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Licença para gastar não é para sempre

Voltar a crescer e evitar riscos indesejáveis demandarão um programa consistente de consolidação fiscal

Por Felipe Scudeler Salto
Atualização:

A covid-19 pegou o Brasil de calças curtas. Dívida e déficit públicos elevados e em trajetória de alta para 2020. Já a economia ensaiava uma parca recuperação. A crise sanitária exacerbou esses problemas estruturais. A licença para gastar obtida não é para sempre. Voltar a crescer e evitar riscos indesejáveis demandarão um programa consistente de consolidação fiscal.

O indicador dívida/PIB encerrou 2019 em 75,8% e deverá subir a 96,1% até o fim do ano, de acordo com a Instituição Fiscal Independente (IFI). De um lado, o déficit primário (sem contar despesas de juros) do governo central deve atingir 12,7% do PIB. De outro, o PIB, em 2020, deverá diminuir 6,5%.

Felipe Scudeler Salto é diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado. Foto: Dida Sampaio/Estadão

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O déficit é gerado pela insuficiência de receitas para saldar todas as despesas previstas. Neste ano, as receitas serão menores, em razão da recessão, e as despesas serão atipicamente mais elevadas, em razão da necessária atuação do Estado contra a covid-19.

Nas projeções da IFI, as receitas líquidas do governo central vão diminuir R$ 260 bilhões em 2020. Já as despesas vão aumentar R$ 523 bilhões. Se não há receitas para pagar todas as despesas realizadas, é preciso tomar dinheiro do mercado, emitindo títulos e pagando juros. No mundo todo, a toada é a mesma: o déficit alimenta a dívida.

O governo vem emitindo títulos com relativo sucesso, ainda que a dívida tenda a ficar mais curta e mais indexada à Selic. O sinal vermelho se acenderá se todo o gasto contratado para este ano, plenamente justificável, transbordar para o após crise. Se novas despesas permanentes forem criadas sem indicação de fonte para financiá-las, o jogo virará rapidamente.

Este é o risco a ser evitado. Mas o País precisa ir além disso e voltar a crescer. Para tanto, é necessário ter um plano fiscal de médio prazo, como vem defendendo o economista Armínio Fraga. Uma estratégia que contemple cortes permanentes de gastos ineficientes e eventual alta de tributos. Esse trabalho tem de começar agora, enquanto ainda está vigente a licença para gastar concedida pela crise.

*DIRETOR EXECUTIVO DA IFI, ORGANIZOU O LIVRO ‘CONTAS PÚBLICAS NO BRASIL’ (2020, ED. SARAIVA)

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