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Mais uma greve no INSS

Por José Pastore
Atualização:

As paralisações do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tornaram-se recorrentes. Há dois anos, o instituto parou por 74 dias, deixando à míngua pessoas idosas, gestantes, portadores de deficiência e adultos em geral que precisavam de exames médicos, licenças, aposentadorias e pensões. A greve deflagrada na semana passada é por prazo indeterminado. Sabe-se lá quando acabará. Os dirigentes do sindicato da categoria nem ligaram para a multa de R$ 100 mil por dia imposta em liminar do Superior Tribunal de Justiça, que reconheceu o movimento como ilegal à luz dos fatos. O INSS demonstrou que o acordo coletivo assinado com o sindicato prevê que, havendo a redução de jornada, haverá redução proporcional de salário. Pois bem. A jornada que vem sendo praticada é de 30 horas semanais, mas os servidores querem ganhar 40. Está aí o impasse. As multas, que funcionam bem em toda parte do mundo, no Brasil foram desmoralizadas. O perdão é a regra. Já houve até lei anistiando petroleiros que foram multados pelo Tribunal Superior do Trabalho por terem provocado no País um grave desabastecimento de gasolina e óleo diesel. Em São Paulo, o Ministério Público estipulou uma multa aos metroviários que causaram um congestionamento colossal na cidade. Nunca foi paga. Não se pode obrigar as pessoas a trabalhar contra a sua vontade. Mas quem entra no serviço público sabe que as greves nesse setor têm de ser mais disciplinadas, porque são muitas as atividades chamadas essenciais e que não podem parar. Como permitir a paralisação de uma usina de energia elétrica que serve hospitais que não têm geradores próprios? O que acontece com quem está na UTI ou na mesa de cirurgia? Como postergar sine die o atendimento de uma gestante que vai dar à luz em poucas horas? A greve é um direito. Mas é inadmissível que os funcionários do INSS entrem em greve sem a manutenção de serviços mínimos e outros requisitos estabelecidos pela Lei nº 7.783/89, que o Supremo Tribunal Federal disse se aplicar a eles enquanto a lei específica (prevista no artigo 37 da Constituição federal) não for aprovada. Aí está a questão central. O governo federal não quer aprovar regras específicas para a greve dos servidores públicos. O presidente Lula prometeu tratar do assunto no início do seu primeiro mandato. Até hoje, nada. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, tentou um encaminhamento do assunto. As centrais sindicais rejeitaram. E ficou nisso mesmo, pondo a saúde e a segurança da população em segundo plano. Esse assunto virou um jogo de empurra. As centrais sindicais querem que o Brasil ratifique a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que garante o legítimo direito de negociação coletiva no setor público. O governo não ratifica nem aprova as regras da greve. Enquanto isso os servidores fazem o que bem entendem. Já fizeram greve em pronto-socorro e em delegacia de polícia! O que falta acontecer? Essa inércia do governo é imperdoável. A ele devem ser atribuídos os prejuízos dos que sofrem com as paralisações do INSS, da saúde, da Polícia, da Receita Federal e tantas outras. Não se pode aceitar que o governo empurre esse assunto com a barriga, muitas vezes pagando os dias parados e fazendo vista grossa para o cancelamento das multas. É negligência ou conivência? Oxalá seja esta a oportunidade para as autoridades definirem, de uma vez por todas, as benditas regras para o exercício da greve no setor público, apresentando respostas para as seguintes perguntas: 1) Quem vai assumir a responsabilidade da greve e quem vai pagar a multa - o sindicato ou os servidores?; 2) qual será o quórum mínimo para se deflagrar uma greve?; 3) isso será feito pelo voto secreto ou na base do grito?; 4) quem vai se responsabilizar pela manutenção dos serviços mínimos?; e 5) o que será feito quando os mínimos não forem respeitados? O Brasil não pode continuar com o vácuo existente. Os servidores têm todo o direito de apresentar seus pleitos e até mesmo de paralisar serviços, mas não podem pôr em risco os cidadãos que os sustentam. No caso em tela, é bom lembrar que a Previdência Social é um órgão de proteção social, e não de desproteção. Os atingidos por essa greve são exatamente os mais vulneráveis. Não se pode fechar os olhos a esse descalabro. *José Pastore é professor de relações do trabalho da Universidade de São Paulo Site: www.josepastore.com.br

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