é natural" que empresários relutem em aceitar a diminuição da jornada de trabalho alegando queda de eficiência, assim como há hoje toda uma discussão na França sobre supostos efeitos negativos que a redução de jornada teria provocado àquele secular mercado de trabalho, mas que, de fato, todas as condições técnicas estão dadas para que determinados grupos de trabalhadores, como prestadores de serviços e funcionários do comércio, possam ter uma carga menor de trabalho. Jornada de fábrica "Não é possível reduzir a jornada numa fábrica, onde há linha de montagem, mas em prestação de serviços não há necessidade de o trabalhador permanecer por oito horas no mesmo local de trabalho todos os dias", analisou. "Os empresários podem argumentar que não há espaço para redução, assim como no início do século XX muitos não entendiam que a jornada de 14 horas por dia diminuía a produtividade e provocava uma série de doenças no trabalhador", exemplificou. No estudo, o economista relata que 423,97 mil pessoas do Estado de São Paulo trabalham formalmente em empresas de terceirização. Em 1985, eram 60,47 mil trabalhadores. Cruzando informações das guias do Sindeepres, com dados do Ministério do Trabalho e Emprego e da Caixa Econômica Federal, Pochmann constatou que, de 1985 a 2005, dos cerca de 3 milhões de empregos criados em São Paulo, 12,1% foram gerados por empreendimentos envolvidos com terceirização de mão-de-obra. Embora representem 1% do total das companhias instaladas no Estado, as empresas terceirizadas respondem hoje por cerca de 5% do emprego formal. "A se manter o ritmo de expansão, em 2010 ou 2011, as empresas terceirizadas contarão com cerca de 1 milhão de trabalhadores em São Paulo", projetou Pochmann. Tercerização Segundo ele, o setor privado tem optado por terceirizar atividades em detrimento de contratações diretas principalmente pelo menor custo da "cunha fiscal" cobrada para os contratantes dos prestadores de serviços. Os impostos e encargos sobre folha de um assalariado custam para a empresa em torno de 30% do custo total de contratação. Com a terceirização, a cunha fiscal se reduz para cerca de 14%. "Não foi necessário promover nenhuma reforma trabalhista e as empresas não se queixam de não poder se modernizar por causa da legislação. A lei já é flexível, tanto que as empresas conseguiram criar o sistema de terceirização e de contratação de Personalidade Jurídica (PJ)", opinou Pochmann. Ele comentou que é crescente o número de PJs em São Paulo, de 11 empresas, em 1985, para 1.918, em 2005. "É uma realidade que está posta, mesmo com as restrições feitas pela Justiça Trabalhista de que as empresas não podem terceirizar suas atividades-fim", alegou. Emenda 3 Por isso, ele entende que o debate envolvendo o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à chamada Emenda 3 do projeto que cria a Super Receita (a emenda diz que somente a Justiça do Trabalho pode autuar o PJ caso verifique vínculo trabalhista com a empresa receptora dos serviços) demonstra "primitivismo". "Tratar este tema apenas como matéria fiscal é não discutir o que estamos vivendo no mundo do trabalho", pontuou. O estudo relata também que os trabalhadores terceirizados têm rendimentos, em média, 50% menores do que os funcionários com registro em carteira e que executam as mesmas funções. "Isso acontece porque a competição entre as empresas terceirizadas é muito grande, as oportunidades são poucas, e os contratantes promovem uma espécie de licitação pelo menor preço. Há também um contingente muito grande de desempregados, o que também leva o terceirizado a aceitar o valor menor a ser recebido", diagnosticou. Ao mesmo tempo, o aumento da chamada "superterceirização", a saber, a terceirização de atividades-fim, acabou por elevar o rendimento médio dos trabalhadores ao longo dos últimos 20 anos. Se, em 1985, havia concentração da terceirização em serviços como faxina e fornecimento de refeição, de menor remuneração, o aparecimento dos PJs, principalmente a partir dos anos 90, gerou contratações de maior rendimento, elevando o valor médio. Em valores baseados na inflação acumulada até dezembro de 2005, o rendimento médio do conjunto dos terceirizados era de R$ 491, em 1985, e subiu para R$ 687, em 2005. "A reforma trabalhista deve considerar todos esses fenômenos e olhar para o futuro do mercado de trabalho. Independentemente das discussões que vem sendo feitas, as empresas já promoveram essas mudanças, mesmo com tantas restrições aparentes, e que não se confirmam, estabelecidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)", salientou. "Por isso, deve-se pensar em qual será o País que queremos ser, o que devemos esperar para 2015, e pensar numa reforma que crie modalidades distintas de trabalho e considere jornadas de trabalho diferenciadas", sugeriu.

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