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Melhora das projeções para relação dívida/PIB é um indicador da consolidação fiscal

Será que precisamos recorrer a um passado não tão distante para nos lembrarmos de que inflação alta não embute consolidação fiscal?

Por Adolfo Sachsida
Atualização:

Em primeiro lugar, deve-se deixar claro que a inflação é um processo deletério para o bem-estar de toda a sociedade, pois torna o ambiente de negócios menos previsível, aumenta os custos informacionais, eleva o risco país, piora a qualidade do investimento ao dificultar o correto cálculo econômico de projetos e agrava a desigualdade de renda e a pobreza.

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Em segundo lugar, ressalta-se que o Brasil é, talvez, o único país que aprovou medidas legislativas e constitucionais visando a controlar o gasto público durante o processo pandêmico. Por óbvio, recursos à saúde e à compra de vacinas sempre foram plenamente disponibilizados.

Em terceiro lugar, a política econômica do governo tem se norteado pelo binômio consolidação fiscal e reformas para aumento da produtividade, que são pilares para o crescimento econômico sustentável de longo prazo. No momento atual, inclui-se, também, a necessidade de vacinação em massa da população como norte de política econômica.

Manutenção do teto de gastos, num cenário de forte pressão fiscal, representa uma vitória tão grande ou até maior do que a sua aprovação. Foto: José Cruz/Agência Brasil

Um dos principais indicadores da consolidação fiscal é a recente melhora das projeções para a relação dívida/PIB, que pode ficar abaixo de 84% ao fim deste ano. O papel da inflação sobre essa melhora tem sido motivo de debate entre os analistas. Está correto que, no curtíssimo prazo, a inflação mantém inalterada parcela expressiva da despesa nominal, mas eleva a receita nominal do governo. Isso melhora o resultado primário. Além disso, a inflação eleva também o PIB nominal.

Por outro lado, a indexação decorrente da inflação e a pressão por aumento de gastos públicos rapidamente corroem qualquer efeito positivo da inflação sobre o processo de consolidação fiscal. Efeitos inflacionários em curto espaço de tempo afetam negativamente o PIB e os custos de rolagem da dívida, piorando assim a própria relação dívida/PIB.

De todo modo, é preciso destacar que as diversas medidas de consolidação fiscal postas em prática pelo governo desde 2019 desempenham papel fundamental na redução do endividamento do País. A reforma da Previdência foi apenas a mais visível delas. A manutenção do teto de gastos, num cenário de forte pressão fiscal, representa uma vitória tão grande ou até maior do que a sua aprovação.

Além disso, mesmo durante a pandemia, um novo marco fiscal foi aprovado com um conjunto de leis complementares. A LC 173 impediu o aumento de salário para funcionários públicos em 2020 e 2021; a 176 resolveu o passivo da Lei Kandir; a 178 estabeleceu gatilhos para estados e municípios e melhorias na LRF; a emenda constitucional 109 – a PEC Emergencial – desvinculou recursos de fundos, que puderam assim aumentar a reserva de liquidez para o pagamento da dívida, e trouxe mecanismos de controle de gastos para a União, Estados e municípios, entre outros avanços. No conjunto, essas medidas refletem a preocupação com a estabilização da relação dívida/PIB e a consequente consolidação fiscal.

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Pelo lado monetário, resoluções do Conselho Monetário Nacional reduziram consistentemente a meta de inflação para 2022 e 2023, e políticas monetária e fiscal coerentes com esse ajuste foram implementadas. Como resultado, a inflação, ainda que esteja momentaneamente acima da meta, deve convergir para ela. A expectativa de inflação está ancorada, o que rechaça qualquer possibilidade de processo inflacionário e reafirma que a estratégia de obter equilíbrio fiscal por meio de ajustes nos gastos estruturais é crível. As expectativas de inflação ancoradas mesmo em cenário adverso, o risco país em patamares mais baixos do que em períodos similares de crise e as taxas de juros aquém da média histórica refletem um amplo esforço do governo para aprimorar e manter sólidos os fundamentos econômicos.

Em resumo, a trajetória sustentável da relação dívida/PIB reflete muito mais uma orientação de política econômica do que uma transitória alta inflacionária. Ou será que precisamos recorrer a um passado não tão distante para nos lembrarmos de que inflação alta não embute consolidação fiscal?

*SECRETÁRIO DE POLÍTICA ECONÔMICA DA SECRETARIA ESPECIAL DE FAZENDA DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA

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