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Mercado de trabalho precário eleva número de lares sem renda e com renda muito baixa

De acordo com Ipea, porcentual de domicílios que não tinham moradores desempenhando atividade remunerada saltou de 18,6% antes da crise econômica para 22,2% no fimde 2018

Por Daniela Amorim (Broadcast) e Vinicius Neder
Atualização:

RIO -  Em todo o País, 37,6 milhões de casas subsistem sem nenhuma renda de trabalho ou com remuneração muito baixa. O resultado representa 1,5 milhão de lares a mais nessa situação no período de apenas um ano, fenômeno agravado pela crise no emprego, informou ontem o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

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No quarto trimestre de 2018, havia 16 milhões de lares brasileiros (22,2% do total) sobrevivendo sem ter ao menos um de seus moradores empregado no mercado de trabalho, 900 mil residências a mais em relação ao quarto trimestre de 2017. No quarto trimestre de 2013, antes da recessão econômica, eram 12,2 milhões (18,6% do total) nessa situação.

Outros 21,6 milhões de lares (30,1% do total) foram considerados de baixa renda, o equivalente a mais 600 mil casas na faixa das mais pobres no período de um ano. Para o Ipea, a situação ainda precária do mercado de trabalho, com desemprego elevado e persistente, tem punido, principalmente, as famílias formadas por adultos com menor nível de instrução.

Jefferson Maximiliano, de 40 anos, voltou a trabalhar como camelô há quatro anos Foto: Fábio Motta/Estadão

“A crise no mercado de trabalho tem afetado especialmente o contingente menos escolarizado”, justificou Maria Andreia Lameiras, técnica da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea. Segundo a pesquisadora, num momento de fechamento de vagas, os trabalhadores com mais anos de estudo que perdem o emprego acabam aceitando assumir postos de menor qualificação, fechando portas para candidatos de baixa escolaridade.

Com ensino médio, Jefferson Maximiliano, de 40 anos, voltou a trabalhar como camelô há quatro anos. Já foi dono de depósito de bebidas e trabalhou com eletrônica, como ajudante de pedreiro, com limpeza e como segurança, em festas e boates. Seu último trabalho fixo foi como segurança. “Hoje, está muito pior. Tive uma queda de 90% nas vendas”, disse Maximiliano, que vendia guarda-chuvas, na tarde desta quarta-feira, 20, no centro do Rio. O baque no orçamento da família só não foi pior porque a mulher de Maximiliano trabalha de carteira assinada, como caixa de loja num shopping.

Desigualdade na renda

O estudo do Ipea, com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta ainda que houve aumento na desigualdade salarial, com ganhos maiores nos últimos dois anos para as famílias mais ricas do que para aquelas de renda média e baixa. No quarto trimestre de 2014, a renda média domiciliar do trabalho nos lares mais ricos era 27,8 vezes maior que a média recebida pelas famílias da faixa de renda muito baixa. No último trimestre de 2018, a renda média domiciliar nos lares mais ricos foi 30,3 vezes maior que nos mais pobres.

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“Em 2018, a inflação dos mais pobres acelerou, teve forte impacto pelo aumento de preços dos alimentos. Quando você pega um salário que já é mais baixo e está sendo corroído por inflação maior, enquanto que o salário mais alto é menos afetado pela inflação, a disparidade aumenta”, disse Maria Andreia Lameiras.

Andrey de Oliveira Gomes, de 19 anos, trabalha como camelô hádois anos nas ruas do centro do Riovendendo balas e chocolates Foto: Fábio Motta/Estadão

Para o camelô Andrey de Oliveira Gomes, de 19 anos, a inflação tem atrapalhado as vendas. “Há dois anos, acho que vendia muito mais”, afirmou Gomes, entre uma venda e outra, na Avenida Rio Branco, a principal do centro do Rio. “As pessoas estão comprando menos. As coisas estão muito caras, tanto para mim quanto para os clientes”, disse Gomes, que largou os estudos, no 1º ano do ensino médio, para trabalhar vendendo balas e chocolates nas ruas. 

Independentemente da inflação, os pesquisadores do Ipea veem tendência de alta na desigualdade salarial, pois os trabalhadores empregados nas melhores vagas, com os melhores salários, tendem a ser os primeiros beneficiados com uma recuperação. “Depois, os outros trabalhadores vêm a reboque. Então logo no início da recuperação, talvez continue piorando a desigualdade”, disse Carlos Henrique Leite Corseuil, técnico da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Ipea.

O Ipea lembra que a geração de postos de trabalho medida pela Pnad Contínua perdeu fôlego no segundo semestre de 2018. O aumento no número de ocupados aconteceu na informalidade. O Cadastro Geral de Emprego e Desemprego (Caged) também mostrou tendência semelhante, com uma estabilidade do número de contratações e um aumento das demissões.

Nesse cenário, os pesquisadores preveem a manutenção da recuperação gradual do emprego e da renda média ao longo de 2019, com melhora mais intensa apenas em 2020.

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