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IR: Lira fracassa, e reforma é adiada na Câmara; para ala da Economia, projeto 'já não se paga'

Presidente da Câmara queria votar o texto principal da reforma nesta terça-feira, 17, e deixar os destaques – pedidos de alteração ao texto – para depois

Foto do author Adriana Fernandes
Por Camila Turtelli , Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli
Atualização:

BRASÍLIA Pela terceira vez, a reforma do Imposto de Renda foi retirada do debate do plenário da Câmara, após mobilização de líderes do centro, oposição e até do governo preocupados com o impacto do texto do deputado Celso Sabino (PSDB-PA) para Estados e municípios. Um pedido de retirada de pauta foi aprovado pelo placar de 399 votos a favor e 99 contra.

Arthur Lir, presidente da Câmara, e Paulo Guedes, ministro da Economia de Jair Bolsonaro Foto: Gabriela Biló/Estadão

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“Na dúvida, se há ou não perda para os municípios, nós vamos concordar com a fala do deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) e a oposição que pediram mais tempo para estudar o texto”, disse o líder do governo Ricardo Barros (PP-PR).

O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), voltou a dizer que é impossível se chegar a um consenso sobre o tema e que queria votar o texto principal da reforma nesta terça-feira, 17, e deixar os destaques – pedidos de alteração ao texto – para depois. “Não há interesse em causar prejuízos para Estados e municípios”, afirmou Lira. “Consenso sobre esse tema nesse plenário é impossível. Precisamos separar o que é política do que é justo para o Brasil”.

As concessões sinalizadas pelo governo para destravar a votação do projeto do Imposto de Renda estão saindo caro na avaliação de integrantes da ala mais fiscalista do Ministério da Economia. Nas palavras de um integrante da equipe, "a reforma já não se paga há muito tempo". Outra fonte chega a celebrar a "disputa" por benesses porque, em meio à briga, nada é votado e tudo fica como está hoje, sem maiores catástrofes para as contas da União.

Esse é o clima nos bastidores da pasta após uma série de acordos para tentar atenuar a oposição de empresas e, mais recentemente, angariar apoio de municípios ao projeto. Como mostrou o Estadão/Broadcast, o presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, diz ter acertado com a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, a ampliação dos repasses às prefeituras em R$ 6,5 bilhões ao ano em troca do apoio da entidade à proposta do IR.

A notícia do acerto com as prefeituras deflagrou uma corrida entre os Estados, que dobraram a aposta e agora querem também emplacar um aumento do Fundo de Participação dos Estados (FPE), drenando mais receitas da União, caso não haja mudanças no relatório do Imposto de Renda para conter as perdas aos cofres estaduais. A fatura adicional com FPE pode ir a R$ 11,28 bilhões.

O andar das negociações expõe mais uma vez a existência de dois grupos dentro do Ministério da Economia, um formado por técnicos fiéis às regras e à estabilidade fiscal e outro disposto a fazer concessões em prol da negociação política.

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Essa divisão já havia sido evidenciada nas articulações para a votação do Orçamento de 2021, quando a equipe de Guedes emitiu sinais de que era possível acomodar até R$ 16,5 bilhões em emendas parlamentares com cortes em outras despesas, inclusive obrigatórias. A negociação degringolou para a maquiagem de gastos e emendas de congressistas turbinadas a R$ 31,3 bilhões, posteriormente reduzidas com um veto parcial do presidente Jair Bolsonaro.

Segundo apurou o Estadão/Broadcast, as negociações com o Congresso têm sido conduzidas pelo gabinete do ministro Paulo Guedes e seus auxiliares mais próximos. As demais áreas, por sua vez, fazem a conta da fatura - e acham caro, muitas vezes "caríssimo".

De acordo com uma fonte, os acertos com os municípios são fiscalmente danosos à União, potencializados por eventual investida semelhante dos Estados. Outro técnico afirma que ceder nos fundos de participação de Estados e municípios é "péssimo". Por outro lado, esse interlocutor afirma que o ingresso dos governadores na disputa por recursos tem um lado "positivo", pois quanto mais gente brigando, "mais difícil aprovar".

O projeto do IR foi enviado ao Congresso como promessa de simplificação dos tributos, mas também em cumprimento a uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro: ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Se aprovado, o "alívio" no bolso dos contribuintes entra em vigor em 2022, ano eleitoral. Para compensar a perda de receitas, o texto também incluiu a tributação de dividendos distribuídos à pessoa física, medida que tem sido fortemente combatida por empresários e profissionais como advogados, médicos e outros que atuam como pessoa jurídica. A resistência já surtiu efeito e levou a flexibilizações no texto que podem deixar R$ 200 bilhões fora da mira da tributação, como mostrou o Estadão.

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Nos bastidores, o rumo das negociações do projeto do IR está sendo descrito como "várzea". Há quem compare com o observado no projeto de privatização da Eletrobras, aprovado repleto de "jabutis" (matérias estranhas ao texto), e na PEC emergencial, quando o governo precisou arcar com uma fatura de R$ 16,5 bilhões em emendas (originando o impasse do Orçamento de 2021) em troca da proposta que alterou regras fiscais.

Nessas votações, o que ficou evidente foi o alto preço que o governo do presidente Jair Bolsonaro tem precisado pagar para fazer avançar sua agenda no Congresso Nacional. Mesmo após ceder verbas e cargos nos mais variados escalões do governo para indicados do Centrão, o governo precisou negociar no varejo os votos de que precisa para suas propostas, abrindo mão de recursos ou se comprometendo com benesses futuras.

Em tempos de faturas salgadas apresentadas pelo Congresso Nacional para aprovar as medidas econômicas, o governo enviou uma PEC para permitir o parcelamento de dívidas judiciais (precatórios) e criar um fundo fora do teto de gastos (a regra que limita o avanço das despesas à inflação) para antecipar o pagamento dos débitos parcelados. Reservadamente, integrantes da equipe econômica reconhecem que será um esforço e tanto "segurar" as pressões para flexibilizar ainda mais o teto.

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