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Mais do mesmo é pouco

Um produto ou uma política tornam-se obsoletos quando não são mais adequados às circunstâncias existentes. Ocorre porque o desempenho fica aquém das alternativas. Em oposição, progresso é o processo de adaptação a um estado mais avançado.

Por Roberto Luis Troster
Atualização:

A obsolescência pode ter vários motivos, como mudanças na economia e novas tecnologias. Um exemplo emblemático é a bússola, a qual, na época de sua invenção, foi uma melhoria que possibilitou as grandes navegações, mas, depois do desenvolvimento do GPS – Sistema de Posicionamento Global, virou peça de museu.

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Dispositivos utilizando o novo mecanismo de localização possibilitaram ganhos científicos e comerciais. As empresas que se adaptaram ao avanço tecnológico progrediram, as que não, regrediram.

Algo semelhante ocorre com as políticas públicas que têm de se adequar a uma realidade em transformação. A não adaptação cobra seu preço com um desempenho do País aquém do potencial. O uso da biometria ilustra o ponto.

Avanços recentes permitem o reconhecimento rápido e preciso de pessoas pela voz, pela retina, pelas digitais, por desenho facial e pulso. Todavia, sua adoção no País está se tornando um ônus a mais.

A Justiça Eleitoral, o Detran, as polícias e alguns bancos estão adicionando aos seus bancos de dados as diferentes características físicas dos cidadãos, multiplicando as mesmas informações em diversos registros.

Uma alternativa mais moderna seria a implantação de um único cadastro nacional de pessoas com todos os dados biométricos e documentação – RG, CPF, PIS, título de eleitor e outros. Com um só número ou a aferição de uma característica física cada cidadão poderia ser reconhecido com segurança.

Com isso, o País teria um sistema de identificação confiável para toda a sociedade em suas atividades públicas e privadas, que poderia ser utilizado para certificações, prontuários médicos, controles de entrada, prevenção de fraudes e transações financeiras. Como não é feito, todos saem perdendo.

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Na economia, o País vive um momento favorável a mudanças, o equilíbrio com o setor externo é positivo, a inflação está arrefecendo, está havendo reposição de estoques, há capacidade ociosa e empresários e trabalhadores estão dispostos a produzir.

Alguns anúncios são positivos e terão efeitos benéficos. No entanto, o governo está adotando um gradualismo e um conservadorismo que são incompatíveis com as ambições da sociedade e o potencial do País. Algumas sugestões são pertinentes, há mais.

A condução econômica está investindo energias na proposta de emenda constitucional (PEC) de teto dos gastos, que limita o crescimento dos gastos públicos à inflação do ano anterior. Como está em queda, permite um crescimento real das despesas do governo no ano que vem.

No futuro, se a inflação crescer muito ou se o Produto Interno Bruto (PIB) acelerar, a PEC vai ter de ser alterada. Desde a época do Império, ditam-se normas para controlar gastos que são revistas, quando as circunstâncias obrigam. A proposta pode ser aprimorada com duas medidas adicionais, uma para reduzir a despesa, outra para aumentar a receita e a justiça social e, em conjunto, acelerar o processo de retomada.

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A primeira é controlar o inchaço estatal. Hoje o rendimento médio dos funcionários públicos é 78,5% maior que os do privado e está aumentando, enquanto os empregos e os rendimentos dos que não trabalham para o governo estão encolhendo.

Seria incluída na PEC uma cláusula que limitaria a expansão da folha do setor público à metade do crescimento dos vencimentos do setor privado, até que a remuneração média dos dois lados seja a mesma. Valeria tanto para os funcionários da ativa como para os inativos e aposentados.

Outra medida seria um ajuste nas alíquotas dos impostos da intermediação financeira, com sua eliminação nas operações ativas e um aumento sobre as aplicações. Atualmente, a maioria de quem vive de juros paga proporcionalmente menos impostos do que quem só tem o rendimento do trabalho. Haveriam ganhos polpudos para o Fisco, o barateamento do crédito e mais justiça social.

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O governo está anunciando incentivos no mercado de crédito, como o uso do FGTS como garantia e linhas de crédito específicas. É mais do mesmo. Falhou em 2012 e vai falhar agora, é uma questão de tempo. O problema no setor financeiro é a disfuncionalidade da oferta de recursos.

Os números do Banco Central são categóricos neste ponto. Nos últimos 12 meses, enquanto o custo de captação dos bancos subiu 0,1% (13% a.a.), o custo do crédito pessoal não consignado aumentou 17,9% (129,9% a.a.), o cheque especial, 79,3% (311,3% a.a.) e o rotativo do cartão 111% (471,3% a.a.), aumentou mais de mil vezes do que a alta do funding!

Mesmo assim a rentabilidade do sistema caiu. O aumento da inadimplência, que bateu recordes históricos, corroeu os ganhos dos aumentos de margens dos bancos e um pouco mais. Urge atualizar a política bancária. Alguns países, após a crise de crédito, conseguiram se recuperar rapidamente fazendo os ajustes adequados, outros prolongaram a agonia.

O ponto do artigo é que a obsolescência das políticas adotadas no Brasil faz com que o País limite sua capacidade de desenvolvimento. Em todos os governos desde o fim da ditadura – Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula e Dilma, o Brasil cresceu menos que o resto do mundo.

Em 1985, o País tinha 4% do PIB mundial e, atualmente, sua participação é de 2,6%. Note-se que, enquanto a do Brasil encolheu, outros expandiram suas economias mais do que a média. Não é por falta de ginga daqui.

O brasileiro não tem rivais em criatividade, capacidade de adaptação e adequações a situações difíceis. Mas utiliza muito pouco esses atributos para promover o desenvolvimento do País. O País cresce, apesar da política econômica, mas poderia crescer mais graças a ela. Acelera Brasil!

É CONSULTOR E PALESTRANTE, FOI ECONOMISTA-CHEFE DA FEBRABAN E PROFESSOR DA USP E DA PUC-SP; CORREIO ELETRÔNICO: ROBERTOTROSTER@UOL.COM.BR

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