O ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e atual vice-presidente do Insper, Marcos Lisboa, afirmou que todas as medidas legislativas aprovadas desde as eleições foram na contramão do ajuste fiscal prometido pela presidente Dilma Rousseff para o seu segundo mandato, entre eles, a mudança do indexador da dívida dos estados. "Decisões que agravam o quadro fiscal", afirmou durante debate de encerramento da série Fóruns Estadão Brasil 2018.
Em sua fala, Lisboa criticou a forma como são feito os cálculos do superávit primário. Segundo ele, sem os abatimentos, o "número de verdade" do resultado fiscal deve estar entre -0,5% do PIB, o equivalente a cerca de R$ 25 bilhões de déficit. Diante disso, ele afirmou que, para equilibrar a dívida pública, o Brasil precisaria de um superávit de 2,5% do PIB, aproximadamente R$ 150 bilhões. "A equipe econômica consegue, no máximo, com muito esforço, ajustar R$ 20 bilhões", ponderou.
O vice-presidente do Insper afirmou que, para implantar um ajuste fiscal, é necessário uma "agenda clara" com os problemas reais que vão ser encontrados e o que o governo pretende fazer, além de enfrentar o debate. "Ou vai isso ou não vai ser feito ajuste", disse. O economista acrescentou que é necessário ainda uma agenda maior, "e mais difícil do que a fiscal", que envolve a melhora das condições de negócio e retomada de financiamento, a chamada por alguns economistas de "agenda microeconômica".
Segundo Lisboa, nos últimos anos, "vivemos a política de contrarreforma", com concessão de subsídios, crédito subsidiado, que privilegiou apenas alguns setores. "Isso foi na contramão da agenda de crescimento", criticou. O economista ponderou que essa "não é uma agenda fácil", porque se defronta com vários grupos de interesse.
Médio prazo. A implantação de um ajuste fiscal claro, detalhado, crível e tido como agenda de governo pode trazer efeitos no médio prazo que podem surpreender, afirmou Lisboa. O ex-secretário defendeu que é necessário um anúncio claro do que vai ser feito, com medidas explicadas detalhadamente. Segundo ele, isso pode ter um efeito contrativo no "curtíssimo prazo", mas no médio e longo prazo vão ser muito bons para o crescimento do País.
Lisboa defendeu que o ajuste deve se tornar uma agenda de governo e não apenas do Ministério da Fazenda. Além disso, pregou ainda a necessidade de acabar com a contabilização de abatimentos e receitas extraordinárias no cálculo do resultado fiscal. Caso contrário, afirmou, o ajuste está "fadado ao fracasso".
"Um ajuste a meia boca, com medidas incompletas e anúncios sem respaldo de evidência e clareza dos impactos pode ser mais contracionista e agravar o desafio do crescimento", afirmou o vice-presidente do Insper, lembrando que o Brasil já fez ajustes duros em 1999 e 2003.
Também presente ao debate, o economista Samuel Pessoa, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), acrescentou que, se o governo fizer um ajuste crível e claro, haverá espaço para reduzir a taxa básica de juros (Selic) e para trazer a inflação à meta.
Pessoa avaliou que a mudança de política econômica na gestão da presidente Dilma Rousseff sinalizada com a escolha de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda "é para valer". Ele ponderou, no entanto, que a implantação de fato dessas mudanças dependerá, nos próximos dois anos, da capacidade dos operadores políticos de construírem consenso para aprovar as mudanças necessárias.