Em junho deste ano, Marcelo Machado Fonseca Filho, 25, arrumou as malas e partiu para Cidade do Cabo, na África do Sul. Advogado e morador do Rio de Janeiro, ele dividiu as férias em duas partes: ficou duas semanas fazendo trabalho voluntário e mais uns dias passeando a turismo. “Aos 24 anos, percebi que havia passado os últimos anos focado em melhorar a minha vida pelo lado acadêmico e profissional, mas sem tempo para melhorar qualquer vida à minha volta. Foi um momento em que senti que precisava resgatar meu lado humano e contribuir, de qualquer forma que fosse, para um mundo melhor”, diz Marcelo sobre o porquê de ter aproveitado suas férias para voluntariar.
Do outro lado do Atlântico, ele ajudou professoras em uma creche comunitária e ensinou inglês para crianças, além de passar as tardes entretendo a meninada. O brasileiro teve, ainda, a iniciativa de sugerir um projeto de sustentabilidade na creche comunitária em que atuou, para que as crianças aprendessem sobre coleta seletiva e a importância de reduzir, reutilizar e reciclar. “Fizemos gincanas lúdicas, mostramos alguns vídeos, engajamos a escola a promover o pensamento sustentável e deixamos um pouco de nós por lá”, conta.
Marcelo Machado, advogado
Foi uma das melhores experiências de sua vida. “Conheci pessoas e lugares incríveis, cresci como ser humano. O mais legal foi que fui para a África achando que eu iria transformar um pouquinho lá, mas no fim das contas eu que voltei transformado. Hoje, sou uma pessoa um pouco mais completa. Penso agora em colocar o voluntariado como parte da minha vida e, inclusive, já me inscrevi em um outro projeto no Rio de Janeiro.”
Jovens engajados
A viagem de Marcelo para a África do Sul reflete uma tendência entre os jovens da Geração Z (pessoas com idade entre 16 e 24 anos). Uma pesquisa recente feita pela Booking.com com mais de 21 mil pessoas mostrou que quase metade dos jovens brasileiros entrevistados (48%) deseja fazer trabalho voluntário nas férias, porcentagem que fica acima da média global (37%) e posiciona os jovens do País como a sexta nacionalidade mais engajada nesse sentido. De acordo com o levantamento, para seis em cada dez (64%) jovens brasileiros da Geração Z, o voluntariado deixa a experiência de viagem mais autêntica, já que há a oportunidade de conhecer os moradores locais e sentir que fizeram a diferença para essas pessoas.
Para o consultor de carreira, escritor e palestrante especialista em conflitos de gerações Sidnei Oliveira, a crescente exigência das empresas e dos recrutadores por alguma “experiência efetiva”, além da formação acadêmica, contribui muito para esse movimento dos jovens. “Mesmo não sendo um trabalho remunerado, a vivência em atividades voluntárias agrega muita maturidade ao jovem”, diz ele. “Além disso, há uma nova consciência social que incentiva o indivíduo a incluir em suas qualificações atividades de caráter mais solidário e humanitário.”
Na opinião do consultor, o principal ganho do trabalho voluntário é a maturidade, que é acelerada quando o jovem amplia sua percepção para outras realidades diferentes da que vive e tem um entendimento das consequências das escolhas que faz. “As organizações já perceberam que isso melhora a qualidade de valores, principalmente de ética e diversidade, de seus profissionais e muitas empresas têm suas próprias iniciativas de engajamento de suas equipes em trabalhos voluntários”, diz o especialista. “Já é reconhecido como um diferencial significativo o profissional que, além das atividades e formações em seu currículo, também exerce atividades sociais voluntárias.”
Experiência transformadora
Estudante de Psicologia e Artes Visuais na Universidade da Califórnia em Santa Barbara (UCSB), nos Estados Unidos, Luiza Rosa, 20, encontrou em uma viagem de voluntariado a oportunidade de unir suas duas áreas de estudo. Ela conta que recebeu um e-mail do departamento de artes visuais da universidade apresentando um projeto de arteterapia a ser feito em Nairóbi, capital do Quênia. Ao interagir com crianças e mulheres em situações difíceis, ela usaria a arte para criar ambientes seguros que possibilitassem experiências de cura. “Vi que o voluntariado traria essa conexão perfeita, de usar a arte como comunicação entre as pessoas. Era perfeito para mim”, diz a jovem, que nasceu no Rio de Janeiro.
Chegando em Nairóbi, Luiza se deparou com a barreira do idioma, pois as pessoas não falavam inglês. “Eu também não falava a língua deles e a arte serviu como meio de comunicação”,diz Luiza, que visitou mulheres com Aids em uma prisão local. “Com as crianças a gente se comunica com jogos e brincadeiras, mas com as mulheres adultas, enfrentando uma realidade muito fora da minha experiência, foi muito difícil criar um espaço em que elas se sentissem seguras.”
Luiza Rosa, estudante
A experiência marcou. “Pude ver o quão difícil é a realidade daquelas pessoas. Nunca pensei que alguém pudesse viver naquelas condições”, lembra. Ao mesmo tempo, o carinho dos pequenos surpreendeu a jovem. “As crianças recebiam a gente de braços abertos, correndo, com uma felicidade.”
Clara Freitas Passos, 17, estudante do ensino médio, também aproveitou suas férias para se dedicar ao trabalho voluntário. Baiana, ela hoje vive na zona sul da capital paulista e escolheu Pernambuco para voluntariar. Lá trabalhou com o empoderamento de mulheres pescadoras de Recife, com o objetivo de levar informações e combater a violência doméstica, e com a capacitação de professores do sertão pernambucano, trabalhando temas como autoestima, respeito, preconceito e igualdade social.
Clara Freitas, estudante
A motivação para fazer voluntariado veio da consciência de Clara. “Sei que estou em uma situação privilegiada porque tenho a melhor educação possível do país, e muita gente não tem essa oportunidade. Não posso ficar parada frente a isso. Sinto que preciso repassar para outras pessoas o conteúdo que eu tenho a oportunidade de ter”, diz. A jovem se sente grata pela experiência que viveu no Nordeste brasileiro em julho deste ano. “Foi um trabalho muito bonito, que me transformou”, resume.