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Leilão da Cedae pode ajudar o Rio a dar a volta por cima, ao menos no saneamento; leia análise

Os desafios não são pequenos para as novas concessionárias de água e esgoto do Estado, mas os benefícios esperados à saúde, equidade, meio ambiente e economia são enormes 

Por Marcos Thadeu Abicalil
Atualização:

“Morar em Nova Iorque é bom, mas é uma m*; morar no Rio é uma m*, mas é bom!”. 

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Essa famosa frase atribuída a Tom Jobim tem uma relação direta com os objetivos desta sexta-feira, 30, do leilão de quatro lotes de concessão dos serviços de distribuição de água e coleta e tratamento de esgotos no Estado do Rio de Janeiro, incluindo a capital, a área metropolitana e diversas cidades do interior. Busca-se tornar o Rio de Janeiro melhor, enfatizar o bom e reduzir a m* da percepção do grande maestro carioca.

Os desafios dos serviços de água e esgotos no Rio são enormes, desproporcionais aos níveis de renda e desenvolvimento do Estado, que apresenta os piores indicadores entre seus pares da Região Sudeste do País. As três concessões que saem desse leilão buscam enfrentar esses desafios da universalização e melhoria dos serviços. Resta ainda a solução para o bloco 3, que compreende bairros como Barra da Tijuca e o sul do Estado. 

Unidade de tratamento Guandu, da Cedae, em Nova Iguaçu. Foto: André Coelho/EFE

A Cedae remanescente também fará parte desse esforço, pois continuará responsável pela oferta de água tratada no atacado na região metropolitana, especialmente pela operação do sistema Guandu, respondendo, assim pela segurança e qualidade da água tratada entregue aos novos concessionários.

O modelo proposto tem características importantes: separação vertical entre produção de água tratada, que permanecerá estatal com a Cedae, e sua distribuição (como em Portugal, serviços chamados de alta e baixa), junto com coleta de esgotos. Estas serão separadas também horizontalmente, em quatro grandes lotes por distintos territórios da região metropolitana e do interior do Estado, mas todos eles incluindo partes da cidade do Rio de Janeiro. Isso decorre da concentração das receitas na capital e na necessidade de conferir maior equidade social no acesso futuro aos serviços, hoje com grandes desigualdades, assim como a viabilidade de todos os quatro lotes. Ademais, esse modelo induz à eficiência, por exemplo, na redução das perdas. 

O esforço de financiamento dos investimentos é muito grande, em volume muito superior ao histórico de realização da Cedae, especialmente nos anos iniciais da concessão, para que se cumpram as metas de cobertura previstas. Destaque, por exemplo, ao saneamento das áreas situadas a montante do sistema Guandu, para aumentar a segurança hídrica e qualidade da água a ser tratada pela Cedae. 

Ainda há que se pagar uma outorga elevada, distribuída entre os lotes de forma proporcional à análise econômica de cada um. Os futuros concessionários terão um grande esforço de financiamento à frente, que exigirão operações de mercado e financiamento de longo prazo, incluindo dos Bancos de Desenvolvimento, como o Novo Banco de Desenvolvimento do Brics (NDB).

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Embora o edital preveja uma longa e detalhada matriz de distribuição de riscos, o sucesso desse empreendimento dependerá também de atuação regulatória da Agenersa. A agência reguladora estadual encarregada da regulação dos serviços vai precisar de grande capacidade técnica e de governança.

A nível nacional, olhando-se o mercado, observa-se que não houve o ingresso de investidores estrangeiros. Os participantes nacionais são praticamente os mesmos que disputaram o leilão da região metropolitana de Maceió. Isso indica que o setor privado em saneamento não apenas se consolida, com as atuais grandes empresas crescendo seus mercados. Isso evidencia os ganhos de escala do setor, mas, por outro lado, cria uma preocupação de longo prazo, caso o mercado privado no setor continue a se concentrar.

Os desafios não são pequenos. Riscos existem, mas sem dúvida, superam em muito a inércia de não fazer nada e deixar milhões de fluminenses sem serviços adequados como ocorre hoje, especialmente nas regiões mais pobres do Estado. Os benefícios esperados à saúde, equidade, meio ambiente e economia são enormes e podem ajudar o Rio a dar a volta por cima, ao menos no saneamento básico.

*EXECUTIVO SÊNIOR DO NDB

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