Joseph Safra morre antes de iniciar projeto que mudaria a paisagem do centro financeiro de Londres

Torre de observação de 305,3 metros de altura com o topo no formato de um broto de tulipa teve a construção barrada pela prefeitura, mas o banqueiro recorreu ao órgão de planejamento do Reino Unido

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Por Célia Froufe
4 min de leitura

BRASÍLIA - O banqueiro Joseph Safra, que morreu nesta quinta-feira, 10, aos 82 anos, tinha o sonho de construir um projeto arquitetônico que mudaria a paisagem do principal centro financeiro da Europa, em Londres. Ele pretendia ocupar o lugar mais alto da região: um prédio de 305,3 metros de altura, que levaria o nome de The Tulip (A Tulipa). A previsão era a de que empreitada fosse capitaneada e financiada pela Bury Street Properties, um grupo também da família, administrado por seu filho mais velho, Jacob J. Safra.

O projeto do homem descrito como o “banqueiro mais rico do mundo” já havia recebido o aval, em 2019, da City of London Corporation, que administra a região do centro financeiro, e também o importante sinal verde da Greater London Authority, mas o prefeito de Londres, Sadiq Khan, anulou o comitê de planejamento. “O desenvolvimento proposto de uma atração turística alta, em virtude de sua altura, forma, design e aparência não constituiria a mais alta qualidade de design exigida para um edifício," trouxe o parecer da prefeitura de Londres, acrescentando que o projeto"comprometeria a capacidade de apreciação da Torre de Londres, que é reconhecida como um patrimônio mundial da Unesco”.

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Mais do que a altura, a arquitetura do prédio chamou a atenção na capital britânica. O nome Tulipa não é casual. O projeto da torre de concreto e vidro conta com oito andares de atrações e tem a forma de "broto" da flor no topo de um "pedestal" de 240 metros. Por dentro, foram desenhadas pontes de piso de vidro para mover os visitantes lentamente em cápsulas transparentes para fora do edifício por meio de trilhas no exterior. Na cobertura, foi previsto um jardim público.

Projeto da torre de observação The Tulip, que seria construída no centro financeiro de Londres. Foto: Foster + Partners

A expectativa era de que o edifício começasse a ser construído este ano e fosse entregue em 2025. Seu anúncio causou polêmica em Londres, que já conta com outros arranha-céus de gosto duvidoso e que hoje são conhecidos pelos seus apelidos populares, como o Walkie Talkie, o Ralador de Queijo e o Gherkin (pepino em conserva). Este último, de 180 metros, também foi projetado pelo escritório de arquitetura Foster + Partners, que está a cargo da Tulipa. A contragosto de muitos britânicos mais conservadores, que queriam que o prédio que se tornou um símbolo do coração financeiro do país ficasse nas mãos de locais, o Gherkin foi arrematado em 2014 por Joseph Safra por 700 milhões de libras esterlinas.

A principal diferença entre os "prédios irmãos", que seriam vizinhos, seria seu propósito. O pepino, apontado por ser o "arranha-céu mais civilizado do mundo", conta com restaurante e bar em sua cúpula de vidro, mas a maior parte da construção abriga escritórios de empresas principalmente do setor financeiro. O caçula, no entanto, não foi projetada para o trabalho. Nos oito andares da atração estão previstos um bar, restaurantes e até uma "sala de aula no céu", voltada para estudos de alta tecnologia. O diretor do projeto, Grant Brooker, a chamou de "a melhor sala de aula do mundo".

O projeto contava com a previsão de atrair 1 milhão de visitantes e tinha como garantia a oferta de 20 mil entradas gratuitas para crianças de escolas públicas por ano. O prospecto do escritório de arquitetura assim descreveu o empreendimento: "Os visitantes se beneficiarão de materiais interativos e pílulas de guias especializados sobre a história de Londres. Complementando a experiência, haverá um skybar e restaurantes com vistas de 360 graus da cidade".

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Para o fundador e presidente-executivo da Foster + Partners, Norman Foster, o Tulip será um "marco cultural e social" para a cidade. A torre de observação competiria com atrações similares pagas no centro da cidade, como a roda-gigante London Eye (Olho de Londres) e o The Shard (O Caco), um prédio de estilo moderno, de 2012, em forma de pirâmide e cuja extremidade mais elevada parece não ter sido terminada de construir. O Shard fica próximo (em Southwark, do outro lado do Tâmisa), mas não está no centro financeiro de Londres, e seus 310 metros continuarão a dar a ele o status do prédio mais alto não apenas do Reino Unido, mas da União Europeia.

O banqueiro Joseph Safra. Foto: Paulo Giandalia/Estadão - 24/11/2011

A promessa, no entanto, era a de que a plataforma de observação mais alta da cidade ficasse no Tulip, já que a do Shard está a 244 metros de altura. Foster afirmou na época do lançamento do projeto que o prédio estava "no espírito de Londres como uma cidade progressista e com visão de futuro". 

"A elegância e a força suave do Tulip complementam o icônico Gherkin", argumentou Jacob J. Safra, da Bury Street Properties, na época do lançamento do projeto.

Para a prefeitura de Londres, porém, os benefícios públicos do projeto são limitados e não compensariam o dano à região. “As propostas são consideradas como resultando em um ambiente de pedestres de baixa qualidade, hostil e desnecessariamente confinado e forneceriam estacionamento inadequado para bicicletas." Mesmo depois que o prefeito deu um basta ao projeto, o banqueiro não desistiu e estava tentando ressuscitá-lo por meio de uma apelação à Inspetoria de Planejamento do Reino Unido. A decisão final deve caber ao secretário de Estado de Habitação do governo local, Robert Jenrick.