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Mercado e expansão da oferta

Por Paulo Pedrosa
Atualização:

Um dos desafios do setor elétrico brasileiro é conciliar a expansão da oferta com a consolidação de seu mercado livre, no qual os consumidores podem escolher de quem comprar energia. Sua solução deve preservar a liberdade de um mercado que gera valor para toda a economia e já representa um terço da energia dos chamados consumidores cativos, atendidos por distribuidoras. A redução para zero do chamado ''''fator alfa'''', que retira a competitividade da venda para o mercado livre nos leilões de energia nova; o fim do impedimento à participação dos comercializadores nos leilões de expansão; e a aceitação pelo BNDES de alternativas para garantias, além dos recebíveis de contratações de longuíssimo prazo, são três dos pontos que fariam com que o mercado livre assumisse um novo estágio de amadurecimento. Mas é justamente no modelo de financiamento, que termina por definir o modelo comercial e a expansão do setor, que está o foco das dificuldades atuais. O grande financiador do setor oferece nos prazos, taxas, carências e condições melhores do que qualquer outra alternativa. Elas são possíveis pelo acesso a recursos compulsoriamente captados também a taxas reduzidas. Como contrapartida exige garantias que não encontram abrigo na lógica de contratação do mercado livre. Assim, uma particularidade do modelo de financiamento termina por dirigir a expansão para o mercado regulado. Os empreendedores das novas usinas, quando conseguem viabilizá-las para obter no capital próprio a rentabilidade desejada e, ao mesmo tempo, atender aos requisitos de preço dos leilões, são levados a se alavancar com os recursos mais baratos disponíveis e, conseqüentemente, a aderir às exigências associadas. Assim a energia é comercializada em contratos de longo prazo, com entrega a partir de três ou cinco anos após a contratação, que vinculam direta e indissoluvelmente o comprador e o vendedor, com garantias de recebíveis, assegurando o pagamento por toda a duração dos contratos e da cláusula de reajuste, que preserva um fluxo de caixa compatível com o custo do financiamento. Essa lógica encontra respaldo no mercado regulado, que assegura o repasse integral da energia contratada. Os consumidores livres - atuando em segmentos competitivos - não têm como assumir compromissos de tão longo prazo na sua contratação, muito menos com um fornecimento com início cinco anos no futuro. Ainda mais por não haver liquidez na compra, já que a única opção ao consumo é a venda no mercado spot, com tendência natural de preços inferiores aos contratados. Se o modelo de contratação de longo prazo não é bom para consumidores e comercializadores, também não o é para a eficiência do mercado como um todo. Ele amortece a percepção da demanda aos sinais de preço e inibe reações naturais de aumento ou redução do consumo, uso de outros energéticos e aumento da eficiência, que poderiam ter um importante papel para a modicidade tarifária e a segurança da oferta. No cenário de consumidores cativos com baixa sensibilidade aos sinais de preço e consumidores livres com baixo grau de manobra, a volatilidade de preços aumenta. E a dificuldade em gerenciar um mercado, atuando apenas pelo lado da oferta, se transforma em desafio de enormes proporções. A solução natural para problema de tal complexidade é a manutenção de uma custosa superoferta de segurança, que amplia a ineficiência setorial e a transfere para a economia como um todo. Os comercializadores têm condição de promover o equilíbrio eficiente entre oferta e demanda ao integrar um conjunto de consumidores em suas carteiras. Mas, pela própria natureza de seus negócios, têm dificuldades em compromissos como os que são assumidos por distribuidoras. Adicionalmente, tendo em vista que o fornecimento se dará ao longo de muito tempo, o valor presente dos contratos de longo prazo é muito elevado e as garantias exigidas encarecem exageradamente a contratação. Outros setores da economia, também intensivos em capital, encontraram fórmulas para viabilizar novos investimentos sem recorrer a contratos de longo prazo. Diversas experiências estão disponíveis e há boas oportunidades de aprendizado. Com os instrumentos adequados, como a emissão de títulos ou certificados vinculados ao lastro de comercialização de energia, seriam atraídos investidores para o setor elétrico, especialmente num momento em que os investimentos baseados nos juros do sistema financeiro apresentam sólida trajetória decrescente. Os investidores teriam a liquidez da negociação dos títulos em mercados secundários associada à rentabilidade da venda da energia para o mercado livre por meio de comercializadores. Da mesma forma, consumidores de energia poderiam adquirir ''''fatias virtuais'''' dos novos empreendimentos de geração, atendendo ao seu próprio consumo sem as amarras do modelo atual de contratação. Certamente não há uma alternativa ou solução única para a participação do mercado livre na expansão, mas é sempre importante construir novas opções, como aquelas que permitam a atração de investimentos de risco e formas de contratação alinhadas com a realidade e com as necessidades daqueles que, afinal, são a própria razão de existência do sistema: os consumidores. *Paulo Pedrosa é presidente da Associação Brasileira dos Agentes Comercializadores de Energia Elétrica (Abraceel) Carlos Alberto Sardenberg, excepcionalmente, não escreve seu artigo hoje

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