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Matriz de bolhas

Por celso.ming@grupoestado.com.br
Atualização:

Quando derrubou os juros em meio ponto porcentual para evitar que os estragos do estouro da bolha imobiliária atirassem a economia na recessão, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) provocou um efeito colateral: reforçou as condições para que novas bolhas se formassem. Os analistas agora se perguntam qual será a próxima. Será a das commodities? A das bolsas dos países emergentes? Quem sabe, a do ouro? Os críticos há meses apontavam para as anomalias que favoreceram o surgimento de bolhas. A mais importante foi a política monetária generosa desenvolvida pelo Fed entre 2002 e 2006. Os juros mantiveram-se baixos não só para evitar os problemas com o estouro da bolha anterior (a da internet), mas também para manter o emprego em expansão. Foi um tempo em que nem o Fed nem os bancos centrais dos países ricos tiveram problemas com a inflação, graças a duas novidades históricas: o uso de Tecnologia da Informação, que reduziu fortemente os custos de produção no mundo todo; e o efeito China, que, em última análise, é a enorme oferta de produtos industrializados a uma fração dos preços dos similares do resto do mundo, que foi possível com a incorporação de mão-de-obra asiática. Há quem discorde de que a inflação tenha ficado baixa, preferindo dizer que a inflação está sendo mal medida. O economista-chefe do Bank for International Settlements (BIS), William White, afirma que os índices de custo de vida (preços no varejo), tal como levantados nas principais economias, já não servem para aferir a inflação porque deixam de fora itens importantes do orçamento das classes médias dos países ricos: imóveis, ações, títulos, ouro, commodities. Quando levarem isso em conta, os bancos centrais saberão que estão diante de muito mais inflação a combater. Enfim, estamos falando de um elemento que é causa e efeito das bolhas. A política monetária frouxa provocou sobra de recursos (liquidez excessiva) que se atirou às aplicações financeiras, o que elevou os preços dos ativos. Além desses fatores, contribui para o surgimento das bolhas a nova política leniente dos bancos centrais, que, a cada crise, despejam ainda mais dinheiro nos mercados, seja por meio da baixa dos juros, seja pela injeção direta nos focos de crise. Há dez dias, o presidente do Banco da Inglaterra (banco central inglês), o durão Mervyn King, amoleceu de uma vez seu coração diante da corrida a uma instituição de crédito imobiliário, a Northern Rock, e garantiu todos os depósitos. Decisões assim concorrem para disseminar a percepção de que não há preço a pagar por participar da farra dos mercados, porque, na hora da crise, pelas razões já conhecidas, os bancos centrais provêm a droga salvadora. O atual presidente do Fed, Ben Bernanke, também começa a ser cobrado pela largueza na distribuição de anabolizantes que ajudam a estancar a crise, mas, ao mesmo tempo, lançam as bases para a seguinte.

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