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Meio ambiente entra na disputa por verba

Tecnologias ambientalmentesustentáveis demandam maisinvestimento; mas cenáriofuturo é de menos dinheiroe crédito para investir

Por Tania Rabello , FELIPPE SERIGATI e ROBERTA POSSAMAI
Atualização:

Não há necessariamente uma contradição entre aumento da produção agropecuária e preservação do meio ambiente. O sistema de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é um bom exemplo de como atender ao desejo da sociedade por maior oferta de alimentos produzidos de forma ambientalmente mais sustentável. Esse sistema consiste no cultivo consorciado de diferentes sistemas produtivos agrícolas, pecuários e florestais na mesma área. Entre as várias vantagens do sistema é possível destacar a diversificação da renda do produtor; a diminuição da emissão dos gases causadores do efeito estufa; a melhor fixação biológica do nitrogênio, e a recuperação de pastagens degradadas, entre outras. Contudo, apesar de todas essas vantagens, há um custo para o produtor migrar das tradicionais técnicas de plantio e criação para os sistemas de baixa emissão de carbono. Infelizmente, ainda são escassos os estudos que estimam com razoável precisão e para diferentes localidades qual é o custo dessa migração. Todavia, mesmo sem saber quais são exatamente esses custos, o fato é que o agronegócio brasileiro encontrará nos próximos anos uma conjuntura, tanto de mercado quanto de orçamento público, que reduzirá sua capacidade de absorver aumentos nos custos de produção. Margem estreita. Pelas condições de mercado, a margem de lucro do produtor deverá estar mais estreita, tanto pelo lado da receita, quanto do custo. Do lado da receita, de forma geral, os preços das commodities agrícolas têm caído desde os picos históricos registrados em 2011 ou 2012. Essa trajetória de queda está associada, do lado dos fundamentos, ao menor crescimento das economias emergentes e, do lado dos ativos financeiros, à perspectiva de elevação da taxa de juros dos Estados Unidos. Se, pelo lado da receita, a perspectiva para os produtores não é tão favorável como foi nos últimos anos, a situação também não será mais confortante pelo lado dos custos, pois a infraestrutura do País não vai melhorar no curto prazo, mesmo que os necessários investimentos comecem a ser feitos imediatamente. Além disso, o custo do frete deve subir por causa do aumento do preço do óleo diesel, que está desalinhado, tal qual o preço dos demais combustíveis derivados do petróleo, com especial destaque para a gasolina. E, também, a taxa de juros básica da economia brasileira (Selic) deverá retomar seu ciclo de alta em algum momento em 2015, o que elevará o custo de financiamento (do produtor) captado fora das linhas oficiais de crédito. Dado que os produtores terão uma margem mais estreita nos próximos anos, uma possível solução para incentivá-los a assumir o custo da migração para um pacote tecnológico ambientalmente mais sustentável seria contar com um suporte maior do setor público. Todavia, esta opção também estará mais complicada. Orçamento. Diferentemente dos últimos anos, o governo federal terá uma folga mais estreita no seu orçamento; enquanto, por um lado, a pressão por maiores gastos virá de vários setores econômicos e segmentos da sociedade. A arrecadação também não deverá se expandir no mesmo ritmo que nos anos anteriores. Na verdade, mesmo que não se aumente o valor repassado aos produtores, o custo das políticas agrícolas vai aumentar, dado que a elevação da taxa de juros, necessária para controlar a inflação, implicará maior gasto com a equalização do crédito agrícola (ou seja, aquele custo assumido pelo Tesouro Nacional ao ofertar um crédito a uma taxa de juros menor do que ele consegue captar no mercado). Há grande interesse entre os produtores em adotar tecnologias que, além de preservar o meio ambiente, também reduzam a volatilidade da sua renda. Todavia, a conjuntura esperada para os próximos anos será mais complicada e tornará essa migração mais desafiadora. Produtores, ambientalistas, autoridades públicas, imprensa, e qualquer outro agente interessado nesse tema, ao fazerem suas análises, devem ter claro que os anos de fartura já ficaram para trás. É prudente passar a considerar um cenário mais modesto.FELIPPE SERIGATI É DOUTOR EM ECONOMIA PELA ESCOLA DE ECONOMIA DE SÃO PAULO (EESP/FGV) E PROFESSOR E PESQUISADOR DO CENTRO DE AGRONEGÓCIOS DA FGV (GV AGRO); ROBERTA POSSAMAI É ECONOMISTA PELA USP

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