Para o economista Simão Davi Silber, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), a decisão do governo de estabelecer uma referência menor para a inflação brasileira, ao revisar a meta após 14 anos, de 4,50% a 4,25% para 2019, é "incoerente". "O problema do Brasil é inflação ou desemprego e a recessão?", questiona o economista. Para ele, uma meta muito ambiciosa de inflação pode prejudicar a trajetória de queda dos juros, desaquecendo ainda mais a já combalida atividade econômica. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual a sua avaliação sobre a revisão para baixo da meta de inflação para 2019?
Eu não acho muito adequado. Recentemente, a presidente do Banco Central dos Estados Unidos, Janet Yellen, levantou a seguinte dúvida: se não valeria a pena subir a meta de inflação (atualmente em 2% ao ano) para ficar com uma "gordurinha" para quando houver uma recessão – assim, é possível trabalhar melhor com a taxa de juros e evitar um desaquecimento maior da economia. Uma meta muito ambiciosa pode jogar a economia para baixo: você fica com o olho muito fixado na inflação e esquece do PIB e do emprego.
Como fica o ritmo de queda dos juros?
É incoente a posição do BC porque em todos os comunicados ele diz que vai baixar juros, mas desde que se faça o ajuste fiscal. O problema do Brasil é inflação ou desemprego e a recessão? Eu vejo como inoportuna a medida, já que o problema do Brasil é fundamentalmente fiscal. O foco está errado. O juro é muito alto, o câmbio é muito baixo e a economia não cresce. Com uma meta mais ambiciosa de combate à inflação, é preciso trabalhar com um juro maior. Se em 2019 a inflação for de 4,50%, e não de 4,25%,vai ter de subir juros. Isso tende a desaquecer a economia, a gerar menos emprego e a apreciar o câmbio. Fora que o grande devedor do Brasil é o governo. Um juro mais alto é ruim para o governo, para o ajuste de contas e para as reformas. Me parece não só precipitado, mas errado.
++ Veja íntegra do voto que revisou a meta de inflação para 4,25% em 2019
A revisão teria sido para acalmar o mercado e ancorar as expectativas?
Você não acalma o mercado com meta para 2019 e 2020, e nem vai mexer muito com expectativas e confiança. O mercado está de olho em só uma coisa: se vai passar a reforma da Previdência. Acredita-se que vai passar alguma coisa relevante ainda no segundo semestre. Se não passar, o juro futuro vai para a casa do chapéu.
Se o entrave é fiscal, a crise política mina a retomada?
Eu acredito que não. Tem-se uma noção muito clara de que esse é o grande imbróglio da República nacional. Passado o vendaval, alguma coisa deve ser aprovada no segundo semestre em termos da reforma da Previdência, nem que seja a idade mínima. Então deve ter algum avanço. Se não caminharmos no equilíbrio das contas públicas, ou a gente vai para moratória ou volta para a inflação. O governo, no limite, não tem problema de dinheiro, porque pode emitir, mas aí sim a inflação será um problema.
O mercado espera inflação negativa no resultado mensal para junho. É algo pontual ou traz algum alento?
Alívio traz, mas é extremamente pontual. Nós não estamos indo para uma trajetória de deflação. Vamos terminar o ano com inflação de 3,9%, 4%.