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Mercado acaba sendo "seu próprio Lula", diz analista

Os analistas são unânimes ao afirmar que os preços atuais de câmbio, juros e o nível da Bolsa refletem um grande exagero em relação à realidade dos fundamentos

Por Agencia Estado
Atualização:

Por mais que o pessimismo presente no mercado afete a percepção negativa sobre as fragilidades estruturais do Brasil, especialmente no campo fiscal e da dívida pública, os analistas são unânimes ao afirmar que os preços atuais de câmbio, juros e o nível da Bolsa refletem um grande exagero em relação à realidade dos fundamentos. "O mercado sempre é mais pessimista ou otimista do que deve. Há um claro exagero nessa reação toda", comenta o economista-chefe do Loyds TSB, Odair Abate. Ele sublinha que o problema reside na possibilidade de o mercado acabar realizando sua autoprofecia no tocante às preocupações sobre a administração da dívida no próximo governo. "Nesse sentido, o mercado acabará sendo o seu próprio Lula", diz. O risco país do Brasil superou hoje o pior momento de 2001, quando no dia da primeira ofensiva militar no Afeganistão alcançou 1.256 pontos base pelo índice EMBI. Abate lembra que, além das diferenças positivas em termos de fundamentos, especialmente nas contas externas, há também duas diferenças negativas no cenário atual em relação ao ano passado (crise argentina e atentados nos EUA): as incertezas políticas desta vez não se referem ao país vizinho e também naquela ocasião não foram afetados os papéis públicos, o que deve ter alguma influência sobre tempo de duração desta crise. Marca registrada Para o diretor do Centro de Economia Mundial da FGV-RJ, Carlos Geraldo Langoni, as dúvidas sobre a transição política tornarão a volatilidade dos mercados uma "marca registrada" da economia brasileira até a indicação dos nomes da próxima equipe econômica. Por outro lado, em que pese o fato de o mercado estar trabalhando com o pior cenário político possível, já começam a aparecer aqui e ali analistas traçando a possibilidade de cenários positivos mesmo em caso de vitória da oposição nas eleições. Isso poderia ser em parte antecipado caso os programas de governo que serão explicitados até o fim deste mês tragam regras claras de respeito aos preceitos do mercado financeiro. "É uma possibilidade, sim. Seria um movimento de refluxo da maré atual, que poderia favorecer muito o próximo governo e trazer enxurrada de dólares para o País", comenta Abate. Estresse do mercado Há uma forte onda de pessimismo no mercado financeiro e os analistas a atribuem a fatores técnicos e conjunturais. No primeiro grupo, a crise das LFTs, a continuidade dos saques nos fundos, o prejuízo dos bancos com o FRA de cupom cambial e o fluxo negativo de moeda estrangeira, entre outros. No segundo, as incertezas eleitorais decorrentes da possibilidade de alternância no poder a partir de 2003. Como nos últimos dias não houve novidades negativas, aos olhos do mercado, em relação às eleições - pelo contrário, pesquisas seguidas mostraram o descolamento do candidato governista no segundo lugar -, os analistas dizem que o repique do estresse nos últimos dias é explicado, sobretudo, por fatores técnicos de ajuste. Para o economista-chefe do JP Morgan, Luís Fernando Lopes, as provisões que os bancos fizeram para as perdas com as LFTs - vale lembrar que a marcação a mercado das LFTs também vale para a carteira dos bancos - e o FRA de cupom cambial aparentam ser menores que o tamanho do prejuízo. O resultado disso nos balanços das instituições é a redução de seu patrimônio líquido, deixando-as desenquadradas na exposição de risco. "Os bancos começam então a se desalavancar no mercado, criando todo esse ajuste que estamos vendo", comenta Lopes, para quem o estresse de ontem não teve como principal motivo os boatos sobre o rebaixamento do Brasil ou a fraca demanda pelas LTNs curtas ofertadas pelo Banco Central. O câmbio é um dos segmentos mais afetados. Sabe-se que o prejuízo que vários bancos tiveram com o aumento do cupom cambial levou algumas grandes instituições a ficarem com elevados saldos devedores líquidos em dólar, pressionando a demanda no mercado à vista. Também alimenta esse nervosismo a digestão - ainda incompleta, na visão de alguns analistas - dos fundos de investimento da antecipação do "market to market" para as LFTs. O economista-chefe do HSBC, Alexandre Bassoli, lembra que os fundos estão buscando manter o maior nível de liquidez possível para enfrentar os saques de cotistas que tiveram prejuízos, movimento que, embora não alarmante, ainda continua tirando o sono dos gestores. "É um ciclo que se auto-alimenta: os cotistas sacam, os bancos vendem esses papéis no mercado secundário, onde há excesso de oferta, acabam tomando prejuízo, que acaba se refletindo no fundo e que incentiva novos saques", explica Bassoli. Ele destaca tal movimento como principal motivo para a fraca demanda pelas LTN ontem, mesmo com o vencimento dos papéis ainda nesta gestão de governo. "Mas isso não vai se retroalimentar de forma permanente, a tendência é que vá perdendo força com o passar do tempo", pondera.

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