Limite para pagamento de precatórios passa por acordo com os Estados

Intenção é evitar a formação de uma "bola de neve" para o futuro com o adiamento de parte da fatura de R$ 89,1 bilhões e, ao mesmo tempo, contribuir para uma saída do impasse sem mexer na Constituição

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Por Idiana Tomazelli e Adriana Fernandes
4 min de leitura

BRASÍLIA - Costurada nos últimos dias por integrantes dos três Poderes, a solução alternativa de criar um limite para o pagamento de precatórios a partir de 2022 deve envolver a negociação de um acordo direto com os Estados para o pagamento de R$ 15,6 bilhões devidos pela União, conforme apurou o Estadão/Broadcast. A intenção é evitar a formação de uma "bola de neve" para o futuro com o adiamento de parte da fatura de R$ 89,1 bilhões e, ao mesmo tempo, contribuir para uma saída do impasse sem necessidade de mexer na Constituição.

O acerto com os governos estaduais ajudaria a tirar esses precatórios da fila de pagamentos sujeitos ao novo limite de pagamento. Um volume menor de dívidas seria rolada para anos seguintes. A despesa com o acordo, no entanto, continuaria sujeita ao teto de gastos, regra que limita o avanço das despesas à inflação e é considerada hoje a principal âncora fiscal do governo. 

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Praça dos Três Poderes, em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão - 15/4/2016

A criação de um subteto para precatórios está sendo discutida entre integrantes dos três Poderes e seria formalizada em resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Essa via foi pensada após a proposta de emenda à Constituição (PEC) apresentada pela equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, para parcelar essas dívidas em dez anos receber uma enxurrada de críticas e ampliar os temores do mercado financeiro em relação ao equilíbrio das finanças públicas.

Além do parcelamento, a PEC cria um fundo para antecipar a quitação das prestações usando receitas extras, sem que esse gasto fique dentro do teto de gastos. A criação do fundo foi interpretada como uma “porteira aberta” para investidas contra o teto de gastos, o que contribuiu para o nervosismo do mercado e impulsionou a alta do dólar e dos juros.

Nos bastidores, a PEC é considerada uma "aventura" num momento já contaminado pelas eleições de 2022, pois significa a deixa perfeita para o Congresso Nacional aprovar uma série de "puxadinhos" no teto e ampliar gastos. Até mesmo integrantes da equipe econômica admitem que demandaria "esforço" barrar as pressões por dribles ao teto. Há também preocupação com o custo político da aprovação dessa proposta no Congresso.

O ministro Paulo Guedes tem sido aconselhado a retirar a PEC e investir apenas na solução que está sendo costurada com o Judiciário, o Legislativo e o Tribunal de Contas da União (TCU).

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Negociação

Pela resolução do CNJ, o teto para precatórios seria o valor pago em 2016 (R$ 30,3 bilhões) corrigido pela inflação apurada até agora. A conta resultaria em um limite de R$ 40 bilhões para 2022, adiando outros R$ 49 bilhões para os anos seguintes.

O problema é que o limite de R$ 40 bilhões é um gasto menor do que o governo já vem tendo com os precatórios, cuja despesa hoje está na casa dos R$ 55 bilhões. A própria previsão da equipe econômica para 2022, antes do "meteoro", era de R$ 57 bilhões. A solução via CNJ resultaria em maior espaço fiscal, de cerca de R$ 17 bilhões, para o presidente Jair Bolsonaro gastar em ano eleitoral. Além disso, o governo mais adiaria do que pagaria dívidas.

Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a saída em discussão busca "equilibrar" o valor dos precatórios em 2022 em um patamar equivalente ao que já é pago hoje (na casa dos R$ 55 bilhões), dado que o limite ficou menor que o esperado. E isso passa pelo acordo com os Estados.

Os governos de Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas têm, juntos, R$ 15,6 bilhões a receber em 2022 após ganharem uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) que questionava valores do Fundef, o fundo para o desenvolvimento do ensino fundamental e valorização do magistério que vigorou até 2006. Desse valor, cerca de R$ 7 bilhões podem ser abatidos por meio de um "encontro de contas", isto é, compensação com dívidas que esses Estados têm com a União.

Outros R$ 8 bilhões seriam pagos em prestações conforme o acordado entre as partes, e essa despesa ficaria fora do teto de precatórios, mas dentro do teto de gastos. Acerto semelhante já foi feito na disputa em torno da Lei Kandir, que desonerava exportações de ICMS, principal tributo estadual.

A Advocacia-Geral da União (AGU) já ingressou com pedido de abertura de conciliação para os valores do Fundef, mas ainda não houve decisão do presidente do STF, Luiz Fux. Para o início das negociações, os envolvidos querem uma sinalização de Guedes de que haverá esforço pelo acordo.

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Segundo uma fonte envolvida nas discussões, a questão é "calibrar" as medidas para que não haja o crescimento de uma "bola de neve". A negociação do acordo com os Estados também ajudaria a angariar maior apoio à solução via resolução do CNJ dentro do próprio Supremo.

Apesar de a nova saída para os precatórios ter encontrado apoio na equipe econômica e na cúpula do Congresso Nacional, o mercado segue demonstrando ceticismo e vê no adiamento das dívidas judiciais uma espécie de "calote". Articuladores da proposta, porém, ressaltam que o subteto para os precatórios não é uma regra definitiva e valerá apenas durante a vigência do teto - até 2036, com possibilidade de mudança na regra de correção em 2026.

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