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Melhor reduzir os juros

Por Raul Velloso
Atualização:

A principal lição que se pode tirar da recente fase de bonança é que, mesmo entrando tantos dólares no País, existem sérias limitações internas ao aumento da taxa de crescimento do PIB. De fato, as taxas de câmbio e de juros caíram sistematicamente nesse período, o que fez o PIB subir mais. Em alguns momentos, porém, mesmo sem choques, o Banco Central teve de aumentar a taxa básica de juros (Selic), estabelecendo novos ciclos de subida e queda. Conclusão: com a bonança, o piso dos juros ficou menor, mas não tanto quanto deveria. Com efeito, o investimento e o consumo privados andam sempre juntos no Brasil e reagem favoravelmente à queda das taxas de câmbio e de juros. Era só essas duas variáveis crescerem mais que a soma dos gastos globais passava a exceder o valor do PIB doméstico. Era o velho excesso de demanda se fazendo sentir sobre a insuficiente capacidade interna de produção, pressionando as importações e os preços. Afinal, nem tudo se importa e há ainda limites ao financiamento de déficits externos. Por que o País tem expandido sua capacidade de produção aquém das necessidades? O principal entrave está no âmbito do setor público, que abocanha quase 40% do PIB doméstico. Como esse setor, liderado pela União, faz muito gasto corrente (que, além do mais, é super-rígido), mesmo controlando o crescimento da dívida pública ele acaba poupando pouco (isto é, gerando excedentes insuficientes de receita sobre os gastos correntes) e, por consequência, investindo menos ainda. Assim, boa parte da geração de superávits não financeiros, criados para controlar a dívida, se faz via contenção de investimentos. Nesse contexto, é surpreendente a capacidade demonstrada por alguns Estados de superar as dificuldades criadas pela política de ajuste fiscal em vigor, que induz à queda dos investimentos. No caso de São Paulo, por exemplo, existem indícios de que, apesar da crise, a atual gestão deverá triplicar os gastos de investimento em apenas três anos, sem ter recebido nenhuma concessão especial para tanto. Na crise atual, em comum com as anteriores, houve o choque cambial e o risco de pressões inflacionárias. Em contraste com aquelas, a demanda externa reduziu-se abruptamente e caiu também a parte da demanda interna que mais depende de financiamento bancário, antes de se cogitar de eventual subida da Selic. Já o setor público continuou gastando do mesmo jeito. Em adição, a queda dos preços externos, que é outra novidade da crise atual, ajudou a impedir que o choque cambial, num primeiro momento, pressionasse os preços internos. Paralelamente, as altas reservas que acumulamos na bonança permitem agora administrar melhor a escassez de dólares, impedindo uma subida exagerada da taxa de câmbio. À frente, o sistema financeiro voltará à normalidade, ainda que mais concentrado. Difícil será substituir a demanda externa, que, mesmo temporariamente, desapareceu. Como demandar os excedentes de minérios, aviões, etc., que antes iam para países hoje em forte desaceleração? É por isso que, mesmo reinjetando demanda na economia, será impossível evitar queda de produção (e de emprego) nesses setores. A melhor saída para ocupar o espaço temporariamente aberto pela crise é a redução da Selic, que melhor e mais rapidamente alcança os vários setores da economia. Em contraste, medidas de alívio específico, definidas sob pressão política ou sob o calor de campanhas que já se iniciam, nem sempre alcançam as áreas mais afetadas, piorando o desemprego inicial. Quanto aos gastos públicos, com exceção do seguro-desemprego, aumentar gasto corrente deveria, por todos os motivos aqui elencados, estar fora da agenda. Se tiverem de aumentar gastos, os governos deveriam se concentrar nos relacionados aos investimentos, porque isso já era imperioso antes, conforme explicado acima. Além disso, esse é um tipo de gasto que poderá, se for o caso, ser cortado facilmente no futuro, quando a demanda externa voltar. Quanto a aumentar ainda mais o salário mínimo, como muitos pretendem, certamente injetará demanda via programas de transferência de renda do governo, mas essa demanda adicional ficará distante dos desempregados da Vale e da Embraer, além de aumentar o desemprego no setor privado. Sem falar que, mais adiante, dificultará a adoção de qualquer política de ajuste fiscal pela maior rigidez da despesa pública. *Raul Velloso é consultor econômico O colunista Celso Ming está em férias

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